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Pedro da Luz Moreira comenta o novo livro de Josep Maria Montaner, “A condição contemporânea da arquitetura”, segundo ele, uma continuação de livro de 1993, “Depois do movimento moderno”.

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MOREIRA, Pedro da Luz. O livro de Montaner “A condição contemporânea da arquitetura”. Resenhas Online, São Paulo, ano 16, n. 189.01, Vitruvius, set. 2017 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/16.189/6700>.


O livro do crítico catalão Josep Maria Montaner, A condição contemporânea da arquitetura, de 2016 pode ser visto como uma continuação do seu livro Depois do movimento moderno. A arquitetura da segunda metade do século XX, de 1993 (1). Os dois textos tentam sistematizar e identificar uma direção para os movimentos e sensibilidades que nortearam o fazer arquitetônico e urbanístico, no período conturbado de 1945 a 2016. Uma proposta no mínimo arriscada, pela falta de distanciamento histórico, mas também para um tempo que vem se revelando como de posicionamentos voláteis e efêmeros, na presença de uma aceleração sem paralelo na história humana. Afinal, nesses tempos contemporâneos, as ideologias que se hegemonizaram no fazer arquitetônico e urbanístico se mantiveram como paradigmas direcionais por muito pouco tempo, sendo destronadas por novas assertivas, não necessariamente excludentes. A pós modernidade e a celebração da história declinaram nos últimos tempos, havendo a retomada da incompletude do projeto moderno, agora mais domesticado e mercantilizado. A continuidade do projeto moderno, que foi colocada por Habermas (2) e outros filósofos, no final dos anos setenta parece ter ganhado força nos dias atuais. Nas palavras do autor, no livro A condição contemporânea da arquitetura:

“Esta obra pode ser considerada uma continuação do livro Depois do movimento moderno: Arquitetura da segunda metade do século XX (1993), repensa a arquitetura do periodo entre 1990 e 2015 e revisa as correntes hegemônicas das décadas de 1970 e 1980 para comprovar quais aspectos se tornaram ultrapassados e quais foram renovados e que conceitos e movimentos surgiram neste novo século” (p. 7).

Página do livro MONTANER, Josep Maria. A condição contemporânea da arquitetura. São Paulo, Gustavo Gilli, 2016
Imagem divulgação [Website Gustavo Gili]

Em tempos pós alguma coisa, como a nossa contemporaneidade, Montaner parece em busca de um referencial seguro, que dê conta de um fazer ético não mais universalista como o movimento modernista, mas capaz de estruturar um fazer "moral e social". O fascínio parece ser exercido pelas propostas metodológicas dos anos 1960, que engendraram uma forma de fazer que buscava a cooptação dos usuários, a abertura para o passar dos tempos e uma postura para enfrentar a obsolescência do planejamento totalizante. E mais uma vez, como outros esforços críticos no campo da atualidade da arquitetura e do urbanismo, que se anunciam construtores de uma determinada direção, acabam por nos oferecer uma panorâmica ampla, diluída e diversificada. Afinal como já anunciado no primeiro livro, Despues del movimiento moderno. A arquitetura de la segunda mitad del siglo XX, a pluralidade de posicionamentos é um fato constituinte de nosso tempo:

“De hecho, cada uno de los tres periodos en que se divide el libro, además de tener su propria coherencia interna, requiere una lectura y distancia critica diferente, adquiriendo su propia identidad, los años imediatos a la guerra, que forman ya parte de una historia suficientemente lejana, pero aun especialmente confusa, y que se mueven sobre todo dentro de la dicotomia continuidad o ruptura; los años sessenta que generan una serie de propuestas metodológicas que, si bien siguem  influenciando en la actualidad, pueden ser ya mirados con cierta distancia temporal y critica, y la más imediata actualidad, desde finales e los años setenta, un periodo reciente de enorme diversidad y predominio de las individualidades, cuyo análisis entraña mayores riesgos por su proximidad y su proprio desorden interno” (3).

Página do livro MONTANER, Josep Maria. A condição contemporânea da arquitetura. São Paulo, Gustavo Gilli, 2016
Imagem divulgação [Website Gustavo Gili]

Riscos, desordens, predomínio da individualidade pautam nossa contemporaneidade tornando difícil se perceber um sentido e uma direção, para uma humanidade que parece ter superado algumas metanarrativas (4) – o fordismo, o marxismo, ou o keynesianismo –, mas que na verdade naturalizou outras como; o neoliberalismo e o mercado. As críticas colocadas por Montaner se dirigem principalmente para aqueles arquitetos, que repetiram fórmulas bem sucedidas desprezando a demanda de todo projeto de uma reinvenção criativa a cada novo contexto enfrentado. A celebração se volta para os diagramas, a participação dos usuários, o não icônico, a flexibilidade, a liberdade de apropriação, a fenomenologia. O conceito de diagrama de força é interpretado como uma abstração, tal qual o conceito de tipologia da década de setenta, agora descompromissado com sua carga histórica:

“Por seu caráter dual – conceito e prática, ferramenta de análise e instrumento de projeto –, os diagramas têm se convertido em emblemas da virada do século. Eles vêm sendo usados no intuito de relevar e superar o conceito de tipologia da década de 1970, e, na atualidade, têm se transformado no conceito estruturador da relação e entre a teoria e a prática da arquitetura” (p. 95).

