Abilio Guerra: Você tem atuado com grande dedicação à docência. Como vê o papel do professor nos dias atuais?
Fernando Diez: As escolas de arquitetura sofrem a mesma crise que a disciplina em seu conjunto. A sociedade deve reorientar seus esforços do mero produtivismo para uma racionalidade sustentável, tanto social como ambiental. A arquitetura moderna elegeu as metáforas que exaltavam a produtividade da máquina e o poder da tecnologia. Suas figuras estéticas foram o balanço, o esforço estrutural dos grandes vãos, a transparência incondicional e o ar condicionado, o uso do aço sem restrições, a oposição artificial-natural. Trata-se do poder da vontade humana se impor ao meio ambiente que pode ser exemplificado em começar sempre da tábula rasa. Hoje não podemos pensar em uma renovação da arquitetura repetindo essas figuras que produziram os edifícios climaticamente mais ineficientes, menos adaptados ao sítio e mais irracionais em termos da energia usada para sua construção. A façanha estrutural sobre o meio natural produziu algumas das casas mais espetaculares do século XX, mas eram também arquiteturas narcisistas que não prestavam suficiente atenção ao custo energético de manufatura, ao custo da construção, nem à reutilização do construído. As escolas de arquitetura se deparam com a necessidade e a dificuldade de rever estes princípios, que estão profundamente mergulhados na tradição moderna e que fazem parte dos reflexos, por assim dizer, dos professores mais experimentados.
AG: Como professor visitante, você tem conhecimento da realidade de várias escolas de arquitetura, inclusive no exterior. Há muita diferença entre as escolas? Quais?
FD: As diferenças não são tantas, ainda que o jargão popular diga que “o gramado do vizinho sempre está mais verde”. Creio que nas escolas muito grandes há uma dificuldade em se estabelecer um controle sobre a qualidade dos formandos, porque elas contam com alguns profissionais formados de altíssima qualidade, mas a média não é necessariamente boa. Por outro lado, nas escolas de uma escala mais controlada é mais viável assegurar o nível da média dos graduados. A qualidade de uma escola não é resultado obtido pelo melhor de seus formandos, mas pelo pior: esse é seu nível. Ao mesmo tempo vejo um atraso no desenvolvimento dos estudos de pós-graduação, mais na Argentina do que no Brasil, o que faz com que haja certa confusão sobre o que deve se ensinar em cada nível: creio que na graduação deve ser dada menos ênfase na originalidade e mais na aprendizagem das soluções conhecidas, e que na pós-graduação é o âmbito onde se deve buscar a experimentação e a inovação.
AG: Você tem também atuado como consultor nas áreas urbana e ambiental. Que tipo de consultoria você dá?
FD: Na área do urbanismo eu tenho trabalhado com as agências governamentais no estudo e no projeto de regulamentação de edificação e em critérios de desenvolvimento urbano. No âmbito da educação, tenho participado da comissão que estabeleceu os critérios para o processo de credenciamento universitário, um processo que se baseia na auto-avaliação, e através dessa comissão também estivemos atuando no âmbito do Mercosul. O que mais me interessa a alguns anos é o que antecede à elaboração especificamente técnica, ou seja, os critérios para a formulação das políticas públicas relacionadas especialmente ao meio ambiente e à cidade. Agora se encontra no prelo meu livro Agenda pendiente, que é precisamente uma coletânea de artigos sobre meio ambiente publicados na coluna “Opinião” do jornal La Nación entre 2001 e 2011.
AG: Qual o papel do editor nos dias atuais?
FD: O editor deve ter suas próprias ideias e participar de todas as discussões importantes. Parece-me que está no desígnio dos tempos reconhecer que não sabemos todas as respostas, pois inclusive pode ser que não haja uma única resposta. Nesse sentido, não sou adepto dos dogmatismos, acredito mais na dúvida. É precisamente porque duvidamos que necessitamos escutar outras posições, discuti-las, e ainda assim precisamos estar conscientes da falibilidade de nossas conclusões. Por outro lado, a diversidade é um dado da riqueza cultural, de modo que o pluralismo é algo produtivo. Agora sabemos que o universalismo eurocentrista era uma miragem de uma certa superioridade técnica; hoje sabemos que não estamos no controle dos acontecimentos. O bom editor deve aceitar que há um campo desconhecido que é o futuro, e que não há uma receita pronta. Todas as opções sérias devem ser exploradas, e nenhum plano é infalível. Melhor é poder discutir e avaliar constantemente o rumo e ser capaz de fazer correções a todo o momento. Não podemos nos permitir o luxo de descartar boas ideias porque não são as nossas. Essa é a marca da crise atual, na qual a arquitetura deveria ter uma palavra que dizer.