Fomos convidados pelo Instituto Sócio Ambiental para propor espaços flexíveis no Parque Indígena do Xingu. O objetivo principal das construções é o de colaborar com a manutenção da cultura indígena local e acolher as diversas atividades comunitárias existentes nas aldeias. O primeiro dos três locais onde o projeto foi implementado é a nova Aldeia Kisêdjê. A mudança de local da tribo e a construção da nova e recente Aldeia localizada mais ao centro do parque foi vital para a manutenção da saúde de seus moradores, que fogem das doenças e efeitos danosos causados pelo pelo uso indiscriminado de agroquímicos pulverizados nas plantações de soja que rodeiam o parque.
A nova aldeia, construída em torno de uma grande área comum de formato circular, é rodeada por ocas – construções tradicionais indígenas construídas majoritariamente de madeira e palha. Com pequenas variações as ocas formam a única tipologia construtiva existente na aldeia. Sua construção tem um interessante aspecto formal e uma atmosfera bastante específica, que possibilitam a ocorrência paralela de diversas funções, que se articulam por diferentes gradações de sombra: quanto mais para o interior da oca, mais escuro e mais privado o espaço se torna – e vice versa.
Existe neste contexto também uma complexa cultura que luta para se manter em uma sociedade de valores distintos. Nessa sobreposição cultural e econômica diversos produtos industrializados de baixa qualidade e de difícil descarte ou reuso são vistos por toda a Aldeia, mostrando a constante transformação dos hábitos e uma presença inevitável da industrialização.
É neste contexto em que o projeto está inserido, não como uma tentativa de replicar uma cultura, mas sim como um elemento distinto, que pela própria diferença enfatiza e expõe a riqueza da cultura indígena local.
Um sistema flexível é projetado, objetivando replicabilidade, facilidade de construção, baixo custo e conforto. Oito principais peças são combinadas e permitem um arranjo estrutural simples, todas montadas com o uso de parafusos e barras roscadas, que podem ser desmontadas e remontadas conforme haja a necessidade do translado da edificação, em uma na tentativa de aumentar a vida útil do edifício na constante mobilidade das comunidades indígenas. As vedações, as compartimentações internas e os dispositivos de abertura da edificação são configuradas conforme a necessidade de cada Aldeia. Esses elementos são, por sua vez, protegidos por um espaço sombreado de 368 metros quadrados, proporcionando diferentes atmosferas e um limite expandido entre o programa escolhido pela comunidade – sala de aula, um espaço para refeições coletivas, um auditório ou qualquer outro imaginado – e o espaço externo.
A simplicidade do projeto também se deve à impossibilidade de ter contato com o canteiro de obras durante o processo de construção; modelos e desenhos didáticos foram realizados para transmitir rapidamente o processo construtivo, minimizando possíveis dúvidas dos construtores locais.
ficha técnica
projeto
Coberturas no Xingu
local
Parque Indígena do Xingu, São Félix do Araguaia MT Brasil
área construída
368,25 m2
arquitetura
Gustavo Utrabo (autor), Beatriz Rocha (equipe) / Estúdio Gustavo Utrabo
projeto estrutural
Ita Construtora
ano de projeto
2017
ano de construção
2017
cliente
Instituto Sócio Ambiental – ISA
foto
Gustavo Utrabo / Pedro Kok