1. Da história
Pinheiros destacou-se, desde sempre, como ponto estruturador da cidade. Aldeamento indígena, evoluiu como apoio urbano e rural de chegada e saída para Sorocaba. Região produtora e estratégica para abastecimento da capital. Surge no final do século XIX um atracadouro para barcos de transporte da produção dos sítios vizinhos que ali encontravam mercado.
Primeiro bonde elétrico no começo do século, a inauguração do Mercado Caipira no Largo da Batata e a constituição da Cooperativa Agrícola de Cotia, em 1927, impulsionaram o lugar, tornando-o um reconhecido centro de comércio e serviços do município e, mais tarde, da metrópole.
Hoje, os terminais de ônibus municipais ou inter-municipais e a estação da CPTM na Marginal do rio Pinheiros levam multidões para trabalhar e comprar no comércio popular legalizado e no informal que usurpa a área pública.
Além desses, diversos comércios e serviços especializados atraem automóveis e caminhões para disputar, com os ônibus, ruas modestas e saturadas. A malha urbana todavia original já não suporta a demanda do conjunto de atividades instaladas. Resulta daí o atendimento ineficiente das estruturas disponíveis. Públicas ou privadas.
A moradia vem diminuindo na área mais central embora, nas quadras afastadas, ocorra adensamento com habitação vertical multifamiliar. Existem muitas e pacatas vilas horizontais disseminadas por toda a área de intervenção.
Pinheiros tem excelente acessibilidade, coincidente com a conexão entre o centro da capital e a periferia da sub-região oeste da metrópole.
O recente prolongamento da avenida Brigadeiro Faria Lima e a iminente construção da linha 4 do Metrô em seu centro explicam novos empreendimentos imobiliários que congestionam e exigem mais infra-estrutura e maior espaço público. Tais processos de adensamento terciário precisariam de efetivo controle. O processo de deterioração do espaço é visível e deverá tornar-se ainda mais agudo, se a crescente verticalização proposta por empreendedores e aceita pela legislação, não for acompanhada de renovado e ampliado espaço público.
A avaliação patrimonial da maior parte dos imóveis que compõem a área-foco, além de apresentar pouco interesse, tem baixo valor. Tal característica apontada no levantamento permitiria antecipar que a pressão imobiliária exercida desde a avenida Brigadeiro Faria Lima, junto com a estação de Metrõ e com a saída dos abrasivos terminais de ônibus, acabará eliminando o atual comércio local, as moradias e todos imóveis correspondentes, para estender o conhecido setor de negócios.
É inevitável a valorização imobiliária ao longo da avenida Brigadeiro Faria Lima. Áreas lindeiras ao leste da avenida, em direção ao centro, já receberam novos edifícios de moradia e escritórios o mesmo acontecendo em direção à avenida Pedroso de Morais. História conhecida: a vila Olímpia, na parte próxima à marginal do rio Pinheiros é um dos inegáveis exemplos da precariedade dos processos de renovação em bairros da cidade sem a concomitante adequação do sistema viário e espaço público.
2. Das leis, dos recursos e da Operação Urbana Faria Lima
Predomina na área o Coeficiente de Aproveitamento 1 segundo a lei de zoneamento de uso e ocupação do solo.
Pertencendo ao perímetro da Operação Urbana Faria Lima o Coeficiente passa para 4 em toda a área direta e indiretamente beneficiada pela continuação da avenida Brigadeiro Faria Lima.
Se o adensamento de usos terciários e residenciais se concretizar, haverá certamente congestionamento maior que o já suportado. A construção do Metrô em tese diminui o número de ônibus e automóveis, mas concentrará mais gente. Assim, conviverão mais pessoas atraídas pela facilidade de acesso promovida pelo transporte de massa.
Carências hoje não atendidas ficarão ainda mais agudas. Estacionamentos, passeios para pedestres, praças e infra-estrutura subterrânea e definitiva ou todas obras desconsideradas pela Operação Urbana, a mesma que pavimentou o histórico largo da Batata, terão que ser enfrentadas.
