Óbidos é um município português, no distrito de Leiria, com área de 141,6 km2, subdividido em nove freguesias: A dos Negros, Amoreira, Gaieiras, Olho Marinho, Santa Maria, São Pedro, Sobral da Lagoa, Usseira e Vau. Ao longo dos últimos 210 anos a população do município de Óbidos se manteve praticamente inalterada: eram cerca de 12,4 mil moradores em 1800 e 11,7 mil em 2011. Fica a 75 km ao norte de Lisboa e a 250 km ao sul da cidade do Porto. Neste cenário está contida a Vila de Óbidos, com apenas 3,1 mil habitantes, e que tem um papel proeminente neste município.
Em 1527, viviam 161 habitantes na Vila, o que corresponderia a cerca de um décimo da população do município. A área da Vila é toda amuralhada e era, já nessa época, idêntica à atual, com 14,5 hectares. O propósito original da construção das muralhas (1,5 km de extensão), além da proteção do lugar, era permitir o rápido deslocamento dos soldados, responsáveis pela fortificação.
Ao contrário do que se possa pensar, o nome Óbidos não é derivado da sua parônima óbitos, mas sim do termo latino oppidum, que tem o significando de “cidadela” ou “cidade fortificada”. Na suas proximidades da Vila de Óbidos foram encontrados vestígios arqueológicos da povoação romana de Eburobrittium. Segundo Caio Plínio Segundo, conhecido também como Plínio, o Velho, escritor naturalista romano, do século I, Eburobrittium era uma cidade romana que existia entre Leiria (Collipo) e Lisboa (Olisipo).
A história desta pequena cidadela é tão bonita quanto o lugar. Pode-se considerar que Óbidos é uma das vilas mais lindas e preservadas de Portugal. Em parte porque a trajetória desta cidadela, protegida por uma alta murada de pedra, é fortemente ligada à nobreza, desde o século XIII, quando o rei Dinis se casou com Isabel de Aragão. Dentre os diversos presentes que o monarca deu à esposa estava a Vila de Óbidos.
A Vila de Óbidos teria sido tomada dos Mouros, em 1148, e recebido a primeira carta de foral, em 1195, sob o reinado de D. Sancho I. A carta de foral corresponde à carta de lei que os monarcas concediam às terras que conquistavam, fundavam ou se desenvolviam e que regulava o modo de se administrar, de lançar tributos e estabelecer outros privilégios.
A Vila de Óbidos fez parte do dote de outras tantas rainhas de Portugal, designadamente Urraca de Castela (esposa de D. Afonso II), Filipa de Lencastre (esposa de D. João I), Leonor de Aragão (esposa de D. Duarte), Leonor de Portugal (esposa de D. João II), dentre outras.
Com um extenso patrimônio de arquitetura religiosa, cultural e vestígios histórico-monumentais, a vila de reis e rainhas foi, em outros tempos, local de preferência para descanso ou refúgio das desavenças da Corte Portuguesa. D. João IV e D. Luísa Guerra, D. Pedro II e D. Maria I, D. Leonor, D. Catarina de Áustria e D. Carlos, foram alguns dos monarcas que passaram por estas terras deixando, de uma forma ou de outra, marcas que a Vila ainda hoje mantém.
A tradição de Óbidos ser dote real durou até o século XIX. O fato de estar associada aos poderosos portugueses da época ajudou a conservar intacto o casario gracioso, com paredes caiadas e detalhes em azul ou amarelo, cenário típico lusitano. Para tudo ficar ainda mais belo, todas as fachadas são enfeitadas com flores, principalmente gerânios vermelhos e buganvílias roxas, além de outras belas vegetações.
Do ponto de acesso principal da região amuralhada, basta uma pequena caminhada até a imponente Porta da Vila, a entrada principal da Vila de Óbidos. Ao atravessar o arco de pedra que corresponde ao portão principal, tem-se a impressão de viajar no tempo.
A Porta da Vila é datada do século XVII, e possui como elementos distintivos azulejos do século XVIII e capela-oratório com varanda do século XVII. "A Virgem Nossa Senhora foi concebida sem pecado original" é a inscrição que se encontra sobre a porta principal da Vila de Óbidos. Foi colocada pelo Rei D. João IV, em sinal de agradecimento pela proteção dada pela Padroeira, quando da restauração, em 1640.
São muitas as atrações da Vila de Óbidos. Logo depois de entrar pela Porta da Vila, portão sul, basta subir a escada de pedras, para atingir o topo da muralha. Deste ponto, circulando pela muralha, é possível avistar toda a Vila, inclusive a Rua Direita, o principal corredor comercial, além de diversas torres, quer sejam as do castelo, ao fundo, quer sejam das 14 igrejas e capelas existentes. Muito pouco mudou nas ruas intramuros desde o século XIV, período em que a fortificação foi concluída, anterior ao século XII, quando os árabes foram dali expulsos.
No interior das muralhas, que sob o sol poente tomam uma coloração dourada, vivencia-se um típico ambiente medieval, composto por ruas tortuosas, de velhas casas caiadas de branco, com esquinas pintadas de azul ou de amarelo, de vãos e janelas manuelinas, de muitas flores e plantas coloridas. É possível encontrar no interior do Castelo de Óbidos uma das pousadas mais belas de Portugal. Este castelo foi transformado em pousada e, em 2007, recebeu diploma de candidata como uma das sete maravilhas de Portugal.
As construções antigas contém tudo o que qualquer visitante espera para uma viagem prazerosa: há bons restaurantes, uma coleção de cafés, lojinhas de artesanato e galerias de arte cheias de charme, além de muitas garrafeiras, como os portugueses chamam os lugares que vendem bebidas alcoólicas; dentre as especialidades etílicas locais estão os vinhos e a ginjinha.
Ao se referir a Óbidos, não se pode deixar de falar da famosa ginjinha, que é uma espécie de licor feito a partir da ginja, um tipo de cereja selvagem, pequenina e muito saborosa, abundante na região. A confecção da ginja para uso doméstico é uma tradição muito antiga na região. A sua venda em copos nas tabernas é um hábito profundamente português, que se sofisticou e ficou eternizado para a história de Óbidos pelas mãos de José Ferreira Duarte Montez (1905-1979). Homem de origens modestas, chegou a Óbidos para trabalhar nas minas de gesso da antiga companhia industrial portuguesa e cedo, pela sua perspicácia e jeito para o negócio, percebeu o potencial da Vila, pelo número de visitantes que aqui afluíam, abrindo o primeiro bar há mais de cinquenta anos, que veio a eternizar a Ginja de Óbidos num ambiente de conforto e requinte, propício ao convívio e à degustação do licor.
Há também lojas de artesanato, espalhadas pelas lindas ruelas típicas, onde se pode encontrar desde cerâmicas típicas da região, como azulejos pintados a mão, e portais feitos em gesso, lindamente decorados por artesãs locais.
A cidadela apresenta movimento de visitantes durante todo o ano, de maneira um pouco mais concentrada no verão. Um dos períodos de maior movimento é a Semana Santa, quando Óbidos é palco de algumas das mais bonitas procissões em Portugal, com a cidade iluminada por tochas.
A Rua Direita é assim conhecida desde o século XIV e constitui a rua principal da Vila de Óbidos. Ela liga a Porta da Vila ao Paço. Nos séculos XVI e XVII importantes transformações que sofreu esconderam os antigos portais góticos.
São destaques arquitetônicos e artísticos da cidadela, a Igreja de Santa Maria, próxima à Rua Direita, que se tornou muito conhecida por ter sido palco do casamento de Afonso V com a sua prima Isabel, na primeira metade do século XV. Ela foi, provavelmente, fundada no período visigótico e foi transformada em mesquita, durante a ocupação árabe.
No interior do templo chamam a atenção os azulejos do século XVII e o teto de madeira. À direita do altar podem ser apreciadas algumas pinturas de Josefa de Óbidos, uma das personagens mais famosas da cidade. Outras obras da pintora podem ser apreciadas no Museu Municipal, na mesma Praça de Santa Maria onde está a igreja. Há também um belo pelourinho manuelino do século XV, feito em pedra e enfeitado com redes de pesca desenhadas em relevo.
Josefa d’Ayala Figueira (Josefa de Óbidos), nasceu em 1630 (Sevilha, Espanha) e faleceu em 1684 (Óbidos). Era pintora barroca, filha de pai português, e cedo foi para Óbidos, onde desenvolveu a sua carreira, com uma passagem por Coimbra, no Convento dos Eremitas Agostinhos de Santa Ana, em 1644. Na sua pintura pode-se distinguir duas categorias: painéis religiosos e naturezas mortas.
Outro destaque arquitetônico é a Igreja de São Tiago, construída por D. Sancho I, em 1186. Tinha, originalmente, três naves com a entrada principal virada a poente, comunicando assim diretamente com o interior do Castelo. Era a Igreja de uso da Família Real, quando de suas estadas em Óbidos; foi enriquecida ao longo dos séculos com numerosas obras de arte, das quais se destacava a Galeria da Rainha, obra de talha gótica.
Em 1755, essa igreja foi totalmente destruída pelo terremoto - a maior tragédia coletiva do povo português ao longo de toda a sua história - e reconstruída, em 1772, com a fachada alinhada com a Rua Direita e cabeceira voltada a norte. Tinha no retábulo do altar-mor uma pintura representando São Tiago Maior, tábua maneirista de autor desconhecido da segunda metade do século XVI, que teria feito parte do primitivo retábulo, hoje no Museu Municipal.
A cultura e patrimônio arquitetônico e cultural da Vila reservam outras surpresas agradáveis. O Museu Municipal apresenta exposição permanente com cerca de cem obras de arte datadas do período entre os séculos XIV e XVIII.
O Museu Paroquial da Igreja de São João Batista, localizado perto do Portão de Freguesia, foi recentemente restaurado. É uma das estruturas mais simbólicas e uma referência muito importante do patrimônio edificado em Óbidos. Em 1309, a Rainha Santa Isabel encomendou a sua construção e dedicou-o a São Vicente. Sua função era fornecer assistência religiosa às vítimas da lepra, durante a Idade Média.
A Galeria Nova Ogiva é uma extensão de Arte Contemporânea da Rede de Museus e Galerias de Portugal, constituindo uma expressão de alta qualidade artística. Já, a Galeria Caso do Pelourinho foi aberta, em 2004, com exposições de relevância cultural, principalmente em relação à Arte Contemporânea. Um dos principais objetivos desta galeria é promover e estimular novos e talentosos artistas. Este espaço é uma alternativa para a Casa Senhorial da Praça de Santa Maria, que agora abriga a coleção permanente do Museu Municipal.
Situado ao sul da Vila, encontra-se o Aqueduto da Usseira, também conhecido como Aqueduto de Óbidos. Foi mandado construir por Catarina de Áustria, esposa de Dom João III, por volta de 1570. É classificado como Imóvel de Interesse Público, desde 1962. Sua construção é em alvenaria de pedra, e ligava Usseira, onde se situa o manancial de água, a Óbidos, a uma distância de três quilômetros.
A partir de Óbidos, chega-se rapidamente a outros pontos de grande atração turística da região, como são os casos de Estremadura, Ribatejo, Tomar, Fátima, Alcobaça, Batalha e Peniche. Não fica longe da cidadela locais dotados de belezas naturais da região: Lagoa d'Óbidos, Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros. De Peniche partem barcos com destino às Ilhas Berlenga, santuário de aves e peixes, que distam 12 km da costa.
Enfim, a Vila de Óbidos é um local surpreendente, com uma trajetória marcante e possuidora de um patrimônio histórico, arquitetônico e cultural extraordinário. Não é por pouco que é considerada, em um país com um patrimônio cultural milenar, como uma das sete maravilhas portuguesas.
referências bibliográficas
DGAL (2011). Direção Gera das Autarquias Locais: Óbidos. Disponível em: Erro! A referência de hyperlink não é válida..
O Globo (2010). Óbidos, a pequena jóia da realeza de Portugal. Disponível em: http://oglobo.globo.com/boa-viagem/obidos-pequena-joia-da-realeza-de-portugal-2947391.
Portugal Virtual (2011). Óbidos. Disponível em: http://www.portugalvirtual.pt/ _tourism/costadeprata/obidos/ptindex.html#1.
VENDA, Cátia F. F. de Sousa. Reabilitação e reconversão de usos: o caso das pousadas como património. Dissertação de mestrado. Lisboa, