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SEGRE, Roberto. A espiral da história: 1959-2009. Resenhas Online, São Paulo, ano 09, n. 097.02, Vitruvius, jan. 2010 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/09.097/3757>.


Construção da Praça dos Três Poderes, 1957
Foto Thomaz Farkaz [Acervo Instituto Moreira Salles, p. 59]

Comemorações têm sempre um sabor nostálgico: a tristeza de um passado perdido, a lembrança de uma felicidade que não voltará mais. Também possibilitam o resgate arqueológico de ruínas arquitetônicas, ou de idéias supostamente já superadas. Mas lembrar não significa reproduzir, porque o presente é sempre diferente do passado no constante fluir da vida – Le Corbusier citava como exemplo os meandros dos rios, em constantemente variação –, e a história pode ser vista como uma espiral, onde os fenômenos que caracterizam a dinâmica das estruturas sociais, apresentam relações semelhantes mas nunca iguais, em um processo de constante renovação. Daí que reviver o Congresso Extraordinário Internacional de Críticos de Arte, sob o patrocínio do presidente Juscelino Kubitschek e organizado pelo crítico Mário Pedrosa, vai além de um simples exercício acadêmico. Significa recuperar um debate, uma confrontação de idéias, que ainda hoje, no início do século XXI, continua tendo valor e sentido.Um fato que não foi suficientemente aquilatado diz respeito à motivação política que sustentou a realização do Congresso. O presidente Kubitschek, para valorizar a significação da nova capital, quase pronta para sua inauguração, decidiu convocar as principais personalidades da crítica da arte, e arquitetos e urbanistas influentes, para conhecer e avaliar a imagem inédita de Brasília. Nunca antes isto havia ocorrido, porque a relação intensa entre o poder político e a arquitetura e o urbanismo, aconteceu na maioria dos casos, em regimes totalitários – no caso, na Europa com: Hitler, Mussolini e Stalin –, e a publicidade do suposto sucesso das iniciativas faraônicas e monumentais, sempre ficou por conta da propaganda do próprio regime, alheio a críticas e opiniões que não coincidissem com os ditames oficiais. No caso brasileiro, a convocatória teve uma outra significação: um regime democrático, que se propôs a construir uma nova capital, símbolo do futuro desenvolvimento social e econômico do país, deseja mostrar ao mundo, a originalidade e criatividade de artistas, arquitetos e urbanistas locais, e solicitar, com absoluta liberdade de expressão, a opinião dos mais renomados especialistas na matéria. Visão aberta e iluminada, de um político que compreendia a significação da cultura nacional de vanguarda, visando inserir Brasil na dinâmica da cultura universal, e assim estabelecer um diálogo de igual para igual, e superar uma recorrente submissão de país colonizado, dependente dos tradicionais centros metropolitanos. Isto não havia ocorrido nas duas outras cidades criadas na segunda metade do século XX: Chandigarh na Índia, idealizada por Le Corbusier; e Islamabad, capital de Paquistão, projetada por Konstantinos Doxiadis. O caso mais próximo de relacionamento entre poder democrático e arquitetura e urbanismo, foi, nos anos oitenta, com o presidente da França, François Mitterand.Assumindo o tema “Cidade Nova. Síntese das Artes”, os debates do Congresso se centraram sobre Brasília e a sua significação na cultura arquitetônica e urbanística contemporânea. Curiosamente, Lúcio Costa não compareceu no evento, e a defesa da nova capital esteve nas mãos de membros do júri do concurso, o inglês Sir William Holford e o grego-norte-americano Stamo Papadaki, além de admiradores de Niemeyer, entre os que podemos citar André Bloc. Em contraposição, alguns expressaram as suas dúvidas sobre a possibilidade de criar ex-novo uma grande cidade, baseada em um desenho totalizador da sua estrutura urbana e do sistema arquitetônico; em relação com as transformações da vida social dos seus habitantes. Entre eles, citemos o surrealista Frederik Kiesler, mais preocupado com a forma emanada não do desenho abstrato mas da relação psicológica com o homem; o italiano Bruno Zevi, com sua postura “orgânica”, sempre questionando a racionalidade rígida do Movimento Moderno; e o argentino Tomás Maldonado, naquele momento professor na Escola de Desenho de Ulm, privilegiando os componentes funcionais