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português
Reflexão sobre as relações das pessoas com os espaços de usufruto público implantados nos empreendimentos privados. Neste artigo há exemplo do que ocorre em um empreendimento de São Paulo e as relações de segregação ou integração no espaço.
english
Reflection on people's relationships with the spaces for public enjoyment deployed in private enterprises. In this article there are examples of what happens in a venture of São Paulo and the segregation or integration relations in space.
español
La reflexión sobre las relaciones de la gente con los espacios para el disfrute público desplegado en las empresas privadas. En este artículo hay ejemplo de lo que sucede en una empresa de São Paulo y la segregación o integración relaciones en el espacio.
RODRIGUES, Giselly Barros. Espaços de usufruto público nos empreendimentos privados. Integração ou segregação? Minha Cidade, São Paulo, ano 16, n. 187.04, Vitruvius, fev. 2016 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/16.187/5935>.
Ao conhecer a cidade de Nova York no ano de 2009, mais especificamente a região da Ilha de Manhattan, algo me chamou a atenção: os térreos dos empreendimentos privados, os espaços de uso coletivo (de usufruto público) e a relação destes com a população. Em geral, estes espaços são implantados em empreendimentos multifuncionais, onde essencialmente no pavimento térreo existe uma base comercial, áreas de entretenimento, praças e outros equipamentos que possuam algum atrativo para que o usuário possa usufruir do espaço.
Alguns questionamentos começam a surgir ao analisar rapidamente uma cidade como Nova York. Por que lá dá certo e aqui não dá? Por que lá existe essa tipologia – aparentemente funcional – e aqui não? Empiricamente sabe-se que existem algumas questões, principalmente em relação à legislação das cidades que estimularam ou não estes empreendimentos, além das diversidades sociais e culturais, mas é necessário avançar e aprofundar para entender melhor estas questões.
Questões diversas acerca deste tema têm surgido ao longo dos estudos: até que ponto o espaço de usufruto público no empreendimento privado é qualitativo para a sociedade? É possível viabilizar os térreos dos empreendimentos privados para o usufruto público sem segregação? Por que não existem muitos projetos privados com usufruto público (nos térreos) nas cidades brasileiras? Qual é a qualidade dos espaços de usufruto público nos empreendimentos privados? Para quem é destinado o térreo de usufruto público dos empreendimentos privados? Os espaços de usufruto público nos empreendimentos privados promovem integração ou segregação?
A meu ver a questão mais intrigante refere-se à segregação, citada por último. E a hipótese para esta questão – os espaços de usufruto público nos empreendimentos privados promovem integração ou segregação? – é que o espaço de usufruto público nos térreos dos empreendimentos privados promove integração entre os iguais e segregação entre os diferentes. Estabelecendo o uso do espaço para o perfil do público que pretende atender, ou seja, se o determinado empreendimento foi desenvolvido para o público da classe média alta, não é interessante que as classes inferiores frequentem os seus térreos, apesar de serem supostamente de usufruto público e abertos para todos.
Ao definir o local de implantação do empreendimento, os de materiais que serão utilizados nos edifícios, o padrão das lojas para a área comercial e a quantidade de seguranças, por exemplo, o empreendimento pode ter uma barreira não construída, invisível, mas existente e persistente, segregando o espaço que deveria integrar.
O empreendimento Brascan Century Plaza (1), localizado no Itaim Bibi, em São Paulo, é um dos poucos modelos contemporâneos de empreendimento que possui espaço de usufruto público no térreo. Neste existe cinemas, lojas, uma praça de alimentação em meio à área verde que permeia toda praça com bancos, espelho d’água e playground para as crianças, além de dois edifícios corporativos e flat hoteleiro. É possível cruzar por dentro desta praça e sair em duas ruas, já que o empreendimento circundado por três ruas.
O problema do Brascan, a meu ver, relaciona-se as questões de segregação e excesso de regras para manutenção da ordem. Por exemplo, no espaço não é permitido tirar fotos, apenas de pessoas, mas não do local – regras rígidas e sem fundamento. Se a pessoa está se posicionando para tirar uma foto é rapidamente abordada pelos seguranças. Lembro que em 2015 sugeri que uma aluna que estava pesquisando referências para o projeto do TCC, fosse visitar o Brascan por conta própria, ela voltou narrando todo seu constrangimento dentro do espaço, pois os seguranças a abordaram e depois ficavam observando todos os seus passos.
De fato a proposta de uma praça de usufruto público no térreo do empreendimento privado é muito válida, um térreo que permite a permeabilidade do pedestre e propõe uma área de entretenimento agrega muito para a sociedade. O problema é que, ao que tudo indica, só promove benefícios para o público que querem atender.
Uma amiga que trabalhou em um dos edifícios do Brascan relatou-me que constantemente alguns grupos de jovens – mal vestidos, de classes mais pobres – foram convidados a se retirar do empreendimento. Claro que o espaço funciona, mas, em relação à integração dos diversos públicos no espaço, ele não se encaixa como um bom exemplo. Pode ser em função da gestão do condomínio ou talvez pela segurança excessiva e proibições que não fazem muito sentindo, só oprimem.
Na visão empresarial de Rafael Rossi, o incorporador (Huma), é possível promover edifícios residenciais que ofereçam vivacidade no térreo. Ao entrevista-lo para minha pesquisa, abordei a questão, perguntando se ele conseguiria ver alguma solução para que não haja segregação. Ele entende que “para não haver segregação, não pode existir o preconceito, a partir do momento que uma pessoa qualquer se sentir totalmente à vontade em sentar ao lado de um morador de rua, por exemplo, que não toma banho há algum tempo, e esta pessoa não se incomodar com isso, aí de fato não haverá segregação”. Segundo ele, isso é uma questão cultural e são as pessoas que impõe esse tipo de postura dos gestores ou seguranças no espaço.
Ele tem razão, o gestor do empreendimento certamente irá atender aos anseios do seu público-alvo, dos seus consumidores. Então, consequentemente aquele espaço que foi idealizado para ser de usufruto público, não é para todos, não é para qualquer pessoa. Na verdade, é de usufruto de um público específico, aqueles que se encaixam no padrão, aqueles que são iguais – integração entre os iguais e segregação entre os diferentes.
notas
NA – Esta pesquisa está em andamento e faz parte dos estudos para a tese de doutorado que está prevista para ser finalizada no ano de 2018.
1
PORTAL VITRUVIUS. Brascan Century Plaza, projeto de Jorge Königsberger e Gianfranco Vannucchi. Projetos, São Paulo, ano 04, n. 044.01, Vitruvius, ago. 2004 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/04.044/2397>.
sobre a autora
Giselly Barros Rodrigues é doutoranda em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre em Habitação pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT). Arquiteta e Urbanista pela Universidade Anhembi Morumbi. Professora da Universidade Nove de Julho e Estácio de Sá. Arquiteta titular do escritório GBARQ Arquitetura e Planejamento.