Na medida em que as férias se aproximam, aproxima-se também a expectativa da tão sonhada e aguardada viagem de férias. Devido a forte influência da TV, e de suas propagandas natalinas temos o pensamento utópico de um “natal inverno”. Contudo, isso não acontece no Brasil; o mais próximo que conseguimos chegar deste ideal é sem dúvida no pólo turístico da Serra Gaúcha, região que atrai milhares de turistas ao Rio Grande do Sul para desfrutar do natal luz, que se estende do final de novembro à meados de janeiro, em Gramado. Para Joffre Dumazedier, sociólogo francês pioneiro nos estudos do lazer e do turismo, a experiência de uma viagem é armazenada no inconsciente por anos; as sensações de bem-estar, satisfação e realização atuam diretamente na recuperação do âmbito psicossomático – trata-se do bem-estar físico e psicológico –, com efeitos praticamente imediatos. Seguramente, não há nada melhor para esta época de férias.
Para as ciências sociais aplicadas ao turismo, existem dois tipos de atrativos: naturais e culturais. Os atrativos culturais, normalmente são compreendidos como a manifestação do homem no espaço, encontrado em forma construída, danças e costumes, culinária típica, dentre outras. Gramado e Canela são algumas cidades da Serra Gaúcha onde o charme do ambiente arquitetônico atrai inúmeros visitantes anualmente, sendo que o forte da economia desta região é gerado pelo fluxo turístico. Quando não se compreende a verdadeira finalidade do planejamento urbano turístico, pode ocorrer desordem, pois não atende aos interesses das comunidades receptoras nem aos preceitos de conservação. Exalto aqui o bom planejamento que estas cidades adquiriram ao compreender o turismo. Observar, vivenciar o ritmo e habito da população local, e receber em troca a “gentileza urbana”, este produto final é influenciado pelos moradores e comerciantes que criam expectativas de retorno, devido à hospitalidade.
No aspecto arquitetônico, o estilo germânico chegou ao Brasil no período da colonização. A manifestação desta cultura é dada pela construção do habitat, instalado principalmente na região sul do país, regiões frias onde este estilo arquitetônico melhor se enquadraria, tornando-se com o tempo o traço alemão mais marcante. A arquitetura enxaimel é uma sistema construtivo baseado em técnica de construção manual, que consiste em pilares de madeiramento esculpido. As árvores precisavam usadas são grossas – em geral se usa a canela e araucárias – e o madeiramento fica exposto na fachada; quando encaixadas entre si nas posições horizontais, verticais e em ângulos diagonais, os espaços eram preenchidos geralmente por tijolos.
Nesta linha de raciocínio, ao observar o período atual e o emprego da tecnologia nas construções durante os séculos 17 e 18, seriam os primeiros passos de um pensamento pré-corbusiano da estrutura independente, pois as paredes não exerciam função estrutural, mas fechamento e apoio (o nome enxaimel na língua alemã significa “enchimento”; ao ser construído a estrutura da casa, os vãos entre pilares e vigas de madeira eram preenchidos com os materiais disponíveis da região).
As madeiras expostas na fachada atribuem grande estilo e beleza às construções, produzindo um caráter estético, além de conforto térmico. Outra característica mantida sem necessidade, para não descaracterizar, são as grandes inclinações dos telhados, cuja função original era sustentar o mínimo possível de neve.
Atualmente o sistema construtivista enxaimel não é mais utilizado em sua essência; trata-se de um sistema construtivista de fachada, como é denominado pelos habitantes da região. Árvores como a canela, atualmente preservadas por lei devido ao risco de extinção, foram substituídas pelo concreto. O madeiramento não só foi substituído por questões de preservação, mas pelos problemas que algumas madeiras apresentavam com o tempo devido à umidade, cupim e longevidade estrutural. Quando se está na Serra Gaúcha, os moradores e os guias falam sobre a arquitetura local com desenvoltura e naturalidade, despertando o interesse e curiosidade do aprendiz de arquitetura. É muito interessante quando a população tem o esclarecimento sobre seu sistema construtivista histórico e consegue dialogar com os visitantes. Assinalo que o mesmo não ocorria em São Paulo ao falar de arquitetura paulistana.
O tour à Serra Gaúcha inicia-se após cruzar um dos cartões postais mais famosos da região sulista, o pórtico de Gramado e estende-se pelas famosas fábricas de chocolate e vinícolas, que nos encantam pelo cheiro e paladar. Dentre varias atrações, temos a réplica do Museu de Cera, o Museu a Vapor, as catedrais de pedra, o lago negro, as ruas repletas de flores fornecendo aromas e cores... Neste ponto, me recordo do arquiteto e urbanista Jaime Lerner, que afirma que a cidade vai além da arquitetura, pois ela deve estimular os cinco sentidos humanos.
As cidades de Bento Gonçalves e Garibaldi preservam parte de sua cultura dentro do contexto histórico nacional, ao cultuarem a Guerra dos Farrapos ou Revolução Farroupilha. Ao embarcar no trem turístico, uma maria-fumaça, se observa no decorrer do percurso um teatro com músicas e situações típicas.
Pode-se dizer que o encanto da Serra Gaúcha não está limitado aos atrativos culturais, que são os mais difundidos, mas também são importantes os atrativos naturais como o cânion do Itaimbezinho, o mais famoso e um dos maiores do Brasil; seu percurso é ideal para quem curte esportes de aventura e contato com a natureza. Já os parques Caracol e Ferradura ficam mais próximos a cidades e possuem exuberante paisagem em meio às araucárias.
sobre o autor
Sérgio Antonio dos Santos Jr é bacharel em turismo e graduando em arquitetura e urbanismo. Desenvolveu trabalhos acadêmicos referentes ao planejamento organizacional do turismo nos estados do sul do Brasil. Atualmente dedica-se ao "Arquiteturismo", elaborando pesquisas científicas conceituais, envolvendo aspectos da interação entre arquitetura e turismo.
