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Abilio Guerra resenha a circulação de imagens pela rede social Facebook e as leituras e apropriações apressadas típicas desta mídia.

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GUERRA, Abilio. Nem sempre é o que parece. O diálogo maluco entre Zaha Hadid, Oscar Niemeyer e Tarsila do Amaral. Resenhas Online, São Paulo, ano 18, n. 205.02, Vitruvius, jan. 2019 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/18.205/7212>.


Há poucos dias circulou pelo Facebook uma imagem de um projeto atribuído a Zaha Hadid, que mantém semelhanças com o Palácio do Alvorada em Brasília do nosso querido Oscar Niemeyer. Os comentários na rede social oscilavam da orgulhosa menção da fonte explícita de inspiração à indignada acusação de plágio, opiniões todas elas forjadas a partir de rápida impressão provocada por uma simulação de computação gráfica.

New Cyprus Museum, projeto vencedor do concurso, 2016. Arquiteto Theoni Xanthi, XZA Architects + Thodoris Androulakis, Spiros Yiotakis e Margarita Zakynthinou
Imagem divulgação

Contudo, o projeto não consta da lista oficial de projetos do escritório Zaha Hadid Architects, provavelmente por não ter convencido o corpo de jurados do concurso internacional de projetos para novo museu da ilha de Chipre, mais precisamente para sua capital Nicósia (como a arquiteta britânica-iraniana faleceu em março de 2016, o projeto para o concurso do museu, de 2015, é um dos derradeiros projetos – quem sabe, o último – de sua autoria). O projeto vencedor, divulgado em 2016, é de autoria dos arquitetos Theoni Xanthi, Thodoris Androulakis, Spiros Yiotakis e Margarita Zakynthinou, do escritório grego XZA Architects.

Praça Eleftheria, Nicósia, Chipre, 2005. Arquiteta Zaha Hadid
Imagem divulgação [Zaha Hadid Architects]

O interesse em participar do certame de 2015 provavelmente se deve ao projeto de 35 mil metros quadrados em construção na capital cipriana, a “Eleftheria Square”, de autoria do escritório de Hadid. O ambicioso plano diretor da intervenção é definido com um sintético parágrafo presente no website do escritório:

“A Praça Eleftheria constitui uma intervenção arquitetônica dramática e historicamente significativa – uma aspiração de reconectar as enormes paredes da fortificação veneziana e fosso da cidade antiga com a cidade moderna – uma visão ousada de coerência e continuidade, que pode se tornar um catalisador para unificar a última capital dividida da Europa” (1).

Em uma rápida busca na rede mundial é possível constatar que a divulgação da imagem coube ao escritório norueguês MIR, especializado em “imagens de arquitetura não construídas”, ou seja, em desenhos digitais realizados com softwares especializados (2). O escritório desenvolve simulações para escritórios internacionais importantes, caso do britânico Foster and Partners e do dinamarquês Big.

Na verdade, trata-se de uma suposição que as simulações são feitas para tais clientes. O website oficial do escritório não é muito convencional e apresenta com bom humor as realizações e sua equipe de trabalho. O objetivo do estúdio é “criar entusiasmo” e sua filosofia é expressa nas frases “queremos fazer imagens que as pessoas pendurem na parede” e “Mir é Mir”. Na página com as biografias dos profissionais, todos os homens aparecem trajando jalecos brancos com poses de cientistas e a única mulher traja vestido para festa. Suas características são igualmente espirituosas: Trond Greve, “além de ler muitos livros, passa o tempo pescando, fazendo caminhadas e outras atividades ao ar livre”; Mats Andersen “é corredor de montanha ávido por longas distâncias e entusiasta de carros italianos”; Vegard Aarseth “é entusiasta do cinema e sabe mais sobre literatura científica do que sobre o que é saudável”; Solvår Sæter, a mulher, cuida do escritório e “certifica-se de que todos se comportem”; e assim por diante.

Concurso New Cyprus Museum, 2015, Zaha Hadid Architects
Imagem divulgação [Desenho de MIR]

Realizado para os escritórios ou não, os projetos são verdadeiros e, no caso específico da “New Cyprus Museum”, de Zaha Hadid, temos ao menos duas outras imagens do MIR e ambas desmontam por completo a avaliação – agora podemos afirmar “precipitada” – de uma relação tão explícita com a obra de Niemeyer. A perspectiva aérea revela uma edificação enorme, com volumetria variada nas formas, alturas e proporções. A terceira imagem, uma área interna vazada na cobertura, por onde avança uma árvore, sugere arcos com apoios afilados e concordâncias das curvas com ar oriental, afastando-se da sobriedade “grega” da solução do brasileiro. Por fim, fica evidente que a grande similaridade com o Palácio do Alvorada se restringe a uma pequena parte do projeto e está muito valorizado pelo ponto de vista adotado para renderização.

Concurso New Cyprus Museum, 2015, Zaha Hadid Architects
Imagem divulgação [Desenho de MIR]

Não há dúvida, porém, que a semelhança existe e não está errado sugerir, imaginar ou supor que a arquiteta tenha se apropriado sem querer – ou “sem querer querendo” – da forma icônica de Niemeyer. Os passos seguintes, nas direções opostas da referência conceitual e do plágio descarado, já me parecem um tanto exagerados, quiçá despropositados. E se é para arriscar liames improváveis – termo aqui usado no sentido da impossibilidade de comprovação –, prefiro arriscar a relação que tenho mencionado aos meus alunos nas últimas décadas (e quando falo sempre me escondo por detrás do ar irônico de quem sabe não ser possível falar a sério tais coisas...).

Palácio da Alvorada, Brasília DF. Arquiteto Oscar Niemeyer, 1957
Foto Victor Hugo Mori

O que se sugere – sem se afirmar de forma categórica, pois ninguém aqui é suicida – pode ser chamado de “referência cultural difusa”, seja lá o que signifique o termo. Assim como Zaha Hadid guardou a imagem do Alvorada e a usou num belo dia, Oscar Niemeyer teria feito o mesmo com a tela “São Paulo (135831)”, pintada por Tarsila do Amaral em 1925. No canto direito superior do quadro se vê um bonde prestes a cruzar uma ponte metálica que atravessa o skyline da metrópole. As barras do veículo têm formas semelhantes às colunas do Alvorada e a questão propriamente estética se desdobra nos âmbitos tipológico – o bonde aberto, ventilado e ensombreado é uma boa metáfora para a varanda do palácio – e social – o meio de transporte popular contamina de forma positiva e democrática o hieratismo excessivo da casa do presidente.

São Paulo (135831), Tarsila do Amaral, 1925
Foto divulgação

Bobagens de rede social e de sala de aula, é quase certo. Mas que parece, parece!

nota

1
“Eleftheria Square constitutes a dramatic and historically significant architectural intervention – an aspiration to reconnect the ancient city’s massive fortified Venetian walls and moat with the modern city beyond – a bold vision of coherence and continuity which can become a catalyst to unify the last divided capital of Europe”. Eleftheria Square, Zaha Hadid Architects <www.zaha-hadid.com/masterplans/eleftheria-square>.

2
MIR, website oficial <https://www.mir.no>.

sobre o autor

Abilio Guerra é professor de graduação e pós-graduação da FAU Mackenzie e editor, com Silvana Romano Santos, do portal Vitruvius e da Romano Guerra Editora.

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