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interview ISSN 2175-6708

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Nesta entrevista feita por Ana Rosa de Oliveira, o arquiteto e paisagista Roberto Burle Marx conta um pouco da sua trajetória e comenta seu trabalho

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OLIVEIRA, Ana Rosa de. Roberto Burle Marx e o jardim moderno brasileiro. Entrevista, São Paulo, ano 02, n. 006.01, Vitruvius, abr. 2001 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/entrevista/02.006/3346>.


Jardim Fazenda Vargem Grande - Areias-SP, 1979
Foto Ana Rosa de Oliveira 2000

 

Ana Rosa de Oliveira: Na fase inicial da sua pintura observa-se uma composição baseada na figura e nos objetos pousados.

Roberto Burle Marx: Eu fiz academia, recebi a medalha de ouro, pode-se dizer que tive uma formação acadêmica. Posteriormente, o convívio com Leo Putz, que foi contratado por Lúcio Costa, que falava de um Gauguin e dos pintores alemães acabou me influenciando. Fui expulso da aula de pintura porque comecei a falar de Gauguin e o professor (Brasse) pensou que eu estivesse pervertendo os alunos.

ARO: Mas mesmo assim o Sr. valorizava os elementos regionais e isso não era uma particularidade do academicismo.

RBM: Apesar de ter recebido uma formação acadêmica, nunca fui um pintor acadêmico, mesmo naquela época, nunca procurei pintar para agradar as figuras da sociedade. Eu teria sido um bom retratista porque sabia pintar retratos, mas eu nunca me interessei por isso, eu estava muito mais ligado aos problemas, às figuras do povo.

ARO: Considerando-se que já não se identifica o objeto representado, qual seria a realidade da sua pintura. Como se dá a passagem do figurativo ao abstrato?

RBM: Abstração é uma maneira de dizer. A gente vai até um certo ponto. Por exemplo, se seu estou olhando uma cor é porque ela existe, de modo que não é abstrata. São tantas coisas que nos induzem.

Acho que foi uma necessidade. Uma necessidade de transpor a realidade, não é? É a tal coisa, o claxonar de um automóvel, o coaxar de um sapo, o mugido de uma vaca, são sons que cabe ao músico ordenar. Eu penso que as cores também têm que ser ordenadas. Eu muitas vezes não sabia explicar e a idéia era sempre a de copiar o que víamos. Um dia, estava observando um professor que tive, o Leo Putz, da escola expressionista alemã. Ele gostava muito de mim, porque eu falava alemão, até me chamava de meu filho, era parente de Thomas Man. Ele pintava e eu observava, num determinado momento perguntei a ele: professor porque o Sr. está pintando de vermelho um telhado que é marrom? Ele então me respondeu: "meu filho, a natureza é só um pretexto... Digamos que a arte seja uma transposição da natureza". Uma explicação como esta foi suficiente para que eu começasse a mudar. Apesar de que hoje em dia eu não ache ruim ter uma formação acadêmica, pois essa juventude não sabe de nada. Pensam que são eles que estão descobrindo o mundo. Eu acredito que é muito importante conhecer o que foi feito antes de nós...

ARO: Naquela época porém, era importante romper com o Academicismo.

RBM: Era necessário romper com aquela idéia de copiar aquilo que estávamos vendo. Embora saber copiar o que está diante de nós seja também importante, pois é uma observação que se faz, referente a um ritmo, uma cor, uma cor local, é muito importante.

ARO: Alguns críticos dizem que o Sr. pinta a trama do mundo vegetal, o Sr. concorda?

RBM: A trama... eu procuro compreender o que é o mundo vegetal. É necessário compreender que cada crítico tem uma forma de se expressar. Eles podem achar que eu procuro compreender a trama do mundo vegetal, como por exemplo, o porque dessa folha, a razão do spanish moss (Tilandsia usneoides). O importante é saber que vamos nos influenciando pelo que nos circunda.

ARO: Representar os vegetais, é esse sentido que a crítica quer dar, o Sr. concorda que este seja seu objetivo?

RBM: Eu discordo. É tudo. Não concordo, seria uma limitação muito grande. As emoções vêm de tudo que nos circunda. Eu estou com você, estou vendo o cachorro, um empregado. Tudo isso vai se misturando na nossa sensibilidade. Achar que é só da forma vegetal que nasce a minha pintura é um absurdo.

ARO: O Sr. comenta que detesta fórmulas.

RBM: Eu as detesto sim, continuo a dizer, pois a fórmula é repetitiva, é como um beco sem saída. Aceitar a fórmula é inviabilizar a capacidade de pensar. Eu detesto ditaduras, que são imposições, fórmulas. Eu quero ter o direito de descobrir o que serve para mim e o que não serve para os demais. Eu me interesso por princípios.

ARO: Na pintura quais seriam os seus princípios?

RBM: Entram forma, cor, ritmo, princípios comuns a todas as artes. Ora é a construção, que é básica para tudo. Quem não sabe construir não sabe fazer arte.

ARO: Como se constrói uma pintura?

RBM: Baseado em saber que uma pintura deve ter uma dominante e uma dominada ou em que uma pintura onde domine o escuro ou o claro são diferentes. Não podem haver dois crescendos iguais. Um é o crescendo mais importante. Isso se vê, por exemplo, ao analisar a estrutura de um L'après-midi d'un faune de Debussy, com uma clareza, uma simplicidade, aparentemente uma peça pequena, mas que é ao mesmo tempo um monumento. Às vezes certos pintores ou certos músicos produzem, produzem e não dizem nada.

ARO: Referindo-se a uma exposição que o Sr. realiza no MASP em 1974, Geraldo Ferraz cita o termo Extravasaria, afirmando ser um dos nomes que o Sr. atribui ao resultado que chega com a sua pintura. O Sr. poderia comentá-lo?

RBM: Extravasaria é no sentido de não ficar dentro da fórmula, de sair e procurar outros caminhos contra a rotina.

ARO: Existe, por parte dos críticos que analisam seu trabalho, uma tendência em dizer que os seus jardins são pinturas. O Sr. inicialmente afirma-o e posteriormente discorda. Por quê?

RBM: É uma grande besteira confundir meus jardins com pintura. Cada modalidade artística tem uma maneira própria de ser expressada. Por exemplo, a cor na pintura, é uma coisa muito mais definida que no jardim. No jardim, a cor é definida pela hora do dia, pela luz. Um quadro no escuro é diferente de um quadro com iluminação permanente.

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