e tecnológicos, sobre as expressões artísticas monumentais.Mas sem dúvida, o apoio generalizado vinha do grande grupo de artistas e intelectuais que tinham lutado pela eliminação da cultura acadêmica e a associação do século XX com as transformações técnicas e sociais radicais, pela renovação do contexto urbano e da linguagem da arquitetura moderna, associadas com as novas funções impostas pela sociedade democrática de massas. Assim, no Pós-Guerra, ainda se vivia um clima de otimismo e esperança, tanto político como cultural: Kennedy era presidente dos Estados Unidos; João XXIII, renovou a rígida estrutura da Igreja; Khruschev questionou a herança stalinista; Fidel Castro tinha acabado com a ditadura existente em Cuba. Não se antecipavam as nuvens negras que se aproximavam: o assassinato de Kennedy, o Muro de Berlim, a Guerra de Viet-Nam. No Brasil ainda se vivia uma espécie de euforia coletiva, desde a primeira vitória na Copa do Mundo na Suécia; o prêmio em Cannes com o filme Orfeu Negro, seguido pelo sucesso do Pagador de Promessas; que não anunciavam a chegada da ditadura militar. Daí, que Brasília, como epígono do Movimento Moderno e conclusão mais que elegante dos princípios da Carta de Atenas, tinha o apoio daqueles que estavam comprometidos com os ideais estéticos e sociais surgidos nos anos vinte na Europa, Alberto Sartoris, Sigfried Giedion, Giulio Carlo Argan, Gillo Dorfles, Richard Neutra, James Johnson Sweeney, Charlotte Perriand, André Wogensky e Eero Saarinen.Havia esperança que fosse alcançado um equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e social e o controle da qualidade estética do espaço urbano, assim como o diálogo com as manifestações artísticas, para atingir os valores icônicos e simbólicos que representassem a cultura social de cada país – teses que foram propostas há cinqüenta anos no congresso –, não foram atingidos. Hoje, vivemos uma dramática crise que abrange todos os níveis da vida humana no planeta: os graves problemas ecológicos; o crescimento da pobreza no mundo; a corrupção política; os abusos do neo-liberalismo econômico; a crise funcional e estética das metrópoles; o desemprego generalizado nos países pobres e ricos; os conflitos religiosos; a falta de confiança no futuro da jovem geração, submetida à vertigem cibernética e a superficialidade da cultura do zapping.Os temas que se debatiam há cinqüenta anos, voltam a ter presença na atualidade, mas desde uma perspectiva diferente, já que a impossibilidade de concretizar as utopias formuladas na modernidade, poderiam ser realizadas com os recursos científicos e tecnológicos da contemporaneidade, utilizados para atingir objetivos éticos e morais, em função das necessidades sociais. Objetivos que parecem distantes, porque o idealismo de Le Corbusier e seus discípulos, presentes no Congresso, identificado com as propostas dos traçados exatos da Ville Radieuse e de Brasilia; hoje é substituído pelo cru realismo de Rem Koolhaas que se manifesta no desordem do “espaço lixo” das metrópoles do século XXI, e as arbitrariedades estéticas de Zaha Hadid ou de Frank Gehry. O purismo dos edifícios altos de Mies van der Rohe, ainda em escala humana, são substituídos pela irracionalidade arquitetônica presente nas torres de Dubai ou Shangai. Mas também existem tendências cada vez mais fortes que se opõem ao sistema irresponsável do consumismo desenfreado, à dilapidação dos recursos naturais, à falta de conteúdo social das manifestações artísticas e das obras arquitetônicas. Neste caminho se tem a ilusão que a leitura dos textos que contêm os debates desenvolvidos em 1959; cinqüenta anos depois, iluminem com alguma luz de otimismo, a adversidade obscura do mundo atual. E a espiral da história, poderia demonstrar, que as contradições sempre existiram no mundo, e que o desejo do ser humano de viver melhor, de criar beleza e bem-estar, finalmente triunfa sobre as forças negativas da feiúra ambiental e da exploração econômica.

nota

NE
O presente texto foi publicado como um dos textos de apresentação do livro.

sobre o autor

Roberto Segre é Doutor em Ciências das Artes (Cuba); Doutor em Planejamento Regional e Urbano (Brasil); Professor Titular, PROURB/FAU/UFRJ; Professor Titular Consultante, FA/ISPJAE, Havana, e Coordenador do Docomomo-Rio.

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