Os Mapas Comportamentais e de Fluxos (MCFs) têm como premissa apresentar de forma sistêmica e por meio de uma representação espacial bi ou tridimensional, os comportamentos e os deslocamentos (fluxos e contra-fluxos, nos diversos sentidos, por exemplo, nos sentidos horário e anti-horário) dos visitantes em um determinado espaço expositivo (1). Estes mapas tem como objetivo verificar e apresentar aos projetistas e tomadores de decisão, relativamente às propostas museográficas, as principais interfaces que moldam as relações s estabelecidas entre usuário (no caso, visitantes de museus abrigados em edifícios com 50 ou mais anos de vida útil), ambientes em uso e a própria edificação. Este mapeamento leva em consideração o paradigma determinístico da arquitetura como influenciador da percepção ambiental pelo usuário e, de forma dialética, a apreensão do visitante sobre os espaços interiores (e da edificação museal, no sentido mais amplo) e dos objetos expostos na visitação. Nesta condição biunívoca, entende-se que é necessário considerar os fluxos, contrafluxos e comportamentos destes usuários temporários em museus (visitantes), não só por conta dos requisitos de segurança e de acessibilidade, mas também por conta dos acervos e da edificação (muitas vezes patrimoniada e de valor histórico) no que se refere aos requisitos de desempenho ambiental.
Atualmente é frequente encontrar registros bibliográficos de MCFs representados de forma única e integrada, uma vez que enquanto o mapa de fluxos registra o percurso realizado pelo visitante, num dado espaço expositivo, desde a entrada, até a saída, o mapa comportamental registra as atividades realizadas por ele naquele dado espaço tais como os principais pontos de parada, as interações – passivas ou ativas (se possível) – com as obras de arte, tempo de permanência no ambiente e junto a cada item de acervo exposto e assim por diante. Ou seja, a representação de ambos os mapas sobrepostos torna mais amigável a compreensão das interações psicoespaciais desenvolvidas no ambiente, pois ressalta a eventual visualização de conflitos (nós) nos pontos de circulação e de paradas (aglomerações), permitindo, inclusive, possíveis ajustes de leiautes e reposicionamento de itens de acervo no decorrer da própria temporada de exposição, se necessário. Desta feita, o principal resultado da aplicação dos MCFs, em um ambiente construído e em uso é na maioria dos casos, uma representação gráfica sobreposta e legendada, a planta arquitetônica do referido espaço. Por esta razão, surgiram, então inúmeros modos de apresentar os dados os quais variam de acordo com os pontos de vista do pesquisador-observador e do enfoque da pesquisa (objetivos) a ser desenvolvida. Tais procedimentos avaliativos, a partir de levantamentos manuais, eletrônicos, fotográficos (estáticos) e até por meio de vídeos (dinâmicos), permitem aplicações in loco e num dado período pré-definido dos MCFs, porém requerem a definição de parâmetros para futuras replicações, com vistas a construção de MCFs, como subsídios para projetos museográficos e considerando que há ainda poucas pesquisas sobre o tema, sobretudo no Brasil.
Com este propósito foi organizado um guia “passo a passo” que explica e instrui a aplicação dos MCFs com um enfoque direcionado a espaços museais. Este guia foi composto de uma base teórica formada por informações coletadas (2) e com a posterior aplicação piloto em dois museus diferentes (Fundação Ema Klabin, FEK, uma casa-museu e onde predominam exposições permanentes e o Museu da Imagem e do Som, MIS, onde predominam exposições temporárias) para verificar a efetividade das informações levantadas. A aplicação piloto na casa-museu Ema Klabin abrangeu todos os espaços expositivos e no caso do MIS, o espaço expositivo da exposição temporária Archipélago. A aplicação piloto ocorreu no primeiro semestre de 2022.
O guia contempla um roteiro a ser seguido e dividido em três etapas de aplicação dos mapas (pré-mapeamento; levantamento in loco e pós-levantamento, e, elaboração dos mapas definitivos). Foi incluído como exemplo uma planta hipotética de uma sala de museu contendo esculturas, pinturas e um mural, dispostos em diferentes posições e painéis expostos em divisórias periféricas e limítrofes da referida sala. Desse modo foram consideradas diferentes possibilidades de deslocamentos e comportamentos, considerando três visitantes simulados, onde foram previstos seus percursos, pontos de permanência e tempo de visita. Com a integração destes dados foi então produzido um MCFs síntese ilustrativo, que posteriormente serviu de base para os registros in loco e nos dois casos reais (FEK e MIS) e para a realimentação do próprio guia. Um mapa síntese foi desenvolvido de forma mais detalhada após a realização da aplicação piloto na casa museu FEK que teve como teste inicial a aplicação dos mapas de forma manual e, posteriormente, de forma digital, este último com a utilização de um aplicativo para a sua produção que além de apresentar os principais fluxos, pontos de conflito na circulação e pontos de parada dos visitantes (para contemplação dos ambientes e dos objetos de acervo), apresentou também as obras do acervo relacionadas aos pontos verificados, permitindo compreender as principais motivações destas paradas.
O estabelecimento de padrões sistemáticos propostos no guia permitiu a comparação entre ambos os MCFs sínteses (FEK e MIS). Notou-se, então, que os mapas, quando aplicados em um museu permitem aos arquitetos e/ou designers possibilidades de melhorias dos leiautes expositivos com base em experimentos anteriores reais e efetivos.
Os MCFs, de origem multidisciplinar, são instrumentos que podem colaborar com as premissas museográficas e, portanto, com a programação de necessidades dos espaços expositivos.
notas
NA – Os autores agradecem a Fundação Ema Kabin, SP e ao Museu da Imagem e do Som de São Paulo por terem acolhido e colaborado com a pesquisa.
1
SILVA, Victor Hugo. Métodos observacionais: mapas comportamentais aplicados em espaços museológicos: conceitos, desenvolvimento, possibilidades de aplicação e análise. Relatório final de Iniciação cientifica. São Paulo, FAU USP/CNPq, 2022.
2
ARSAN, Taner; KEPEZ, Orcun. O. Early Steps in Automated Behavior Mapping via Indoor Sensors. Sensors. v. 17. p. 2, 2017 <https://bityli.com/JWCWkkR>; ASSONI, Aline D.; ORNSTEIN, Sheila Walbe. Museus interativos sob a ótica dos usuários. Avaliação Pós-Ocupação aplicada no caso do Museu Catavento, SP. Coleção Cadernos PROARQ, Rio de Janeiro, FAU Proarq UFRJ, 2019, p. 111-132 <https://bityli.com/koODHmk>; CANSADO, Julia Ascencio A. Ambientes museológicos para a aprendizagem e a construção do conhecimento: a contribuição da avaliação pós-ocupação a partir de um estudo de caso. Iniciação Científica. Relatório Final Processo Fapesp n. 2019/14681-6. São Paulo, FAU USP/Fapesp, 2021.
sobre os autores
Victor Hugo Silva é graduando na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e realizou pesquisa de iniciação científica no período 2021-2022 com apoio do CNPq número 138962/2021-9.
Sheila Walbe Ornstein é professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, bolsista produtividade CNPq número 304131/2020-2. Atua em áreas do conhecimento como a Avaliação Pós-Ocupação, gestão do processo de projeto e tecnologia da construção.