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Potiguara Mendes da Silveira Jr comenta a tese de Rosane Araújo, transformada no livro “A cidade sou eu", elogiando a autora por refletir sobre a questão de como pensamos sobre as cidades e suas transformações atualmente de modo original.

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SILVEIRA JR, Potiguara Mendes da. O “orbanismo” de nosso tempo. Resenhas Online, São Paulo, ano 11, n. 121.03, Vitruvius, jan. 2012 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/11.121/4183>.


Em algum momento dos anos 1980, ficou definitivamente claro que não era possível pensar as cidades como se fazia antes: o planeta se tornara uma cidade. Os autores cunharam diversos nomes para essas aglomerações humanas cada vez mais conectadas, visualizadas e acessáveis em tempo real independentemente de suas distâncias geográficas: metápole (François Ascher), cidade global (Saskia Sassen), cibercidade (Pierre Lévy), cidade nodal (Kok-Meng Tan), e-topia (William Mitchell), ecstacity (Nigel Coates)... Já se falou bastante sobre isto, mas ainda é pouca a reflexão sobre o cerne das perspectivas e expectativas que se abrem para as pessoas e seus desempenhos nesse ambiente urbano de multiacessibilidade e redefinição das concepções de território, identidade e pertencimento de cada um.

Justamente por enfrentar esta reflexão de modo original que é bem-vindo o livro de Rosane Araujo, resultado de sua tese no Prourb/UFRJ ganhadora do prêmio Capes de melhor tese em 2008. A cidade sou eu é um desenvolvimento e um passo a mais nas questões apresentadas anteriormente em seu mestrado, quando abordou a cidade contemporânea e as novas tecnologias. Naquele momento, ela contextualizava e avançava sobre a indicação de Lewis Mumford, nos anos 1960, de que, se antes houve “uma cidade que era, simbolicamente, um mundo”, o que se descortinava então era “um mundo que se tornou, em muitos aspectos práticos, uma cidade”.

Assim, após apresentar as reconceituações de cidade, temos a exposição de um urbanismo em estado fluido, o “orbanismo” em vigor no século 21. Nele, a forma cria sua mutação permanente e o urbano se constitui mediante a multiplicidade da experiência dos espaços e dos tempos e se funda na continuidade e na comunicação entre as coisas. O sentido do espaço é transformado através da flexibilidade de sua utilização, da simultaneidade de seus usos e significados e da flexibilidade ou mudança sem rupturas que vemos ocorrer nas práticas do dia a dia. Ser urbano, então, é, sobretudo, ser conectado. Isto, não apenas no sentido informacional, mas no sentido lato de todas as possibilidades e usos das conexões disponíveis e planetariamente disseminadas.

Seguindo esta linha, a autora começa a apresentar o ponto original de seu trabalho. A cidade continua sendo o local das trocas materiais, pessoais, mentais e financeiras, o local do estabelecimento de vínculos e inserções sociais. Só que, como agora estas trocas e vínculos inevitavelmente ocorrem mediante interfaces geradas pela disponibilidade de equipamentos tecnológicos, a cidade estará onde cada um estiver, sem fronteiras ou limitações como referência. Então, uma vez que as conexões da Pessoa recortam o mundo e a cidade que ela é, estabelece-se uma equivalência que é o ponto chave do livro: Cidade = Eu.

O texto aborda o conceito de Eu segundo as concepções clássicas de Descartes, Kant e Freud. Ressalte-se a exposição muito precisa da psicanálise freudiana, cujo entendimento nem sempre é claro, e frequentemente equivocado, quando dirigido a não especialistas. O eu é visto tanto como parte de um campo de existência necessariamente relacional, o que torna precária qualquer ideia de unidade ou individualidade; quanto como um processo de diferenciação progressiva dependente da complexidade da determinação inconsciente, o que retira seu entendimento do campo idealista-subjetivo. A experiência engendrada pelo inconsciente elimina os raciocínios baseados num centramento ou ponto de referência fixo. É esta ideia freudiana cujos efeitos podemos acompanhar nos desenvolvimentos atuais, também claramente expostos no livro, do conceito de rizoma (Deleuze, Guattari), da teoria geral dos sistemas (Bertalanffy), do sistema autopoiético (Maturana, Varela), da teoria das redes complexas (Barabási), e da ecologia cognitiva (Lévy).

Esse percurso é feito para nos introduzir à ideia de Eu = Pessoa apresentada pela Nova Psicanálise, criada no Brasil por MD Magno, e que serve de base para a reflexão de Rosane Araujo neste livro. Vemos como o polo de formações que constitui uma Pessoa não cabe em relações de horizontalidade (eu-tu) ou de verticalidade (transcendente absoluto com rosto definido). E mais, que é mediante as propriedades da Pessoa = Rede que é possível pensarmos o que seja Eu habitante desse espaço urbano, informacional, videótico e videófilo, non stop, globalizado, controlado, digital, instantâneo, e do que mais vier a surgir como efeito destas características.

O ponto de partida é considerar o que quer que haja como formação e também considerar qualquer formação como informação disponível para conexão com outras. Ou seja, a ideia de formação remete a informação vinculável e em constante movimento de transformação do já estabelecido. Uma Pessoa, então, é definida como uma formação que, para além de suas instâncias corporais, comportamentais e culturais, traz em sua construção própria a possibilidade de transformação, de exigir o avesso de qualquer situação, mesmo que esta consecução transformadora se alongue no tempo. É o que vimos ocorrer, por exemplo, desde o sonho do voo de Ícaro até a construção efetiva do “mais pesado que o ar” que nos leva a alturas antes impensáveis e incansavelmente sobrevoa nossas cidades. E é esta Pessoa = Rede que pode dizer: a cidade sou Eu.

Dizer isto, a cidade sou Eu, ultrapassa tanto o conceito de cidade restrito à geografia, quanto o conceito de Eu circunscrito a sujeito, indivíduo, corpo anatômico ou primeira pessoa do verbo. Desloca-se, então, a concepção de urbanismo e a tarefa de arquitetos e urbanistas para um pensamento em rede de interações, segundo o qual as cidades se deslocam com o deslocamento das pessoas. A pessoa que faz esta afirmação, a cidade sou Eu, é ela que se afirma como cidade e passa pela experiência (da) Pessoa, a qual “é sempre um acontecimento, singular, que só pode ser enunciado um a um” (p. 196).

Ao fim, somos nós leitores deste livro, finamente elaborado por Rosane Araujo, que ganhamos em compreensão ao situar a Pessoa que somos como resultado da confluência das diferentes formações e articulações que nos constituem como a cidade que somos – e que se transforma e se desloca à medida de nossas transformações e deslocamentos. Portanto, saudações ao urbanismo, o “orbanismo” de nosso tempo, que já tem um texto à altura das exigências cruciais e intransferíveis com que não cessa de se deparar a cada dia.

sobre o autor

Potiguara Mendes da Silveira Jr. é professor associado da Faculdade de Comunicação e vice-coordenador do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de Juiz de Fora / UFJF. Psicanalista (NovaMente/RJ). Autor do livro Artificialismo Total: Ensaios de Transformática (Comunicação e Psicanálise).

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resenha do livro

A cidade sou eu

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A cidade sou eu

Rosane Araujo

2011

121.03
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121

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