Carta aberta ao Brasil Arquitetura e à Casa de Òsùmàrè
Antonio Riserio
É com viva alegria – humana, cultural e política – que vejo o projeto do escritório Brasil Arquitetura (arquitetos Marcelo Ferraz e Francisco Fanucci) para a Casa de Òsùmàrè em Salvador. Por dois motivos simples, mas fortes: o significado do projeto e a qualidade arquitetônica.
No primeiro caso, não posso deixar de assinalar uma continuidade. Em meados da década de 1980, integrando a direção da Fundação Gregório de Mattos, criei e coordenei o Projeto Terreiro, iniciativa inédita na história da administração pública brasileira.
Ali, pela primeira vez em nosso país, um órgão oficial formulou e pôs em prática uma política de recuperação e proteção de templos religiosos não-católicos – no caso, as veneráveis casas de candomblé da Cidade da Bahia.
Naquela época inclusive, juntamente com Waly Salomão, saí publicamente em defesa da Casa de Òsùmàrè, contra uma obra que a Prefeitura pretendia realizar (e, em consequência de nossa atitude, alterou sua localização), que devassava um espaço iniciático do terreiro.
Hoje, ao ver o projeto do Brasil Arquitetura, lembro-me do projeto de recuperação integral do Gantois, feito pelo arquiteto Luís Villa (da equipe de João Filgueiras Lima, Lelé), em 1986. Chegamos a iniciar as obras desse projeto, mas não conseguimos finalizá-las – por falta de recursos.
O projeto de Ferraz e Fanucci para a Casa de Òsùmàrè tem aquele mesmo caráter de intervenção geral, inclusive com tratamento da encosta (uma preocupação nossa no Gantois). Um projeto que encanta e convence, pelo que tem de cuidado e qualidade. Uma lição, aliás, de que hoje Salvador, maltratada arquitetônica e urbanisticamente, tanto necessita.
Espero que desta vez os recursos venham – e que a bela obra seja realizada em sua inteireza, como algo de forte e novo na paisagem religiosa e cultural da Bahia.
[memorial]
nota
NE - texto originalmente publicado na página Facebook do autor e reproduzida no portal Vitruvius com sua autorização.
sobre o autor
Antonio Riserio é antropólogo, poeta, ensaísta e historiador.