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português
Arquiteto Luiz Carlos Toledo faz apelo a autoridades cariocas para que tomem medidas preventivas nas favelas do Rio de Janeiro, em especial a da Rocinha, com superpopulação e ocupação excessiva do território.
TOLEDO, Luiz Carlos. A favela da Rocinha precisa de atenção imediata do poder público. Minha Cidade, São Paulo, ano 19, n. 223.02, Vitruvius, fev. 2019 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/19.223/7256>.
Quem avisa amigo é! Peço aos governantes que, porventura, lerem estas palavras, recebam-nas como se fossem as sirenes que, em Brumadinho, não chegaram a soar.
O meu propósito em escreve-las é o de alertar a todos sobre a gravidade do que ocorreu na Rocinha no dia de ontem e que, fatalmente, irá se repetir quando as próximas frentes frias atingirem o Rio de Janeiro.
Meu nome é Luiz Carlos Toledo, arquiteto de profissão, há mais de trinta anos percorro as ruas e becos da Rocinha, ora projetando, ora ensinando e sempre escutando e aprendendo com os moradores.
Graças ao que aprendi com eles posso dizer que conheço a Rocinha de dentro para fora e, de tanto andar por becos e vielas e estudar levantamentos topográficos e cadastrais existentes, minha primeira impressão do sítio da favela mudou muito.
Percebi que a Rocinha é cortada por uma rede hierarquizada de talvegues que, quando cobertos por construções, só são percebidos pelo som abafado das águas que escorrem por esses canais naturais de drenagem.
As terríveis cenas que vimos ontem, de gente arrastada pela enxurrada, caros flutuando em ruas que viraram rios, não seriam tão graves se os talvegues da Rocinha não estivessem tão assoreados por toneladas de lixo e esgotos em natura, ou mesmo bloqueados por centenas de construções. Por eles escoariam boa parte das águas que causaram tantos estragos na favela.
Há dez anos atrás, ao participar da elaboração do Plano Diretor Sócio Espacial da Rocinha, fiquei horrorizado com o estado de várias fundações e pilares que examinei, tinham a ferragem e o concreto carcomidos pela maresia e pelo contato direto com os efluentes dos esgotos e do lixo que se acumulava em torno dessas estruturas.
E vejam, já se passaram dez anos! Como estarão agora! Qual o nível de risco que correm centenas de famílias condenadas, pela pobreza e pela falta de uma política habitacional, a ocupar edificações mal localizadas, projetadas e construídas, convivendo com o mau cheiro do lixo e dos esgotos acumulados nos talvegues, e com a umidade e o mofo que sobem pelas paredes das moradias, provocando uma infinidade de doenças, entre as quais, a tuberculose.
A nós, cidadãos comuns, só resta torcer e rezar para que uma tragédia igual ou maior do que a de ontem não ocorra na Rocinha como, por exemplo, o desmoronamento de uma dessas edificações, levando de roldão, ladeira a baixo, dezenas de outras construções ao longo do talvegue.
Mas, felizmente, nossos governantes não são cidadãos comuns, foram escolhidos por milhões de cariocas e fluminenses que acreditaram no seu tirocínio, competência e probidade, a eles, portanto, compete evitar que a lama de Brumadinho possa chegar até a Rocinha.
É hora da Prefeitura e do Governo de Estado darem-se as mãos e unidos, evitarem que uma nova tragédia traga luto a centenas de famílias e, mais uma vez, envergonhe a todos nós, brasileiros, por darmos tão pouco valor à vida humana.
sobre o autor
Luiz Carlos Toledo, arquiteto, mestre e doutor pelo Proarq UFRJ, diretor da Mayerhofer & Toledo Arquitetura, autor do Plano Diretor Sócio-Espacial da Rocinha (2006) e diretor da Casa de Estudos Urbanos. Recebeu do IAB-RJ o título de Arquiteto do Ano em 2009.