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Análise sobre a condição atual do Sítio Mirim, patrimônio histórico dentro do município de São Paulo, que sofre em um avançado estado de deterioração.
FIGUEIREDO, Cecília; BARBOSA SILVA, Ruy. Patrimônio cultural. Sítio Mirim se deteriora sob ataques especulativos e impasses jurídicos. Minha Cidade, São Paulo, ano 14, n. 161.03, Vitruvius, dez. 2013 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/14.161/4985>.
Momento propício esse para falar da importância de um patrimônio histórico. Momento em que se discute a revisão do Plano Diretor da Cidade de São Paulo, do equilíbrio entre as classes que vivem na cidade. Em que trazemos à luz nossa história, enterrada pelo obscurantismo dos anos de chumbo no Brasil. Momento em que as vozes já não são “roucas”, pelo contrário, bem mais “fortes” e atravessam as ruas do País desde junho para cobrar mais Estado e serviços públicos de boa qualidade.
É exatamente nesse cenário, que também nos animamos a tirar do quase ostracismo uma parte de nossa história, da história de nossa cidade que está na iminência de se tornar pó, caso não haja uma ação imediata. Falamos aqui do Sítio Mirim, ou melhor das ruínas históricas que, embora tombadas, aguardam uma ação pública efetiva de preservação, enfrentando ataques do desconhecimento, da sanha da especulação imobiliária e de megaobras de empreiteiras.
Inseridas no setor de reestruturação e requalificação do atual Plano Diretor da Cidade de São Paulo, as ruínas históricas do Sitio Mirim, em São Miguel, Zona Leste da Capital, estão em risco de sumir e com elas mas um pedaço importante da herança cultural de nosso território.
Dos restos remanescentes da edificação recuperada pelo Iphan (Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), em 1960, reside uma grande controvérsia. Alguns estudos apontam aquele local como originário do século 17, documentos do Centro de Arqueologia de São Paulo indicam que sua implantação na região era estratégica para o controle de mercadorias e viajantes, por meio do Estado pelo rio Anhenby (atual Tietê). É necessário mais luz sobre essa história para dirimir as dúvidas sobre o uso efetivo deste local no período de sua construção. Mas isso é assunto para um próximo artigo. O certo é que a configuração espacial representada pela sua planta é única, evidenciando a mesma no rol das casas bandeiristas.
Hoje, esparsos pedaços de paredes em estado avançado de deterioração estão erguidos frente ao descaso público, as intempéries e o quase completo desconhecimento sobre o Sitio Mirim, um marco histórico em nossa cidade, apesar de muito prejudicado pelo isolamento geográfico em relação à várzea, decorrente da implantação da linha ferroviária Central do Brasil, em 1930.
Somada à invisibilidade, o Sítio Mirim hoje é alvo também de impasse jurídico que já está no Supremo Tribunal Federal (STF). Tudo por conta de divergência em relação à técnica a ser aplicada para salvaguardar o que restou daquela edificação – as ruínas, tombadas no Sphan, Condephaat, DPH e Conpresp.
Ainda que a legislação em vigor no Brasil nos níveis federal, estadual e municipal determine apenas o que não deve ser feito na área, mas nada a respeito do que pode ser feito, não se pode deixar sumir mais um patrimônio do povo. E foi por essa razão que o arquiteto e autor desse artigo, junto com outras pessoas que compõem o Forum de Cultura de São Miguel, apresentam uma alternativa concreta sobre o modelo de intervenção que ali caberia para preservar o patrimônio histórico e cultural. Providenciar uma proteção emergencial das ruínas remanescentes, justaposta à liberação de continuidade das prospecções arqueológicas no seu entorno, que embora venha sendo solicitada desde 2006, aguarda decisão do Departamento de Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura (DPH-SMC).
Então aqui fazemos questão de lembrar de uma conquista cara, empenhada pelo movimento pela Reforma Urbana, que reuniu arquitetos, pesquisadores, estudiosos, gente da academia e das comunidades, o Estatuto da Cidade, que traz em seu cerne a discussão do “direito à cidade”.
A área onde se encontra o Sítio Mirim guarda outros problemas, bastante conhecidos das camadas mais pobres e que menor direito tiveram à cidade por muitas décadas. São problemas de ordem ambiental e social, que não podem esperar. Um deles é a ameaça de despejo de uma comunidade de mais de 150 famílias, que vivem no entorno da área, para dar espaço à implantação da Estação de Trem União Vila Nova: Linha 12 Safira pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).
Portanto, a ação de elaborarmos uma proposta consensuada e funcional em favor da preservação das ruínas, assim como ao efetivo agenciamento das outras propostas previstas para o entorno, tem o intuito de promover o desembaraço burocrático deste impasse, que somente tem contribuído para tornar mais precário aquele espaço, que ainda acolhe parte de um patrimônio sociocultural público (hoje estimado em menos de 23% da construção original), assim como as condições de vida da população que ali mora e poderia se beneficiar de um espaço qualificado de convivência.
O resgate da memória, da história que envolve o Sítio Mirim depende de uma providência efetiva. Conter o vertiginoso processo de deterioração, que já vem sendo investigado pelo Ministério Público Estadual desde 1998, tornou-se indiscutível.
Essas são algumas das razões que nos levaram a elaborar um manifesto, promover ações públicas de informação, esclarecimento para a população e cobrança das autoridades competentes. Sabemos que medidas até pouco tempo impensáveis hoje são viáveis, afinal vivemos um período de intenso debate para implantação do IPTU progressivo, de convite à participação popular e de passar a história a limpo. Evitar a supressão completa daquele marco histórico, ícone físico e da memória de um período histórico desta cidade e do Brasil, é antes de tudo direito humano e de defesa de nosso direito à cidade.
sobre os autores
Cecília Figueiredo é jornalista formada pela FIAM-FMU (1992), atualmente é editora-adjunta na Fundação Perseu Abramo. Foi supervisora de Cultura da Subprefeitura de São Miguel (gestão Fernando Haddad). Na Prefeitura de Suzano, trabalhou entre 2005 e 2012 na assessoria de imprensa das pastas de Saúde, Educação, Governo e Participação Popular – nas duas últimas, integrou o grupo coordenador do Orçamento Participativo.
Ruy Barbosa Silva, é arquiteto e urbanista formado pela (FAU-UBC), Universidade Brás Cubas em 1992. Foi diretor do SASP entre 1994-1998, tentou fazer mestrado na (FAU-USP) em Estruturas Ambientais Urbanas, e atualmente integra o Fórum de Cultura São Miguel.