Uma construção muito próxima da que fez Tafuri, e de forma geral ao grupo da revista italiana Casabella y Continuittá, com relação ao conceito de tipologia, que era ao mesmo tempo operativo e teórico, estruturando a projetação e a análise. Mas, Montaner logo na introdução do livro irá construir um quadro de forças de cinco linhas, que são a continuidade “dos princípios e objetivos modernos”. A primeira linha, a racionalista, impulsionou o minimalismo principalmente na museografia, operando desde os anos noventa. A segunda, o organicismo, que parte de variadas influências, nas quais está o surrealismo, que permanecem com o programa de “fazer intervenções extraordinárias”. A terceira, a arquitetura baseada na memória, que estende "os conceitos da crítica tipológica". A quarta, a arquitetura experimental, baseada no pragmatismo e na celebração do fragmento como a impossibilidade de construção da continuidade. E, a quinta, a arquitetura relacionada com a fenomenologia, com sua valorização do empirismo, do vivido, e da exploração dos sentidos. A partir dessas cinco linhas, com seus respectivos representantes, Montaner desenvolve a seleção de obras e arquitetos com um claro mérito, o afastamento do euro-centrismo, tão comum nessas antologias.

Página do livro MONTANER, Josep Maria. A condição contemporânea da arquitetura. São Paulo, Gustavo Gilli, 2016
Imagem divulgação [Website Gustavo Gili]

O interessante é que no desenvolvimento do livro, o autor repete essas cinco linhas nos primeiros cinco capítulos, apenas com uma inversão (5), somando mais três posicionamentos operantes; capítulo 6: “Diagramas de energia”, capítulo 7: “Da crítica radical aos grupos: arquiteturas da informalidade”, e capítulo 8: “Arquiteturas do meio ambiente”. Sem dúvida, o quadro geral é elucidativo e esclarecedor, no entanto não há como negar a ausência de um posicionamento crítico, no recalque da presença da sedução do espetáculo, que opera sobre todas as linhas e acaba reduzindo muitas das linhas a repetição fácil. A espetacularização da cidade e da espacialidade em geral segue operando, criando uma visibilidade fácil, que gera sempre uma reprodução mecânica na zona de conforto para cada uma das linhas, declinando muito sua capacidade crítica inicial. Enfim, sem dúvida o mapa oferecido por Montaner é competente, mas merecia uma reflexão mais aprofundada sobre a inevitável captura da arquitetura pela “Sociedade do Espetáculo” (6).

notas

NE – publicação original do artigo: MOREIRA, Pedro da Luz. O livro de Montaner “A condição contemporânea da arquitetura”. Blog Arquitetura, Cidade e Projeto, Rio de Janeiro, 13 set. 2017 <http://arquiteturacidadeprojeto.blogspot.com.br/2017/09/o-livro-de-montaner-condicao.html>.

1
Tenho a seguinte edição do livro: MONTANER, Josep Maria. Despues del movimiento moderno. Arquitectura de la segunda mitad del siglo XX. Barcelona, Gustavo Gili, 1999.

2
HABERMAS, Jürgen. La modernidad: un proyecto inacabado. in Ensayos políticos. Barcelona, Ediciones Península, 1988.

3
MONTANER Despues del movimiento moderno. A arquitetura de la segunda mitad del siglo XX 1999 página7

4
Como relatos explicadores da modernidade, mas que celebravam também narrativas de forma implícita como o mercado e a moeda, as metanarrativas modernas eram citadas por LYOTARD, Jean Françoise. O pós moderno. Rio de Janeiro, José Olímpio, 1986.

5
O título dos cinco primeiros capítulos são; Capítulo 1: A continuidade do racionalismo e dos princípios modernistas, Capítulo 2: A aceitação do organicismo, Capítulo 3: Cultura, tipologia e memória urbana: monumentalidade e domesticidade, Capítulo 4: Arquitetura e fenomenologia, e Capítulo 5: Fragmentação, caos e iconicidade. A inversão se dá no capítulo 4 e 5, que na introdução são apresentados. MONTANER, Josep Maria. A condição contemporânea da arquitetura. São Paulo, Gustavo Gilli, 2016.

6
Condição descrita em: DEBORD, Guy. A sociedade do Espetáculo, comentários sobre a sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro, Contraponto, 1997.

sobre o autor

Pedro da Luz Moreira é arquiteto, doutor pelo Prourb FAU UFRJ, professor da Universidade Fluminense Federal e presidente do IAB-RJ.

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resenha do livro

A condição contemporânea da arquitetura

A condição contemporânea da arquitetura

Josep Maria Montaner

2016

189.01 livro
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189

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