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my city ISSN 1982-9922

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FERRAZ, Marcelo. Na FLIP, de olho no chão. Minha Cidade, São Paulo, ano 10, n. 110.01, Vitruvius, out. 2009 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/10.110/1836>.


Paraty
Foto Eduardo Girão


Paraty
Foto Tuca Vieira

Ouro Preto
Foto Nelson Kon

Tiradentes
Foto Nelson Kon

Tiradentes
Foto Nelson Kon

 

Acaba de acontecer mais uma Festa Literária Internacional de Parati, a VII FLIP, evento anual que, de sucesso em sucesso, vai se consagrando no calendário cultural do país. Essa festa das letras é também a festa da cidade, uma celebração da convivência urbana. Em Parati, durante cinco dias de intenso movimento de pedestres, pode-se ver e viver momentos raros, quase inexistentes hoje em dia em nossas grandes ou médias cidades: o movimento intenso de gente que passeia para lá e para cá, sem rumo certo, como no antigo footing das cidades do interior; grupos de pessoas com suas cadeiras nas calçadas, defronte às casas, “pegando a fresca”, ou nas janelas, acompanhando a movimentação humana. Gente de todas as partes, por todo o lado, num “converse” sem fim, usando a cidade como palco maior de encontros, como deve ser.

Entretanto, apesar do aconchego e da escala humana e gentil da cidade colonial, passear por Parati é como saltar de pedra em pedra – as alpondras – na travessia de um rio ou riacho. Imagino que todos nós já tivemos essa experiência, pelo menos uma vez na vida: ou você acerta a pisada, ou escorrega e cai, vira o pé, enfim, se dana. O piso é restritivo, desconfortável, impróprio para caminhar. E o que dizer dos carrinhos de bebê, das muletas, bengalas e cadeiras de roda? As ruas de Parati são exemplos maiores de inacessibilidade.

Esse é um problema que deve ser encarado e não contornado nos dias de hoje. Devemos apelar aos órgãos de proteção do patrimônio histórico em todas as instâncias, e às prefeituras, para que busquem soluções adequadas e criativas para que mais gente possa acessar e circular livre de atenção demasiada ao piso e de acidentes. E não somente em Parati, mas em todas as nossas cidades históricas que possuem pavimentos irregulares de pedras – lindos, românticos, mas absolutamente intransitáveis, impróprios para caminhar. Ouro Preto, Olinda, Salvador e tantas outras cidades devem enfrentar o problema e apresentar suas soluções.

Por que não adotar, por exemplo, um granito liso, mas não polido, um granito antiderrapante, no centro das ruas, formando uma pista ou “tapete” de pedra carroçável, inspirado nas antigas pedras chamadas capistranas, que formavam um eixo central nas ruas de nossas cidades coloniais, espécie de canaleta para coletar a água da chuva? Seriam as nossas “capistranas contemporâneas”.

Assim fizemos na rua central do Sesc Pompéia, que é toda em paralelepípedo, muito menos irregular que as ruas de Parati ou do Pelourinho. Ali tem funcionado muito bem, não só para os que têm dificuldades de caminhar, para as cadeiras de roda e carrinhos, mas também para as mulheres de salto alto.

A maioria das cidades históricas da Itália, Espanha ou Portugal possuem ruas de pavimento regular, carroçável e seguro, muitas vezes feitos com materiais modernos como o concreto ou o asfalto. E isso não configura pecado ou heresia contra o “sagrado patrimônio histórico”. De que serve o patrimônio se não pode ser de todos e para todos? Devemos lembrar que as cidades devem atender a usos e demandas atuais, de nossos dias. Não vivemos no passado e nem no futuro. E nossas cidades históricas podem até – vejam bem, até – passar por belos cenários, mas são, antes de tudo, cidades, com a plenitude de significados e funções que esta palavra carrega.

O acontecimento FLIP é exemplar quando propõe a experiência de vida intensa, de trato urbano, enfim, de convivência entre pessoas ou grupos de pessoas. E este exemplo poderia se alastrar, contagiar outras tantas cidades brasileiras, não somente as pequenas e históricas, mas também as grandes, gigantes, como a São Paulo da Virada Cultural.  E Parati poderia sair na frente com uma solução de piso contemporâneo para nossas cidades históricas.

E, quem sabe, no próximo ano, na VIII FLIP, com as ruas de Parati já caminháveis, poderemos, ao invés de olhar para o chão – pedra, pedra e pedra, prestar mais atenção ao casario, às igrejas, às praças e, principalmente, à gente variada que transita prá lá e prá cá. Até lá.

sobre o autor

Marcelo Ferraz é arquiteto formado pela FAU-USP em 1978, é sócio do escritório Brasil Arquitetura, onde tem realizado vários projetos com premiações no Brasil e exterior. É também sócio fundador da Marcenaria Baraúna, onde desenvolve projetos de mobiliário, desde 1986.

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