Completou um ano a paralisação das obras do Museu do Trabalho e do Trabalhador, em São Bernardo do Campo. O museu estava em acabamento, com 85% dos serviços executados e R$ 14 milhões pagos.
Determinada pela Justiça, foi um desdobramento de ação do Ministério Publico Federal – MPF e da Controladoria-Geral da União – CGU, que alegaram irregularidades na licitação e terceirização na contratação do projeto arquitetônico.
Não cabe discutir os aspectos jurídicos, que estão sub judice. Se comprovadas irregularidades, os responsáveis serão punidos. Mas nada justifica a interrupção de um trabalho sério, realizado por reconhecidos arquitetos, acadêmicos e museólogos, que traria bons resultados para o município.
Apesar das acusações de superfaturamento, o custo desse museu é bem inferior ao de outros implantados na última década. Com 5,5 mil m² de área construída, o orçamento é de R$ 18 milhões, ou seja, R$ 3,3 mil/m² (valores de 2016).
A Praça das Artes, em São Paulo, cuja arquitetura é comparável, custou R$ 5,2 mil/m² (valores de 2010). Mais recentes, o Museu do Amanhã (RJ), o Instituto Moreira Sales (SP) e o Museu de Imagem e do Som (RJ, ainda inacabado) têm custos bem superiores: respectivamente, R$ 15 mil/m², R$ 17,3 mil/m² e R$ 14,1 mil/m².
Esses dados mostram que o maior prejuízo causado ao erário pela obra é a sua paralisação. Interrupções deterioram serviços já realizados, que precisarão ser refeitos; materiais se perdem. Enquanto isso, os benefícios educacionais, culturais, urbanísticos e econômicos ficam adiados.
Chamar o equipamento de “Museu do Lula” podia ser útil aos adversários do ex-prefeito de São Bernardo do Campo nas eleições de 2016, mas é um equívoco, como mostra seu projeto museológico.
Dividido em quatro módulos, a proposta recupera a memória industrial, social e operária da região, como vem sendo feito em museus de antigos polos industriais em todo o mundo. Elas buscam construir um novo arranjo econômico local, indispensável nos tempos pós-industriais, reforçando sua própria identidade.
É o caso do Pump House: People's History Museum, implantado em Manchester, centro fabril da Inglaterra na primeira revolução industrial. Museus voltados para a história econômica, social e urbana são fatores de agregação, identidade e reflexão sobre o passado com os olhos no futuro.
Por isso, transformar o espaço em uma Fábrica de Cultura, como anunciou o atual prefeito, mudando sua finalidade, não se justifica. O programa e o projeto arquitetônico são elementos estruturais e indivisíveis da proposta museológica.
O imbróglio jurídico da contratação do projeto, que envolveu terceirização, mostra a urgência de se regulamentar novas formas de seleção e contrato entre escritórios de arquitetura e poder púbico. No Dia do Arquiteto, fica como desafio.
nota
NE – publicação original: BONDUKI, Nabil. Obras paralisadas de museu precisam ser retomadas. Folha de S. Paulo, 19 dez. 2017.
sobre o autor
Nabil Bondunki, arquiteto, mestre, doutor e livre docente pela FAU USP, onde é professor titular de Planejamento Urbano. Foi Superintendente de Habitação Popular (1989-1992), vereador (2001-2004; 2013-2016), relator do Plano Diretor (2002 e 2014), secretário de Cultura da cidade de São Paulo (2015-2016). Foi Secretário de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente (2011-2012).