O filme Ponto de Mutação (1), traz alguns questionamentos ao telespectador a partir de alguns conceitos expostos no filme, abordagem feita principalmente através do dialogo entre três personagens principais com pensamentos diferentes: o primeiro, o político, um senador e ex-candidato a presidência da República; o segundo, o poeta, um professor de literatura e escritor; o terceiro, uma cientista, especialista em física.
A partir deste cenário, os três dialogam sobre diversas temáticas e sempre são mostradas três abordagens diferentes, atribuída a cada personagem, a visão política e pragmática, a visão romancista e a visão científica; a partir daí o filme se desenvolve e inclui o telespectador nesta longa e densa conversação.
O primeiro conceito apresentado é sobre o pensamento mecanicista, presente desde o século 17 e que perdura até nos dias atuais; este pensamento é representado no longa metragem através de um relógio, que simboliza a máquina, simbologia que permite que se faça um paralelo de como era baseado, e ainda baseia-se, o pensamento científico, através de um olhar voltado para as partes, sem a correlação de todas as variáveis que possam interferir em um todo, ou seja, um conceito fragmentado que a sociedade fundamenta suas ações, sejam elas ações políticas, científicas ou sociais.
No entanto, a concepção primordial do filme é um contraponto ao pensamento mecanicista, apresentando o pensamento sistêmico, que tem como principal fundamento as interrelações entre todas as possíveis variáveis em determinado contexto ou objeto, ou seja, é a partir de uma visão holística e expansionista que é idealizado o conhecimento, podendo assim chegar a conclusões mais abrangentes e eficientes, e não somente focada em algum determinado fragmento, como propõe o pensamento mecanicista.
Neste sentido, pode-se relacionar a teoria dos sistemas, como é abordada no filme, com o conceito de sustentabilidade, este presente em diversas áreas de conhecimento, inclusive na arquitetura e urbanismo. Essa correlação se faz a partir de uma necessidade de se compreender a sustentabilidade através do pensamento sistêmico, já que é um conceito bastante amplo aplicável para diversas situações.
Tratando-se de sustentabilidade na arquitetura e urbanismo, esta está pautada principalmente em ações que minimizem os impactos das ações antrópicos no meio-ambiente, através de ações de planejamento, materiais de baixo impacto ambiental, ações mitigadoras, projetos eficientes energeticamente entre outros. Quando relacionamos o desenvolvimento sustentável com o a teoria dos sistemas, assume-se uma consciência global, de que toda ou qualquer ação cometida tem impacto sobre o todo, este todo é representado pelo meio em que vivemos.
Esta tomada de consciência reflete em todos os processos de projeto e execução de arquitetos e planejadores urbanos, que ao invés de planejar soluções pontuais, tenta identificar todas as variáveis possíveis para se chegar a uma conclusão unitária que possa abranger conceitos que impactem todas as áreas do conhecimento e principalmente identificar o impacto de determinada ação na sociedade, bem como no meio-ambiente, como um todo, para poder mitigar os possíveis efeitos nocivos que ela pode causar. Este raciocínio projetual pode ser conceituado como pensamento sistêmico aplicado à arquitetura e ao urbanismo, auxiliando em soluções práticas mais sustentáveis, eficientes e agregadoras.
Portanto, a contribuição do filme Ponto de Mutação para a arquitetura e urbanismo é o toque de despertar para um novo paradigma, em que analisar as variáveis em prol de um todo é mais significativo que aplicar soluções efêmeras e pontuais, o que contribui significativamente com os princípios da sustentabilidade em projetos de arquitetura ou em ações de planejamento urbano, a principal fundamentação é compreender que toda ação, sendo ela planejada ou não reflete sobre o todo, planejar com esta consciência global já é ser sustentável.
nota
1
Ponto de Mutação (“Mindwalk”, 112 min, 1990), direção Bernt Amadeus Capra, baseado no livro Mindwalk, de Fritjof Capra. Com Liv Ullmann, Sam Waterston e John Heard.
sobre o autor
Daniele C. David, arquiteta urbanista formada em 2015 pela Universidade de Franca, mestranda em Arquitetura e Urbanismo pelo PPGAU da Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia-MG, Brasil.