Na fachada do edifício da Gazeta, situado na Avenida Paulista 900, temos um belo painel em concreto que traz inscrito o nome público do conglomerado de comunicação da Fundação Cásper Líbero, responsável pela edificação.
O projeto do edifício é atribuído ao engenheiro José Carlos de Figueiredo Ferraz, mas desconheço o nome do(a) artista responsável pela obra. Como também desconheço se ele, ou ela, gostou do corte feito na parte inferior da obra, ou até mesmo se aprovou a intervenção.
O corte foi realizado por ocasião da reforma para abrigar os cinemas do Reserva Cultural, reordenando o espaço do antigo cine Gazetinha para abrigar um conjunto de salas menores, como impõe o atual mercado cinematográfico.
Por princípio, deveríamos criticar uma interferência desta monta, que implica em descaracterização de uma obra de arte urbana. Mas, confesso constrangido que adorei!
No que diz respeito à obra de arte, a sobreposição do termo “Gazeta” sugere uma materialização parcial de uma infinita série lógica da palavra. Onde começa e onde termina esta concretude não tem muita importância e o seqüestro de pequena parte inferior da obra não interferiu em nada na legibilidade e compreensão de sua mensagem. Considerando o peso natural do concreto e a inclinação do painel em direção ao passeio público, o alívio da matéria em seu embasamento conferiu uma tensão, anteriormente inexistente, entre o peso do painel e a leveza de sua levitação.
Por outro lado, no que diz respeito à arquitetura, o hermetismo original do edifício, refratário ao espaço público, foi amenizado pela vitrine transparente ao rés do chão, permitindo uma interessantíssima integração virtual entre interior e exterior, onde os tranqüilos frequentadores do cinema – aguardando a próxima sessão sentados à mesa e tomando café, ou folheando os volumes da livraria – podem observar e ser observados pelos apressados transeuntes da avenida.
Acredito que o resultado foi bom para a cidade e espero ser desculpado pelo(a) artista responsável por uma opinião tão irresponsável.
sobre o autor
Abílio Guerra é arquiteto, professor da FAU Mackenzie e editor do portal Vitruvius e da Romano Guerra Editora.