O resultado desta operação urbana mostra a necessidade de aperfeiçoar e completar instrumentos para produzir espaços renovados de qualidade. Tal operação sequer considerou seu RIMA, para amenizar impactos da implantação e apenas estimulou a distribuição aleatória do estoque para área construída adicional aprovada pelo zoneamento normativo e superado que ignora espaços públicos, limitações e peculiaridades da trama urbana, para arbitrar adensamentos.
É preciso propor uma cidade através de planos combinados com desenhos urbanos que formalizem hipóteses públicas consistentes para um controle normativo aplicado às ações privadas.
A definição do perímetro para aplicação do novo coeficiente depende de um plano que envolva o bairro afetado para orientar com critério, onde disponibilizar o Coeficiente ampliado e dependeria também de regras de gestão eficientes, como a regulamentação dos artigos 182 e 183 da Constituição Federal através da lei N° 10.257/2001, denominada Estatuto da Cidade que apresenta instrumentos, ao estabelecer normas que regulam o uso da propriedade urbana visando o bem estar coletivo.
Destacam –se, a seguir, importantes instrumentos de implantação e gestão do projeto de lei do plano diretor estratégico do MSP, fundamentados no Estatuto da Cidade:
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A Concessão Urbanística “permite ao Poder Executivo, mediante licitação, delegar a empresa ou a conjunto de empresas, em consórcio, a realização de obras de urbanização ou de reurbanização de uma região da cidade, inclusive loteamento, reloteamento, demolição, reconstrução e incorporação de conjuntos de edificações para implementação de diretrizes do plano diretor Estratégico. “
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Parcelamento, edificação ou utilização compulsórios para imóveis sub-utilizados, não utilizados ou não edificados, quando o aproveitamento for inferior ao mínimo definido no plano diretor ou em legislação decorrente do mesmo.
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Direito de Preempção para aquisição prioritária de imóvel urbano que esteja a venda.
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Transferência do Direito de Construir “A Prefeitura poderá autorizar o proprietário de imóvel urbano, a exercer em outro local passível de receber o potencial construtivo nos termos desta lei ou alienar parcial ou totalmente o potencial construtivo suscetível de transferência deduzida a área construída utilizada quando necessário, a critério do poder público ...”
Estes instrumentos, além dos existentes na Operação Urbana Faria Lima poderão ser utilizados para viabilizar projetos estratégicos na cidade de São Paulo.
3. Do desenho
O ambiente e a paisagem de São Paulo não retornarão à saudosa ordem e legibilidade da cidade organizada, como qualquer plano desejaria. Não deve ser essa constatação a que faz aceitar o caos ou a que faz renunciar à forma como recurso para estruturação de respeitados âmbitos urbanos, dotado de eficácia, para conferir sentido, medida e espacialidade a setores da cidade. O espaço urbano detem qualidade, em qualquer caso, sempre que bem considerado, desenhado e construído.
Uma cidade não pode sofrer um processo importante de adensamento sem considerar o redimensionamento da infra-estrutura e dos espaços públicos.
A simplificação instalada pela tecnocracia, ao substituir o desenho dos espaços públicos urbanos por uma imediata engenharia de infra-estruturas, inaugurou a des-humanização urbana que os mesmos equipamentos sugeriam.
A cidade atualizada como problema de infra-estrutura tornou-se dura. Fenômeno que atingiu o largo da Batata, quando a ampliação da avenida Brigadeiro Faria Lima, aproveitando-se da inércia crítica e coletiva, contemplou a eficiência viária sem obsequiar, com um único metro quadrado de espaço público, a cidade.
A estratégia mais indicada para sustentar alterações de uso e densidade na cidade só poderia ser aquela que confere ao espaço público, função disciplinadora e estruturante. São esses espaços e a precisão de sua forma, aquilo que dá sustentação e solvência aos novos usos que se acumulam e concentram nas cidades modernas.
Diretrizes gerais para a área-foco
As precárias e indesejáveis características lineares e abruptas de uma intervenção baseada em eixo viário, devem ser evitadas por um conjunto de medidas de organização urbana que sustentem um adensamento transversal progressivo e equilibrado, por intermédio de malha pública adequada.
