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reviews online ISSN 2175-6694


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Resenha do livro Julian Garcia Nuñez de Lucia Elda Santalla, volume da coleção “Arquitectos americanos contemporáneos”, pulbicada pelo Instituto de Arte Americano y Investigaciones Estéticas "Mario J. Buschiazzo", da FAU-UBA.

english
Book review of Julian Garcia Nuñez by Lucia Elda Santalla.

español
Reseña del libro Julian Garcia Nuñez de Lucia Elda Santalla.

how to quote

ROCHA, Ricardo. Julian Garcia Nuñez. O fim do projeto. Resenhas Online, São Paulo, ano 13, n. 149.02, Vitruvius, maio 2014 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/13.149/5188>.


Entre 1955 e 1967, o Instituto de Arte Americano y Investigaciones Estéticas (IAA) da Universidade de Buenos Aires publicou doze títulos em uma coleção denominada “Arquitectos americanos contemporáneos”: Amancio Williams (por Raúl Capdevila, em 1955), Eduardo Catalano (Jorge Gazaneo e Mabel Scarone, 1956), S.O.M. (Mario Buschiazzo, 1958), Lúcio Costa (1) (também por Gazaneo e Scarone, 1959), Paul Rudolph (Miguel Asencio, 1960), Félix Candela (Félix Buschiazzo, 1961), Bresciani/ Valdés/ Castillo/ Huidobro (Ricardo Menéndez, 1962), Eladio Dieste (Juan Pablo Bonta, 1963), SEPRA (Federico Ortiz, 1964), Mario Roberto Alvarez (Marcelo Trabucco, 1965), Eero Saarinen (Rafael Iglesia, 1966) e Philip Johnson (Ricardo Alexander e Eduardo Cervera, 1967).

A coleção se divide, assim, fraternalmente, entre quatro títulos sobre arquitetos argentinos (Williams, Catalano, SEPRA e Alvarez), quatro títulos sobre arquitetos norte-americanos (S.O.M., Rudolph, Saarinen e Johnson) e quatro títulos sobre arquitetos latino-americanos (Costa, Candela, Dieste e Bresciani/ Valdés/ Castillo/ Huidobro). Já chamei a atenção de que não parece casual o fato de que a quantidade de volumes na coleção dedicados a arquitetos norte-americanos seja igual à dedicada a arquitetos latino-americanos (2). O Brasil de Rino Levi, Vilanova Artigas e Affonso Eduardo Reidy – para não falar de Oscar Niemeyer – e o México de Mario Pani, Enrique de la Mora e Teodoro González de León, sem menosprezar o Uruguai de Julio Vilamajó e o Chile de Perez de Arce, certamente ofereciam um bom número de alternativas. Por que o privilégio norte-americano? (3) Até a inauguração de Brasília tal opção já estava delineada – dois argentinos (4), dois norte-americanos e um brasileiro; depois há uma inflexão hispano-americana – um mexicano, um escritório chileno e um uruguaio; e a coleção encerra, novamente, com dois argentinos e dois norte-americanos.

Ora, é o próprio Mario Buschiazzo, diretor do IAA até a sua morte em 1970, que lembra que a atuação do Museum of Modern Art (MoMA) “contribuiu poderosamente para criar uma consciência no ambiente artístico norte-americano” (5). Muito se tem escrito sobre o projeto de “hegemonia cultural” norte-americano no período (6), do qual a ação do MoMA faria parte, mas na página do IAA – o instituto continua em atividade até hoje – é possível ler, por sua vez, que Mario Buschiazzo “entendeu o papel hegemônico que podia jogar um centro de estudos no continente” (7).

Tudo esse contexto deve ser levado em conta para entender os motivos pelos quais a coleção Arquitectos Americanos Contemporáneos foi interrompida em 1968, ano em que o IAA inicia a série “Precursores de la arquitectura moderna en la Argentina”, cujo primeiro título foi sobre Julian Garcia Nuñez. A ideia de que o instituto poderia desempenhar um papel “hegemônico”, como o MoMA, ou pelo menos disputar o poder por uma posição mais central nos debates sobre a arquitetura no continente (8), vacila, talvez, diante da constatação de que o esforço empregado não foi suficiente sequer para um “desenvolvimento enérgico” da arquitetura moderna argentina. A disputa pela hegemonia continental cede lugar para uma pesquisa “umbilical”, circunscrita aos limites geográficos do país e retrocedendo no tempo: “incluímos um advérbio de lugar... sem que isto suponha que tenha existido uma ‘arquitectura moderna argentina’, algo que lamentavelmente ainda não se produziu” (p. 9). Uma espécie de volta às raízes, abandonada a hipótese de um enxerto bem-sucedido, na tentativa de fazer florescer um ramo arquitetônico mais enérgico?

O caráter monográfico, a estrutura (estudo introdutório + portfolio de obras) e mesmo o padrão editorial (diagramação, dimensões, etc.) de “Arquitectos Americanos Contemporáneos” são mantidos na nova coleção. Se se trata de comodidade editorial ou de indício da “continuidade” sugerida nesta resenha, é algo que só uma pesquisa de arquivo poderia tentar responder (9).

