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my city ISSN 1982-9922

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O tecido urbano de João Pessoa está gradativamente recebendo novas intervenções que configuram novas rotas, novos fluxos, novas pistas ou faixas viárias sinalizadas para a inclusão de novos meios de transporte, como é o caso da circulação de bicicletas.

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HONORATO, Rossana. Mudança de hábito. A introdução paulatina de alternativas ao trânsito de automóvel em João Pessoa. Minha Cidade, São Paulo, ano 14, n. 162.04, Vitruvius, jan. 2014 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/14.162/5016>.



Possivelmente a sociedade observa o empenho que a gestão municipal vem demonstrando em aderir a uma política pública de transporte por meio da adequação de seu sistema viário às necessidades de deslocamentos cotidianos que cruzam a cidade de João Pessoa, da periferia ao centro, ou que conectam novas centralidades a seus destinos, com o intuito de atender à expansão e à fluidez da mobilidade urbana ascendente. Um reordenamento gradativo de vias a portes e rotas adequadas ao fluxo de distintos meios de transportes urbanos chega, ora agradando ora incomodando, à população de diversos bairros da capital do estado da Paraíba.

A elaboração e, sobretudo, a implantação de um plano diretor de transportes é desafio dos grandes para a dinâmica urbana de cidades de médio porte em expansão, como é o caso. É ainda maior quando o país parece estar mergulhado em uma política de crescimento econômico sem planejamento, cuja ideologia hegemônica parece estar direcionada a tanto quanto menos transparente para a sociedade a possibilidade de acompanhar e monitorar as decisões governamentais, melhor.

A busca da garantia do pleno direito à cidade e da construção de uma ativa cidadania brasileira, conceitos solidamente firmados pela Constituição Cidadã, 1988, exige uma reforma radical na gestão pública em prol da reincorporação de uma cultura planejamento que se aproprie inclusive da exígua experiência brasileira em planejamento das políticas socioeconômicas.

À parte essa expectativa incessante, vê-se o tecido urbano de João Pessoa gradativamente ser cortado de intervenções esparsas que configuram novas rotas, novos fluxos, novas pistas ou faixas viárias sinalizadas para a inclusão de novos meios de transporte, como é o caso da circulação de bicicletas.

A iniciativa é animadora. Uma mentalidade cultural está em formação na cidade: estimular a população a trocar o carro particular pela bicicleta como meio de transporte e, sobretudo, acolher e passar a proteger as centenas ou milhares de trabalhadores que se deslocam casa-trabalho-casa, diariamente e da maneira mais perigosa, nos principais corredores urbanos de João Pessoa desprovidos de pistas exclusivas para bicicletas.

Aos observadores, já é óbvio e a urbanistas, tardio, que um imperativo global demanda às cidades respostas rápidas e efetivas para, ao menos, atenuar o impacto negativo do, cada vez mais denso, volume do tráfego de veículos particulares que a dinâmica das metrópoles contemporâneas carreia. O que, convém lembrar, converge ainda para posicionar os países em melhor condição de corresponder aos compromissos assumidos internacionalmente, a cada ano, perante a Agenda 21, para reduzir a emissão de gases poluentes na atmosfera, provenientes de derivados dos combustíveis fósseis que predominam na geração da força-motriz de automóveis.

Superar a carência de uma política de transporte público de qualidade implica aplicar medidas de desestímulo ao uso do automóvel particular, e dar voz e vez à exigência social por qualidade da oferta. O que já começa, ainda que lentamente, a constituir-se socialmente um senso comum.

Com o recurso à bicicleta como meio de transporte urbano, a economia persegue um equilíbrio entre o recurso à natureza e à diminuição da exaustão de seu suporte. Ainda que o clima tropical úmido e quente, ensolarado na maior parte do calendário anual, se coloque como mais um empecilho à mudança de hábito para a sociedade pessoense e que impere uma aparente resistência de agentes e profissionais atuantes em organismos públicos ao recurso da arborização urbana, a lembrar que as árvores são as melhores coberturas a projetar em espaços urbanos abertos e de livre circulação. Mas, o desenho fácil porque imediatista, a carência de uma formação técnica compreensiva da valia da firmação da identidade paisagística local, da cidade como expressão de cultura, de organogramas executivos que não acolhe o que deseja para a cidade seus cidadãos, terminam constituindo as principais diretrizes de projetos urbanísticos na gestão municipal.

