Não me recordo quando conheci pessoalmente Fernando Diez. Será que foi em São Paulo, em algumas das suas diversas visitas ao Brasil? Creio ser mais provável que o primeiro contato tenha sido em algum evento internacional, talvez na Bienal Iberoamericana de 2006 em Montevidéu, provavelmente na edição do mesmo evento em 2008, em Lisboa, quando me lembro de ter conversado por diversas vezes com o intelectual argentino e de ter me impressionado com sua inteligência e perspicácia. Creio que “intelectual” seja o termo correto para designar este profissional de múltiplas atividades e interesses – arquiteto, professor, escritor, crítico, editor, consultor... –, pois seus conhecimentos e preocupações partem quase sempre das questões específicas da disciplina arquitetura e urbanismo, mas invariavelmente espraiam por outras áreas de conhecimento. Ao mesmo tempo em defende conformar arquitetura e urbanismo um único corpus teórico e prático, seus argumentos acabam se enveredando por outros temas, como sustentabilidade, economia e estética.
O seu engajamento político (não partidário, ao menos que tenha percebido) é uma faceta facilmente visível de seu caráter, pois é uma pessoa que entende que o fazer individual deve estar em alguma medida comprometido com uma demanda coletiva. Ao comentar projetos que visam diminuir o impacto da infraestrutura nas metrópoles, Diez afirma que muitas vezes nestes projetos é contrabandeado um “aspecto hedonista, puramente visual, do qual não compartilho”. Para logo a seguir sentenciar o que é de fato importante: “Enterrar autopistas para não vê-las, como se fez em Boston ou em Madri a um custo astronômico, produz belos parques na superfície, mas todo esse paisagismo que oculta o que acontece embaixo apenas adia as decisões radicais que devem ser tomadas, como os impostos sobre o combustível fóssil, investimentos em transporte publico e adensamento de cidades demasiado estendidas”.
Mas uma das coisas que mais me chamou atenção na sua personalidade é sua capacidade de ver os fenômenos de uma maneira nova ou ao menos diferente, o que é possível – penso eu – graças a uma curiosidade genuína de quem não se contenta com o lugar-comum como explicação. Em uma edição do Docomomo ocorrida em Porto Alegre há alguns anos e cujo tema era o concreto, Diez fez uma apresentação brilhante sobre fôrmas de madeira usadas na concretagem de edifícios. As marcas indeléveis deixadas pelo madeirame na superfície das estruturas à vista conferiam ao edifício seu caráter particular, sua essência tectônica. Ao final, com fina ironia, Fernando projetou uma foto que registrava um momento de descanso na obra, onde os trabalhadores braçais usavam as tábuas de madeira transformadas em sucatas como lenha para o churrasco do almoço. Uma reciclagem digna do humor portenho! Foi uma das mais belas palestras que tive o prazer de ver e ouvir em toda minha vida.
Nos blocos temáticos desta entrevista os leitores poderão verificar por si próprios as opiniões sensatas e engajadas de Fernando Diez, como também tomar conhecimento de sua trajetória de vida.