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português
Relato descritivo de quatro colégios da cidade de Nova Friburgo, RJ, por sua importância no acervo arquitetônico e paisagístico desta cidade oitocentista.
english
Descriptive narration of four schools in Nova Friburgo, RJ, for their importance to the architectonic ensemble and landscape of this city of the nineteen century.
español
Narración descriptiva de cuatro escuelas de Nova Friburgo, RJ, por su importancia para el conjunto arquitectónico y paisajístico de esta ciudad del siglo XIX.
LORDELLO, Eliane. Nova Friburgo: uma cidade e seus colégios. Minha Cidade, São Paulo, ano 21, n. 249.04, Vitruvius, abr. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/21.249/8067>.
Memória afetiva
Tudo em Nova Friburgo (1) me diz respeito e me emociona. Lá morou minha mãe, quando criança, tendo cursado o ensino primário em um dos colégios enfocados neste artigo – a antiga Escola Estadual Ribeiro de Almeida – atual Instituto de Educação de Nova Friburgo – IENF.
Foi também em Nova Friburgo que meus pais passaram a lua de mel; foi, igualmente, o destino da minha primeira viagem da infância, quando eu tinha cinco anos. Daí em diante, foi o destino de todas as minhas férias escolares, nos tépidos janeiros, nos frios julhos.
Gosto de Friburgo, de sua gente, de sua cultura, de sua paisagem, e de seu entorno imediato, que inclui pequenos paraísos como Lumiar, 5º distrito da cidade, localizado a apenas 28 km da sede do município. Se foi lá que Beto Guedes compôs a música de mesmo nome, eu não posso afirmar, mas, sem titubear, penso que bem poderia ser, pois o lugar é altamente inspirador.
Mas, por que colégios? Belos, os colégios de Nova Friburgo são certamente uma parte significativa do acervo arquitetônico da cidade. Soma-se a isto meu gosto particular pelas instituições de ensino, que procuro conhecer em minhas viagens. Columbia e New York University, Massachusetts Institute of Technology – MIT, Harvard, Brown University, Sorbonne, Universidade de Coimbra, Universidad de La República de Uruguai, Escuela Pública de Derecho de Argentina, a Escuela de Derecho Universidad de Chile, Uniwersytet Warszawski (Universidade de Varsóvia), são algumas delas.
Atraem-me neste tipo de turismo não somente os prédios, mas também o movimento de alunos, seu ambiente descontraído, a inserção do estabelecimento em seu bairro, a interação da tipologia e do uso com suas cidades.
No caso de Nova Friburgo, as instituições de ensino marcam fortemente o município, por sua visibilidade no conjunto arquitetônico do centro urbano. Destacarei, aqui, quatro colégios: o Anchieta; o Nossa Senhora das Dores; o antigo Grupo Escolar Ribeiro de Almeida, atual Instituto de Educação de Nova Friburgo; e, menos visível no Centro, mas bem próximo dele, o antigo Colégio Nova Friburgo, posteriormente ocupado pela Fundação Getúlio Vargas. Vamos a eles.
Os colégios friburguenses
Colégio Anchieta
O Colégio Anchieta ocupa hoje o lugar da antiga sede da fazenda do Morro Queimado. Segundo informa o site oficial do estabelecimento (2), a demanda de um colégio jesuíta em Nova Friburgo foi apresentada em 1884, por iniciativa do Dr. Carlos Éboli (3). Contudo, não se sabe se a demanda se destinava à fundação de uma escola jesuíta, ou à ou construção de um prédio para tanto.
O projeto do colégio foi aprovado por D. Pedro II e pela Princesa Isabel, sendo posteriormente submetido aos superiores da Companhia de Jesus. A instituição assim fundada recebeu seus primeiros alunos em 12 de abril de 1886. Nesse momento, funcionava como internato, ocupando o casarão da antiga fazenda, que está na base da fundação da cidade de Nova Friburgo (4).
Posteriormente, o prédio principal, ainda hoje mantido, teve sua pedra fundamental assentada em 1º de janeiro de 1902, pelo Padre Domingos de Meis. No entanto, foi o seu substituto, o Padre Luis Yabar, que com o construtor Francisco Vidal Gomes veio a edificar o colégio. Outro nome arrolado na construção do prédio principal foi o do Irmão Antônio Satori, que atuou como mestre de obras. Vale dizer que o Irmão Satori já coordenara diversas construções, inclusive em Roma. Foi ele também o construtor do Colégio Santo Inácio, na cidade do Rio de Janeiro.