A adoção do circuito domingueiro da prática do ciclismo que se assiste na cidade de João Pessoa, da praia à Lagoa do Parque Solon de Lucena, através do principal corredor expresso da cidade: a Avenida Epitácio Pessoa, no período das 06 horas matinais às 16 vespertinas, é política que merece atenção e aplauso. Crê-se aqui também um estratégico recurso midiático para iniciar ou fomentar a construção de uma nova mentalidade social.

Nota-se uma adesão gradativa da sociedade, inclusive eufórica. Pessoas se integram gradativamente às inovações em curso, de todas as classes sociais, idades, protegidas ou não contra quedas e queimaduras solares, mais ou menos educadas, que se vê aglomerar cada vez mais aos domingos para participar do programa municipal do circuito agendado de rotas de ciclofaixas urbanas.

Urge refletir acerca da oportunidade, se não é o programa domingueiro um importante recurso para incorporar novos valores culturais, como a ampliação do sistema de rotas de transporte para bicicletas, ainda que por agendamento e escala, por toda a cidade.

A vivência de uma dessas ocasiões estimulou esta articulista à experimentação de um ousado método de observação participante ao percorrer de bicicleta um curto deslocamento entre os bairros de Miramar e Cabo Branco, à noite, ao instante em que diminuía a hora de pico do translado trabalho-casa em um desses dias.

Um "tô nem aí" de motoristas, movendo veículos acima da velocidade permitida, valas perigosas criadas entre as camadas de recapeamento do asfalto das vias e o alinhamento do meio-fio (que fazem vezes de sarjetas que drenam as águas das chuvas) e o medo de uma abordagem violenta, colocou-a no lugar de centenas ou milhares de trabalhadores que circulam, diariamente, de bicicleta de casa para o trabalho e do trabalho para casa.

A boa iniciativa da Secretária de Mobilidade Urbana da Prefeitura João Pessoa, pode ser agregada a uma campanha midiática educativa, imediata e massiva, dirigida aos condutores de veículos públicos ou particulares (de quatro a duas rodas) e aos pedestres inclusive para disseminar gradativamente uma compreensão social da noção de hierarquia na circulação urbana, que pontifique culturalmente em uma escala de respeito à prioridade dos pedestres aos veículos particulares. A campanha, se bem projetada, poderá repercutir sobre o uso das vias ainda não providas de pistas exclusivas e/ou sinalizadas para cada modal de transporte.

Mudar hábitos não é política para curto prazo, mas, se priorizada nos investimentos públicos, torna-se culturalmente progressista. Com vagar, a sociedade vem acolhendo essa mudança de mentalidade. A política do respeito à faixa de pedestres, já incutida entre parte de motoristas e pedestres, flui inclusive em vias sem faixas sinalizadas e tem sido gradualmente valorizada na cultura da circulação urbana em João Pessoa. Obviamente, entre os bairros dotados de alguma infraestrutura viária.

Um plus midiático na política adotada ainda pode evitar acidentes graves e fatais na circulação dos transportes urbanos e repercutir em um rito de passagem cultural para uma nova mentalidade social enquanto ciclo-faixas e ciclovias não chegam aos principais corredores de circulação da cidade, e ainda agrega o que nem é objetivo essencial para a mobilidade urbana: atenuar significativamente a imensa demanda municipal pela política básica de remediação do “adoecimento social”, já que parte da população estará bem mais saudável.

nota

NE
Publicação original do artigo (sem as ilustrações, acrescidas nesta edição pela autora): HONORATO, Rossana. Mudança de hábito. Revista Artestudio, coluna Arquitetura & estilo de vida, seção Urbanismo, ano XI, n. 43, set./out./nov. 2013, p. 14.

sobre a autora

Rossana Honorato é professora do Departamento de Arquitetura da UFPB, pesquisadora do Laboratório do Ambiente Urbano e Edificado – LAURBE – DA – CT – UFPB. Arquiteta e urbanista e mestre em Ciências Sociais (sociologia Urbana), ambos pela UFPB, e doutoranda em Planejamento Urbano e Regional do Programa Interinstitucional UEPB – IPPUR-UFRJ.

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