O livro “O que é patrimônio histórico”, de Carlos A. C. Lemos (arquiteto e professor de história da arquitetura na FAU USP), baseia-se em definir e destacar a questão da preservação do acervo do patrimônio cultural de uma determinada nação. Este acervo, de patrimônios culturais, pode ser caracterizado e classificado em categorias diversificadas. Isto se deve ao fato de que a conservação realmente engloba valores e interesses diferenciados, ou seja, a necessidade e a busca da preservação dependem do entendimento destas categorias em relação ao seu valor histórico e social.
Em geral, Lemos destaca a tardia conscientização que aconteceu no Brasil em relação ao pensamento de preservação do passado, desencadeando posições e medidas de conservação do patrimônio cultural.
O autor dedica-se a argumentar e definir as relações que possam vir a existir entre os artefatos e o meio de forma geral. Ratificando as palavras de Lemos, os artefatos apresentam dimensões, usos e escalas de valores diferenciados, a partir de conceitos definidos por órgãos responsáveis e até pela própria sociedade. Além disso, os artefatos criados para um determinado uso podem vir a se estabelecer em uma nova utilidade devido às necessidades decorrentes, ou seja, os costumes, valores, princípios e introdução de novas culturas se alteram ao longo do tempo definidos a partir de novas necessidades.
Carlos Lemos levanta a questão de o porquê preservar como algo amplo, onde se merece observar todas as diretrizes e características peculiares de cada sociedade. Admite que a industrialização possa vir a prejudicar esta busca pela própria identidade cultural, mas que tudo é uma questão de adaptação. A preservação sugere um conceito muito maior, incluindo elementos tanto tangíveis quanto intangíveis, conservando a memória do que seja mais significativo diante do grande patrimônio cultural estabelecido. Claro que, cada grupo dentro da sociedade defende aquilo que lhe pareça mais importante e que apresente maior valor para se preservar.
Além de o porquê preservar busca-se o quê preservar. A consciência conservadora, segundo Lemos, estabeleceu-se de forma retarda e individualista, ou seja, as pessoas levantavam bandeiras para a preservação do patrimônio que lhes remetiam um maior interesse. Muitos projetos foram formulados com fins de preservação, mas somente na década de 30, Mário de Andrade estabeleceu um projeto que englobou o patrimônio para a preservação deste acervo no Brasil. Neste mesmo contexto surge o Sphan – hoje Iphan – (Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e, de certa forma, seguia a lógica de preservação estabelecida pelo projeto de Mário de Andrade, embora mais ligado às questões de interesse público. O Sphan foi desenvolvido com o intuito de promover todas as intervenções nos monumentos.
Outro conceito levantado no livro refere-se ao Patrimônio Ambiental Urbano. Lemos afirma que desde o projeto inovador de Mário de Andrade, este já interpretou o contexto urbano como algo a ser conservado. Porém, devido às constantes transformações que ocorrem nos traçados urbanos existe à dificuldade de preservação, digo a origem mais primitiva, mas possível diante de um prisma conceitual definido.
Diante do patrimônio cultural que se deseja preservar, deve-se definir como se preservar. O principal enfoque neste conceito está relacionado aos bens ditos arquitetônicos que também eram escolhidos de acordo com conceitos e interesses individuais, desde ruínas até construções íntegras que necessitem de uma melhoria específica. O “como” preservar vai depender justamente destas classificações, sem ignorar o meio em que se encontram inseridas. Diante da busca de preservação destes artefatos arquitetônicos estabeleceram-se medidas mais concretas para este fim, como a Carta de Veneza, desenvolvida por profissionais ligados ao movimento de conservação, com conceitos e métodos de preservação. O tombamento também foi um recurso que começou a ser utilizado para a preservação de uma memória, ou seja, com o tombamento há uma restrição do uso e ocupação de uma determinada edificação para garantir a preservação de uma memória coletiva.
Claro que, atrelada a todas estas questões de preservação, interesses sociais e econômicos participam ativamente deste processo. Para Lemos, a principal forma de como preservar o patrimônio cultural está voltado principalmente para a questão de educação popular e em um maior interesse de conservação das classes que dirigem esta conscientização.
Em suma, a consciência de preservação no Brasil nasceu tardiamente e com conceitos prematuros e mal definidos, isto justificado a partir da observação atrasada da definição e estabelecimento do Sphan, diante da falta de interesse em relação ao passado, tanto da classe popular quanto da administração pública, ignorando o fato de que patrimônio cultural abrange vários tipos de categorias e métodos específicos de preservação, merecendo análises próprias para a correta preservação destes bens patrimoniais claramente importantes para a posteridade.
sobre a autora
Natássia Gavazza é arquiteta e urbanista, formada pela Universidade de Salvador, e especialistaem Planejamento Urbano e Gestão de Cidades.