Em sua primeira fase de funcionamento (1866/1923), como internato, o colégio teve entre seus alunos filhos de intelectuais como Rui Barbosa, Euclides da Cunha e Capistrano de Abreu. Tornaram-se eminentes também outros alunos dessa época, tais como Sobral Pinto (1893-1991), Amaral Peixoto (1904-1989), Artur Bernardes Filho (1875-1955). Ao longo de sua história, o colégio registraria ainda alunos de um escol da intelectualidade brasileira, tais como Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), e em tempos mais recentes, Egberto Gismonti (1947), entre outros. É tempo de passar ao conjunto arquitetônico do colégio Anchieta.
Acessível pela Rua General Osório (5), o prédio histórico do estabelecimento está localizado no alto de uma encosta, de onde se descortina linda paisagem, inclusive de uma cachoeira. Aos seus pés, no acesso principal, há uma fonte de água potável. Uma vez dentro do terreno, no sopé da ladeira de acesso, localiza-se uma ermida com uma mina de água e uma imagem de Nossa Senhora de Lourdes.
Continuando a subida de acesso, divisa-se o prédio principal. Sua composição é simétrica a partir do bloco central de acesso ao interior do edifício, ladeado por duas alas, e arrematado por um frontão ricamente adornado. Esse frontão traz a insígnia religiosa IHS (do latim Iesus Hominum Salvator), flanqueada por duas esculturas.
O prédio principal é ornado por um renque de palmeiras imperiais plantadas entre 1910 e 1916. Ao seu lado, compondo um desenho em forma de “U” com o bloco principal está o bloco do teatro, distinguido pela insígnia latina “Fides et Scientia” – Fé e Ciência.
A implantação paisagística do sítio do Anchieta é privilegiada, pois ademais do já destacado renque de palmeiras diante do prédio principal do colégio, os jardins muito agradáveis, constituem um atrativo turístico da cidade, cuja visitação é permitida mediante agendamento, inclusive disponível no site oficial do colégio (6).
Por enquanto, o prédio do Colégio Anchieta é tombado apenas pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro – Inepac (7). No entanto, por constituir um belo e significativo exemplar do neoclássico no Brasil, faria jus ao tombamento nacional.
Colégio Nossa Senhora das Dores
O colégio Nossa Senhora das Dores (8), é uma das escolas da Congregação das Irmãs de Santa Dorotéia, criada na cidade italiana de Gênova, em 12 de agosto de 1834, pela religiosa Paula Frassinetti (1809-1882), beatificada pelo Papa Pio XI, em 8 de junho de 1930, e canonizada pelo Papa João Paulo II, em 11 de março de 1984.
Vindas do Recife, as irmãs dessa congregação chegaram a Nova Friburgo decididas a fundar uma escola (9) em 1893, e no dia 10 de julho, receberam sete alunas em sua sede primeira – uma casa na Praça Getúlio Vargas. Em agosto de 1897, o colégio foi transferido para o imóvel do antigo Hotel Central.
Aqui cabe um parêntese: o Hotel Central, que era um estabelecimento de hospedagem e de tratamento hidroterápico, de responsabilidade do acima mencionado Dr. Carlos Éboli, foi então ampliado e reformado para o uso colegial.
Acesso: de fácil visibilidade no bairro do Centro, o colégio ocupa quase uma quadra inteira e seu acesso principal está na Rua Augusto Spinelli, número 75, Centro. Trata-se de um local de trânsito tranquilo, que permite inclusive o passeio em torno do colégio e sua visitação interna.
Volumetria e fachadas: o prédio do outrora estabelecimento hidroterápico que foi adaptado para escola é de extração neoclássica, e destaca-se em sua vizinhança imediata por sua implantação em torno de um pátio central ajardinado, por sua escala e, é claro, por seu estilo. Este, por sua vez, patenteia-se no ritmo cadenciado de cheios e vazios guarnecidos por esquadrias de madeira e vidro. Desenhadas para atender de modo eficaz tanto à ventilação, quanto à iluminação, suas janelas são duplas, uma delas em madeira e vidro oval, pivotante, e outra, de madeira com um trecho em venezianas.
As esquadrias acimas descritas localizam-se no trecho de fachada ocupado pela capela do
Às janelas, somam-se ao conjunto de esquadrias do colégio, compondo um todo notável. São portas em balcões de balaústres, óculos contornados por molduras adornadas, básculas, entre outras variantes de desenhos e acabamentos.
Outro destaque do colégio é o seu pátio ajardinado com plantas rasteiras, que preenchem os canteiros delineados por vegetação subarbustiva, e com pontuais presenças de vegetação arbustiva podada pela técnica de topiaria. Um elemento de grande destaque no paisagismo do interior do colégio é a aleia de bambus, no caminho que conduz a uma ermida.
Na varanda do prédio original, que se abre para o pátio, nota-se a presença de um sino. Para cada freira do colégio, há toque que lhe corresponde. Assim, para as religiosas serem chamadas, badalam o sino com o som específico da freira que se queira chamar. É uma curiosidade do cotidiano no colégio.
O prédio em que funciona o colégio foi ampliado em 1936. Em 1966, um edifício de linhas modernistas foi construído no terreno contíguo ao pátio, como uma nova ampliação. Porém, ainda que esteja atrás do prédio original, este edifício tem altura superior à da dessa construção primeira. Assim sendo, tanto destoa do pátio, quanto interfere na volumetria do prédio original. Apesar disso, em reconhecimento a sua historicidade e a sua exemplaridade arquitetônica, o Colégio Nossa Senhora das Dores foi tombado em 1985 pelo Inepac (10).
Antiga Escola Estadual Ribeiro de Almeida – atual Instituto de Educação de Nova Friburgo – IENF
Aqui, para simplificar, chamarei a atual escola apenas de IENF. Seu prédio ocupa lugar destacado no Centro de Nova Friburgo, diante da Praça Demerval Barbosa Moreira.
A escola teve seu projeto original feito pelo arquiteto Heitor de Melo (1875-1920). Sua construção foi iniciada em 1926, e, depois de algumas paralisações, veio a ser concluída em 1933, sob o Governo Federal de Getúlio Vargas.
Antes de passar à caracterização da arquitetura do prédio escolar, insta fazer um parêntese para o arquiteto Heitor de Melo. Autor de projetos importantes na cidade e no estado do Rio de Janeiro, em sua curta vida, Melo projetou, entre outras obras: o Palácio Pedro Ernesto (Câmara Municipal da Cidade do Rio de Janeiro), o Castelinho do Flamengo, o Quartel dos Fuzileiros Navais.
O prédio do IENF tem volumetria movimentada, pelos blocos recortados e locados segundo diferentes jogos de recuos e avanços. Em conformidade com esses jogos, os telhados são bastante diversos entre si, podendo ser notados pelo menos três desenhos, todos eles executados em telhas francesas, além de uma água-furtada. Em uma apreensão geral, este colégio lembra as construções normandas, pelas soluções de alvernarias com aplicação de frisos de madeira, telhados de alta inclinação guarnecidos por cachorros aparentes e guarda-pó, sob o qual surgem adornos brancos na alvenaria.
As esquadrias em conjuntos de diferentes soluções, constituem elementos de interesse no prédio do IENF, com seus desenhos, dimensões, funcionameneto e localização diversos. São janelas estreitas e pequenas próximas aos telhados, janelas de peitoril baixo no térreo, óculo na torre, e até uma bay window.
A implantação em frente à Praça Demerval Moreira Barbosa, cria uma feliz interação entre a edificação e o espaço paisagístico, onde cada qual beneficia-se do outro. O recuo em relaçao à praça permite uma melhor visualização do conjunto do prédio do IENF e a praça, por sua vez, ganha relevo com a edificação ao fundo.
Com sua arquitetura de grande afinidade com a fiundação de Nova Friburgo por imigrantes suíços, O IENF é tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro – Inepac.
Ginásio Nova Friburgo
Consistindo em uma das lembranças mais recorrentes de quem vivia em Nova Friburgo entre as décadas de 1950 e 1970, o Ginásio Nova Friburgo foi construído em 1950 para sediar um cassino. Proibidos os jogos, a Prefeitura de Nova Friburgo então transferiu o imóvel para a Fundação Getúlio Vargas – FGV, para instalar ali o Ginásio Nova Friburgo, que veio a funcionar até 1977. Posteriormente, o imóvel sediou o Instituto Politécnico. Hoje em dia, ainda na posse da FGV (11), o imóvel persiste em uso da FVG, estando bem cuidado, podendo ser visitado em sua parte externa, um terreno de 1.619. 208,52 m2.
Localizado no bairro Vila Nova, no topo de uma colina de onde se tem uma visão privilegiada desta cidade serrana, o antigo Ginásio Nova Friburgo está a menos de dez minutos de carro do Centro da cidade.
Assim como o cassino Quitandinha, construído em 1941, em Petrópolis, o prédio principal do Ginásio Nova Friburgo, projetado para cassino, também preserva sua arquitetura de linhas normandas. Características disso são a sua tipologia de chalé no corpo principal do prédio do cassino; seu desenvolvimento com duas asas laterais, simétricas ao chalé, e seus frisos de alvenaria imitando traves de madeira. A propósito, destaca-se também sua grande chaminé da lareira interna.
Cercado por Mata Atlântica, o terreno do imóvel é todo vegetado, e conta com um campo de futebol gramado. Assim, os jardins, bosques e matas do antigo Ginásio Nova Friburgo formam um paraíso verde no alto da colina.
O Ginásio Nova Friburgo não é tutelado por nenhuma instância de salvaguarda, mas a arquitetura do prédio principal, o do antigo cassino, ainda preserva suas linhas originais, vale a pena a sua visitação.
A cidade, seus colégios e sua atratividade
Com bens tombados pelo Iphan, pelo Inepac e pela própria Municipalidade, e ainda com um acervo não tutelado, mas bem conservado, Nova Friburgo contém um conjunto arquitetônico e paisagístico que vale a visita.
Somada à gentileza de seu povo, a sua gastronomia, e a outros produtos locais, a cidade persiste um destino muito interessante para os mais variados tipos de turista. Que assim se mantenha, com seus colégios, seus jardins, seus espaços culturais, e, seu variado acervo. Visite Nova Friburgo!
notas
1
Esta não é a primeira vez que falo desta cidade aqui em meu caro Vitruvius. A respeito dela, já tratei, nesta revista Minha Cidade, do abandono do Parque Hotel e, igualmente, do abandono da Fábrica Ypu. Ver: LORDELLO, Eliane. Por uma posteridade vivaz para Ypu. Minha Cidade, São Paulo, ano 10, n. 112.01, Vitruvius, nov. 2009 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/10.112/1828>; LORDELLO, Eliane. Por um futuro mais doce para o Park Hotel. Minha Cidade, São Paulo, ano 08, n. 095.02, Vitruvius, jun. 2008 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/08.095/1889>.
2
COLÉGIO ANCHIETA. História e arquitetura <https://colegioanchieta.org.br/historia-e-arquitetura>.
3
Que implantou na cidade um estabelecimento hidroterápico que posteriormente se transformou no Colégio Nossa Senhora das Dores.
4
COLÉGIO ANCHIETA. Op. cit.
5
Rua General Osório, 181 - Centro, Nova Friburgo, RJ, 28625-630.
6
Cf. COLÉGIO ANCHIETA. Fale conosco <https://colegioanchieta.org.br/fale-conosco>.
7
Cf. INEPAC. Patrimônio Cultural Bens Tombados: Colégio Nossa Senhora das Dores <http://www.inepac.rj.gov.br/index.php/bens_tombados/detalhar/506>.
8
Rua Augusto Spinelli, 75, Nova Friburgo, RJ, 28.610-190.
9
Cf. COLÉGIO NOSSA SENHORA DAS DORES. Nossa história <https://www.cnsdfri.com.br/nossa-historia>.
10
INEPAC. Processo nº E-18/300.276/85 <http://www.inepac.rj.gov.br/index.php/bens_tombados/detalhar/506>.
11
Cf. FGV. Antigas instalações do Colégio Nova Friburgo <http://www.fgv.br/novafriburgo>.
sobre a autora
Eliane Lordello é arquiteta e urbanista (UFES, 1991), mestre em Arquitetura (UFRJ, 2003), doutora em Desenvolvimento Urbano na área de Conservação Integrada do Patrimônio Histórico (UFPE, 2008). Servidora pública municipal há 29 anos, atualmente trabalha na Coordenação de Revitalização Urbana da Secretaria Municipal de Desenvolvimento da Cidade. Colaboradora e integrante do Corpo Editorial de Vitruvius, publica neste portal desde o ano de 2004.