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my city ISSN 1982-9922

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FREIRE, Paulo Sérgio Machado. O transporte urbano de João Pessoa. Minha Cidade, São Paulo, ano 08, n. 092.04, Vitruvius, mar. 2008 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/08.092/1898>.


Figura 1 – Manaíra, mais uma casa demolida


Figura 3 – Gráfico sobre passageiros transportados por ônibus em João Pessoa. Fonte: STTrans

Figura 2 – Manaíra, verticalização acelerada

Figura 5 – Manaíra, Av. Maria Rosa

Figura 4 – Manaíra, Av. Francisco Brandão

 

O crescimento desordenado das cidades, verificado nas últimas décadas, vem ocasionando uma defasagem entre as necessidades dos serviços de infra-estrutura e a respectiva capacidade do Poder Público para o seu atendimento. Por sua vez, o elevado número de veículos em circulação nos centros urbanos, vem ocasionando problemas ao trânsito de veículos e de pedestres, em vista da dificuldade crescente de mobilidade de bens e pessoas através do sistema viário. As deseconomias, decorrentes desse problema estão sempre presentes, na forma de acidentes de trânsito, poluição e tempo perdido em congestionamentos.

A Cidade de João Pessoa, começa a apresentar sinais claros de queda em sua mobilidade. Já se sente que, alguns corredores de transporte estão a beira da saturação de sua capacidade de escoamento de tráfego. Em 1997, um estudo realizado pelo IPEA em conjunto com a ANTP, acusou que as deseconomias urbanas, devido à existência de congestionamentos, já superavam o valor de 2,75 milhões de reais por ano em João Pessoa. Este mesmo estudo mostrou que, na época, os automóveis e ônibus atingiam em média, nos corredores de transportes pesquisados, velocidades de 29 km/h e 20 km/h, respectivamente. Vale ressaltar três anos após esse estudo a frota de cadastrada em João Pessoa era composta por 99.158 veículos e hoje já supera os 140 mil – mais precisamente 144.835 veículos, segundo dados do DETRAN/PB de 07 de julho de 2006 (1).

Presume-se que essa perda de mobilidade urbana de João Pessoa, tem também forte relação com a configuração do atual sistema de transporte público de passageiros, o qual é basicamente operado em corredores que convergem para o centro comercial, caracterizando uma morfologia urbana predominantemente rádio concêntrica. Segundo Campos Filho (2), este tipo de morfologia intra-urbana, que era dominante até a década de 1950, ao sofrer o incremento do uso dos automóveis, o qual requer um espaço viário cada vez maior, logo se torna congestionada, comprometendo a eficiência dos percursos.

Os congestionamentos provocam reduções sensíveis na velocidade de tráfego urbano, conduzindo a velocidades médias inusitadas neste princípio de século XXI. Um estudo recente apurou que as velocidades de tráfego nas cidades européias diminuíram 10%, ao longo dos vinte últimos anos. Em um percentual considerável destas cidades, a velocidade média dos automóveis nas áreas centrais da cidade eram inferiores à 19 km/h, ou seja, com todo o avanço tecnológico, ainda eram menores que a velocidade de serviço das antigas carruagens na época do renascimento (3).

No caso particular de João Pessoa, o grande pólo de atração de viagens da cidade é a Área Central, onde concentram-se as maiores parcelas das atividades comerciais e administrativas. Essa área originou-se da expansão do centro histórico e apesar de ser denominada de Área Central não se localiza no centro geométrico da cidade, consequentemente, o transporte urbano tem a frente um grande obstáculo, a morfologia da cidade, que o impede de ser mais racional e eficiente. Outrossim, as vias do centro são estreitas, o que prejudica sensivelmente os acessos a esse setor, devido ao acúmulo de veículos em pouco espaço para se deslocar e para estacionar.

O sistema de transporte coletivo, operado com linhas predominantemente radiais, também é outro fator que agrava ainda mais a mobilidade, tendo em vista que as linhas convergem praticamente para um só ponto da cidade. Com a ocorrência de congestionamento de tráfego, os tempos de viagens ficam cada vez maiores e a única solução aplicada pelo gestor público é aumentar a frota para manter o mesmo número de viagens.

O aumento da frota agrava ainda mais os congestionamentos, gerando um círculo que contribui gradativamente para degradação do transporte coletivo e para fuga de seus usuários para outros modais de transporte. Quando o usuário tem condições financeiras migra para o auto particular, quando não tem se arrisca de bicicleta ou anda a pé.

É necessário ressaltar que, entre outros fatores, a falta de planejamento de transporte urbano em João Pessoa, está interferindo de forma negativa na eficiência desse serviço e induzindo à implementação de medidas corretivas, emergenciais e pontuais, as quais são grandes consumidoras de recursos públicos e têm sobrevida relativamente curta.