Sobre a obra de Garcia Nuñez, diplomado em Barcelona onde foi discípulo de Luis Domenech y Montaner, Lucia Santalla assinala que o arquiteto inicia sua carreira na construtora de seu pai. Em 1924, seu pai falece e Nuñez abandona a arquitetura com a qual havia se familiarizado na Catalunha – e que lhe valeu o título de “excéntrico y hasta de arquitecto loco” por alguns críticos incapazes de compreender sua linguagem. Lamentavelmente (e não como fazia Freud, ciente de sua posição central no pensamento moderno, que destruía seus arquivos em parte para “dificultar a vida dos biógrafos”), Nuñez destruiu todo seu arquivo pessoal ao mudar de residência, deixando “en la casa por él construída todos los recuerdos de su vida social y profesional, desvelos, triunfos y disgustos que le proporcionó su carrera”.

Antes de falecer em Buenos Aires, em 1944, projeta e dirige, entretanto, a construção de um Asilo de Ancianos Desamparados e uma capela na mesma instituição: “seguramente vuelve a construir por nostalgia de la profesión abandonada, por cariño a la obra de beneficencia que realizan las Hermanas, por amistad con las personas benefactoras, quizás también por necesidad de trabajar y olvidar”.

O encerramento de um projeto – a coleção Arquitectos Americanos – e a tentativa de influir no destino da arquitetura das Américas; dá lugar nascimento de outro (10) – a série “Precursores de la arquitectura moderna en la Argentina” – em uma busca pelas raízes ou em mudança estratégica da crítica para a historiografia. Todavia, de qualquer modo, a obra Garcia Nuñez no ha sido olvidada.

notas

1
Cf. ROCHA, Ricardo. Lúcio Costa e a Argentina: da boa tradição ao “ser americano”. Resenhas Online, São Paulo, ano 08, n. 096.02, Vitruvius, dez. 2009 <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/08.096/3012>.

2
Cf. ROCHA, Ricardo. Miguel Asencio e Paul Rudolph. Um triângulo não tão amoroso. Resenhas Online, São Paulo, ano 13, n. 146.01, Vitruvius, fev. 2014 <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/13.146/5045>.

3
Quiçá em função da viagem e dos contatos estabelecidos por Buschiazzo nos EEUU, no início dos anos 40, por motivo de uma bolsa da American Federation of Learning Societies?

4
Lembrando que Catalano já havia se estabelecido nos EEUU quando da publicação de seu livro.

5
BUSCHIAZZO, Mario. S.O.M. Buenos Aires: IAA, 1958, p. 17.

6
Ver, por exemplo, LIERNUR, J. The South American Way. Block, n. 4, Buenos Aires, Universidad Torcuato Di Tella, dez. 1999. BUENO, G. Formalismo e modernidade. Revista do Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais EBA. Rio de Janeiro, UFRJ, 2006.

7
Cf. Instituto de Arte Americano e Investigaciones Estéticas "Mario J. Buschiazzo" <http://www.iaa.fadu.uba.ar/?page_id=57> acesso em 12/03/2014 as 11:49h. E não deixa de ser curioso lembrar o lamento de Francisco Bullrich a respeito do fato de que a despeito de um conjunto de condições favoráveis – “vastos recursos econômicos, população com o mais alto nível de vida, desenvolvimento cultural dificilmente comparável”, etc. – e da observação de que a produção de, entre outros, “Vilar, Kalnay e Prebisch não tinha equivalentes nem no Brasil nem no México” (Arquitectura Latinomericana 1930/1970. Barcelona, Gustavo Gili, 1969; p. 45), a arquitetura moderna argentina, ao contrário do México e do Brasil, não conseguiu atingir um “desenvolvimento enérgico”. Para Eduardo Gentile, trinta anos depois, no número especial da revista argentina Block dedicado ao “fenômeno Brasil”: “o esforço de Bullrich em explorar a arquitetura brasileira esteve determinado pelo incômodo que sentia como argentino diante de tamanha desigualdade, havendo partido [o Brasil] de um background cultural e tecnológico percebido (não sem justeza) como inferior” (Formalismo y populismo en la receppción argentina del modernismo brasileño. Block, n. 4. Buenos Aires, Universidad Torcuato Di Tella, dez. 1999; p. 124).

8
Sintomático, nesse sentido, é o fato de que a monografia sobre Lucio Costa era, praticamente, desconhecida no Brasil antes do autor iniciar esta série de estudos sobre as publicações do IAA. Cf. notas 1 e 2.

9
Todos os emails enviados pelo autor ao IAA, ao longo de quatro anos de pesquisa, ficaram sem resposta.

10
Todavia de curta duração, pois seriam lançados apenas mais dois títulos: Alejandro Virasoro de José Xavier Martín e José María Peña, publicado em 1969 e Antonio U. Vilar de Mabel Scarone, publicado em 1970.

sobre o autor

Ricardo Rocha é professor na Universidade Federal do Espírito Santo.

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Julian Garcia Nuñez

Julian Garcia Nuñez

Lucia Elda Santalla

1968

149.02
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149

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