José Veríssimo Teixeira da Mata e Katsirina Handrabura: O Senhor é comunista. Sabe-se, todavia, que um de seus projetos mais apreciados é a Catedral de Brasília, cidade onde está também situada a Igreja Militar Nossa Senhora da Paz. Como as suas convicções marxistas se entendem com o catolicismo em particular e com a religião, em geral?
Oscar Niemeyer: As minhas convicções marxistas estão mais fortes do que nunca. O comunismo com que me identifico me leva sempre a recordar o heroísmo do povo russo, pelo qual nutro enorme admiração. Essas convicções político-ideológicas não entram em contradição – em princípio – com o meu interesse enquanto arquiteto pelo tema da catedral (ou de uma pequena igreja). Não acredito em Deus, mas respeito as pessoas que nele crêem. Eu mesmo provenho de uma família católica – o retrato do Papa na parede da sala. Mas desde cedo constatei que a injustiça, a desigualdade social se fazia muito profunda e opressiva, e, ainda jovem, integrei-me ao Socorro Vermelho e, mais tarde, ao PCB. Foi uma opção correta, a meu ver.
JVTM/KH: Para falarmos em termos mais amplos, como o Sr. avalia o desenvolvimento da cultura no contexto do que ocorre no planeta? Pode a cultura ajudar a nos salvar?
ON: Eu reconheço que a produção cultural de qualidade pode ou deve acolher propostas, atitudes de reação contra a desumanização do homem, contra a ampliação das margens da exclusão social. Em suma: exprimir uma ética da solidariedade, ainda hoje fundamental, que eu identifico nos grandes escritores russos do século XIX, sobretudo em Dostoiévski e Tolstoi. Por outro lado, penso que uma produção cultural comprometida com o aprimoramento do homem e a criação de uma sociedade mais justa e solidária só será possível se garantirmos aos nossos jovens uma formação melhor. Esse problema me preocupa muito, ao ver a situação dos que saem dos cursos superiores em meu país, desprovidos de uma compreensão mais ampla dos problemas da vida. Não queremos o homem especialista, esse sujeito voltado apenas para os assuntos de sua profissão. É preciso formar jovens mais qualificados para participar dessa luta fundamental por um mundo melhor. E é isso que eu procurei tratar num livro que será publicado em breve, O ser e a vida.