O Plano Diretor de Transporte Urbano, elaborado pelo GEIPOT e EBTU em 1985, foi o último estudo abrangente para o setor, nessa época a cidade contava com apenas 329.942 habitantes (4). Esse plano baseou-se nas diretrizes de uso do solo para o ano 2000.

O sistema de transporte público de passageiro de João Pessoa é composto pelos serviços de transporte coletivo por ônibus (convencional e opcional), veículos de aluguel a taxímetro, transporte de escolares, transportes especiais (turístico e fretamento), gerenciados pela Superintendência de Transportes e Trânsito. O sistema de transporte público conta ainda com o transporte ferroviário, trecho entre os bairros do Alto do Mateus e Mandacaru, gerenciado pela CBTU.

O transporte por ônibus, que até o final da década de 90 era eficiente, bem definido e servia de referência para cidades de porte médio, hoje dá sinais de ineficiência e degradação. Tal problema não só é fruto da falta de estudos, ações e investimentos públicos no setor, mas também da concorrência desleal, promovida por veículos que circulam no aglomerado, principalmente em João Pessoa, praticando serviço remunerado, sem terem sido autorizados pelos órgãos competentes. Tais veículos intitulam-se “transporte alternativo”, mas que na verdade, não passam de simples transporte clandestino ou ilegal.

O sistema de transportes coletivos de João Pessoa, que já chegou a transportar mais de 10.000.000 de passageiros por mês, no início da década de 90, hoje não consegue transportar 8.500.000 passageiros por mês, produzindo quase o dobro de sua quilometragem, com o dobro da frota. Em 1993, esse sistema que transportava em média três passageiros equivalentes a cada quilômetro rodado, hoje tem um índice de passageiros por quilômetro de 1,86 com tendência de queda, segundo dados operacionais da STTrans de João Pessoa (5).

A partir do dia 10 de março de 2005, o Terminal Urbano de Passageiros, localizado no Varadouro, próximo ao Terminal Rodoviário, foi cercado com grades e passou a ser um ponto de integração tarifária, onde os passageiros, que chegam das linhas urbanas que ali trafegam, podem fazer o transbordo para outra linha, sem pagar uma nova passagem.

Existia uma grande preocupação das empresas operadoras e até de especialistas com a integração do sistema de transporte coletivo, sob a lógica desse movo modelo de operação ser um fator de diminuição de passageiros pagantes e de conseqüente aumento do custo do sistema. Mas a figura 3, mostra que não houve diminuição de passageiros pagantes, indicando assim, a ocorrência de uma compensação exercida pelo aumento da utilização do transporte coletivo, ou seja, o serviço ficou mais atrativo.

Houve também a preocupação com o fato do ponto eleito para integração se localizar numa área onde as vias têm capacidade de tráfego limitada, não permitindo assim incremento de viagens. Mas em vista da promessa de se implantar, em seguida, uma integração aberta com bilhete eletrônico, tal preocupação não teria mais sentido.

Por outro lado, não deixa de ser preocupante o fato de partir para uma integração aberta e temporal de linhas predominantemente radiais, sem antes estudar o sistema como um todo, para estabelecer um serviço mais racional, em termos operacionais e econômicos. Um estudo consistente poderá acusar a necessidade de adotar, em algumas áreas, linhas troncais, operadas por veículos de maior capacidade, alimentadas por veículos leves, diminuindo assim a frota que converge para o centro.

Em duas zonas da cidade, as ocupações e uso do solo, estão interferindo na eficiência do transporte urbano. Na zona sudeste, a ocupação ocorre predominantemente de forma horizontal e se distancia a cada vez mais do centro da cidade. Já na zona leste, devido ao limite imposto pelo oceano, ocorre um adensamento caracterizado pela verticalização das habitações. Assim, como este adensamento é fruto da procura da classe abastada por áreas mais valorizadas, a capacidade de tráfego das vias de acesso estão cada vez mais comprometidas, pelo uso excessivo do automóvel.

Na zona sudeste, que tem como eixo o corredor Pedro II, a cada dia que passa, novos territórios vão se formando, nascem loteamentos e conjuntos habitacionais, resultando em uma excrescência urbana. Essa área abriga, predominantemente, uma população de baixa renda, que depende do transporte coletivo ou de meios de transportes de menor custo, para se deslocar no seu dia a dia. Esse fenômeno compromete sensivelmente a mobilidade do referido corredor, que uma vez dificultada, acaba se caracterizando como fator de exclusão social, pois prejudica exatamente a camada menos favorecida da população, que não tem condições financeiras de ao menos circular em um transporte coletivo, consequentemente, deixam de ter acesso a oportunidades de emprego, renda e educação.

Os corredores Epitácio Pessoa e Tancredo Neves, apesar de terem extensões limitadas pelo oceano, também sofrem com o crescimento vertical das habitações da zona leste. A cada dia as habitações horizontais, remanescentes de sua primeira ocupação, estão sendo demolidas para dar lugar a habitações verticais.

Esse fenômeno obriga o poder público a investir em infra-estrutura de serviços urbanos. Nessa área os bairros de Manaíra, Tambaú e Cabo Branco, são os que abrigam a população mais abastada, que substituem, cada vez mais, o transporte coletivo pelo automóvel particular para se deslocarem no seu dia a dia.

Basta percorrer as ruas desses bairros para perceber uma grande quantidade de automóveis estacionados nas pistas de rolamento ou nas calçadas dos edifícios residenciais, devido a incapacidade que os mesmos têm de oferecer áreas de estacionamento, capazes de acompanhar o crescimento descontrolado do uso do automóvel. As figuras 4 e 5 mostram as conseqüências do uso descontrolado do automóvel neste bairro.

Os corredores Pedro II, Epitácio Pessoa e Tancredo Neves estão necessitando urgentemente de soluções para restabelecer a fluidez e a segurança do tráfego de passagem e, consequentemente, devolver a acessibilidade para a qual foram concebidos.

Estas soluções podem se materializar na criação de acessos alternativos para a conseqüente desobstrução dos corredores pelo remanejamento de tráfego, mas de nada adiantarão se não forem seguidas de um eficiente sistema de transporte de massa.

Nesse sentido alguns projetos foram concebidos, mas não saíram do papel, como é o caso do projeto de transporte de massa com a utilização de um veículo leve sobre trilhos (VLT), para os corredores Epitácio e Pedro II; e uma segunda versão desse mesmo projeto, mas substituindo o VLT pelo ônibus articulado.

Congestionamentos crônicos, queda da mobilidade e da acessibilidade, degradação das condições ambientais e altos índices de acidentes de trânsito já constituem problemas graves nas grandes cidades brasileiras, o que tenderá a acontecer rapidamente nas cidades médias se nada for feito para deter este processo.

Apesar de não ser considerada uma grande cidade brasileira, João Pessoa, sofre também com tais problemas urbanos. Assim além de buscar soluções para neutralizar ou pelo menos minimizar o impacto desses, tem também que se preocupar em achar soluções para um problema adicional específico, relacionado com sua morfologia intra-urbana que interfere na eficiência do transporte urbano e consequentemente na mobilidade da população.

Investimentos em serviços urbanos de infra-estrutura, principalmente os de transportes urbanos, correspondem sempre à maior parcela dos investimentos fixos do Estado nas Cidades. Dessa forma os investimentos deveriam se basear em estudos de viabilidade consistentes, sem a obrigação de apontar para apenas para obras físicas de aumento da capacidade de tráfego das vias.

A cidade de João Pessoa necessita urgentemente de estudos que apontem para a adoção de um novo modelo de transporte de massa, que exerça forte atração nos usuários de outros modais, a ponto de induzi-los a migração para o transporte coletivo.

É claro que muito dos problemas atuais existem devido a falta de um eficiente serviço de transporte público, o qual, em determinados casos é considerado um castigo para quem o usa, pois só o usa, quando pode, porque não tem outra opção.

notas

1
DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DO ESTADO DA PARAÍBA. Relatório da Evolução Anual da Frota de Veículos de João Pessoa. João Pessoa, 2006.

2
CAMPOS FILHO, Cândido Malta. Cidades brasileiras: seu controle ou o caos urbano. O que os cidadãos devem fazer para a humanização das cidades no Brasil. 4ª edição – São Paulo: Stúdio Nobel, 2001, p. 87.

3
RIBEIRO, Edson Leite. Cidades (in)sustentáveis: reflexões e busca de modelos urbanos de menor entropia. João Pessoa, Editora Universitária, 2006, p. 103.

4
GEIPOT. Estudo de transportes urbanos de João Pessoa: plano diretor de transportes urbanos. PDTU. Brasília, 1985.

5
SUPERINTENDÊNCIA DE TRANSPORTES E TRÂNSITO DE JOÃO PESSOA. Relatório de desempenho operacional de transporte coletivo por ônibus. João Pessoa, 2005.

sobre o autor

Paulo Sérgio Machado Freire, mestrando no Programa de Pós Graduação em Engenharia Urbana, Universidade Federal da Paraíba

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