Para evitar que o eixo venha a se transformar em simples corredor vertical, adensado e encravado em bairro de estrutura viária tímida, propõe-se:
Intervenção nas ruas Cunha Gago e Fernão Dias, nos limites da área-foco, com ampliação de calçadas e passeios para transeuntes e sustentação de maiores adensamentos do bairro numa condição viária que poderia ser equiparada à de um boulevard ou de uma rambla. Eliminação do recuo frontal para as novas edificações e ampliação do coeficiente de aproveitamento sobre área original dos terrenos.
Ruas que receberiam obras completas de infra-estrutura na forma de redes ou galerias (eletricidade, telefonia e sinais, esgoto, drenagem, água e gás). Além de estacionamentos subterrâneos, construídos e explorados pela iniciativa privada, para descongestionar o trânsito sem a necessidade de ampliação dos leitos de rua. Parte das vagas de veículos poderiam também ser comercializadas com usuários de prédios sem estacionamento, que adquiririam um direito transferível para estacionar próximos a suas moradias ou trabalho.
Amplos passeios ao longo de ruas paralelas , que confiram importância e dimensão aos espaços públicos projetados com todas redes subterrâneas.
Retificação do traçado da avenida Brigadeiro Faria Lima, para obter geometria favorável à ampliação e organização dos passeios e praça e obter a continuidade de amplos caminhos para pedestres, com a diminuição do canteiro central da avenida,
Trazer a memória do largo da Batata e a história da cidade, evocando antigos significados, através do passeio ampliado na avenida Brigadeiro Faria Lima no frente da antiga CAC. Por isso a igreja Nossa senhora do Monte Serrat merecia mais destaque, levando a aproveitar as obras da estação do Metrô para ampliar a praça de seu adro, expondo-a ao novo Largo da Batata e integrando-a na mesma perspectiva desses grandes espaços públicos,
Praça da igreja para festas e encontros populares e festas tradicionais e quermesses quase sempre amparadas pela igreja e por uma comunidade mais atuante, ligada à praça nova do largo da Batata para atividades do importante centro de negócios que se avizinha.
Pedestrianização de trecho da rua Cardeal Arcoverde, entre rua Cunha Gago e avenida Brigadeiro Faria Lima, para eliminar um conjunto de semáforos e evitar o cruzamento diagonal do viário que corta em duas partes o espaço aberto da avenida. Previsão de via dedicada para acesso à avenida Eusébio Matoso, com paradas de ônibus.
O desejável controle espacial do largo da Batata sugere um alinhamento retilíneo e único ao longo de largas calçadas, para ordenar o conjunto que formará suas fachadas. Sendo impossível controlar o gabarito dos edifícios para constituir um setor urbano dotado de muita ordem e de qualidade, recomenda-se que os dois primeiros pavimentos sobre um alinhamento estipulado proporcionem unidade da paisagem que se tem desde as ruas.
Térreos recuados poderiam ampliar ainda as calçadas e definir marquises para proteger pedestres. Galerias e áreas comerciais no térreo poderiam aumentar a permeabilidade e as rotas entre as quadras.
As desapropriações propostas deverão ser obtidas por intermédio de mecanismos não onerosos que permitam compensações no coeficiente de aproveitamento do terreno.
Aumentar a área mínima dos lotes para aprovação de projetos deveria ser estimulado no caso dos terrenos da Avenida Brigadeiro Faria Lima, Rua Cunha Gago e Rua Fernão Dias. O Coeficiente de Aproveitamento permitido aos projetos poderia, dentro de limites fixados, ser crescente e proporcional ao tamanho dos lotes.
Descrição das áreas de projeto
1. Bulevares Cunha gago e Fernão Dias
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Bulevares ao longo das ruas Cunha Gago, com 870 metros, e Fernão Dias, com 730 metros, totalizando 1.500 metros de ruas alargadas com 24 metros entre alimnhamentos, com a doação de 10 metros de frente dos terrenos e compensação com Coeficiente de Aproveitamento e Taxa de Ocupação,
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Alargamento de calçada (calçamentos com 65% da área pública total, com largura de 24 metros) de um dos lados da rua, por intermédio de desapropriação sem ônus para o poder público e sem prejuízo para os proprietários,
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Encontro dos bulevares no Instituto Tomie Ohtake, reforça um circuito urbano para pedestres que culmina em praças e no edifício cultural,
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Construção de estacionamento linear para operação por contrato de exploração, sem ônus para o poder público, com 1.600 vagas no bulevar Cunha Gago e 1.900 vagas no bulevar Fernão Dias,
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Ciclovia,
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Arborização, paisagismo, quiosques e equipamento urbano (lixeiras, bancos, brinquedos, proteções, etc),
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Redes subterrâneas de utilidades e serviços (esgoto, águas pluviais, eletricidade, telefonia e fibra ótica, água potável e gás),
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Empreendimentos imobiliários com máximo remembramento de lotes, com ação entre proprietários coordenada pela prefeitura,
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Recuos de veículos para deixar e apanhar passageiros.
2. Avenida Brigadeiro Faria Lima
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Ocupação da área dedicada aos terminais de ônibus, pelo leito da avenida, para favorecer desenho de espaços públicos,
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Definição de um alinhamento novo e paralelo ao sistema viário ocupado com a construção de dois pavimentos de nove metros de altura alinhados e nivelados em toda a extensão da avenida retificada. O terreno da antiga CAC, sofreria mudança de perímetro sem perder área,
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Concentração de todas as áreas remanescentes numa praça linear com equipamento e paisagismo propostos. Praça para o setor de negócios cuja expansão será feita desde os dois lados da avenida Brigadeiro Faria Lima,
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Destinar área pública remanescente para Teatro Municipal, com platéia para 1000 pessoas e área aproximada de 6000 m²,
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Alargamento das calçadas e estreitamento do canteiro central,
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Construção de estacionamento linear de 1.800 vagas para exploração por contrato de comodato (sem ônus para o poder público),
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Ciclovia.
3. Rua Cardeal Arcoverde
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Aproveitamento do novo cruzamento que leva aos terminais de ônibus previstos, para executar o desvio com via dedicada, a rua que divide o espaço aberto do largo da Batata em duas partes,
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Transformação do setor em passeio para pedestres e acesso a um novo teatro municipal, com 6000 m²,
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Ligação transversal dos bulevares e fechamento de anel com passeios ampliados para pedestres.
4. Igreja Nossa Senhora do Monte Serrat
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Expansão da praça do adro da Igreja para ligação com o passeio da avenida Brigadeiro Faria Lima e alargamento da calçada da rua Butantã no acesso lateral da igreja e no marco histórico do largo dos Pinheiros, com nova geometria na esquina da rua Paes Leme,
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Desenho de praça que propicie a permanência de atividades ou comemorações populares e tradicionais dos costumes locais. Com dimensões para abrigar eventos e festas convocadas pelos setores organizados da comunidade e pelos próprios setores da igreja que costumam organizar atividades culturais de bairro,
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Exposição da igreja desde a avenida Brigadeiro Faria Lima e ligação para pedestres até o bulevar proposto na rua Fernão Dias,
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Estacionamento para veículos no subsolo, com 400 vagas, construído e explorado pela iniciativa privada,
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Acesso à estação do Metrô, por intermédio de piso rebaixado com lojas para comércio de passagem. Esta obra deve ser construída em parceria com o Metrô e seu dimensionamento deverá levar em consideração a uma demanda calculada e seu poder estratégico para neutralizar parte do comércio informal na superfície.
ficha técnicaArquitetos
Luis Espallargas Gimenez, Jaime Cunha Jr., Hortênsia Espallargas Zuniga, Liliane Silva, Bruno Faggiano e Érico Costa.
Engenheiros
Marcos Horta Lemos e Ângelo Sartorelli
Estagiária
Bruna Marrocos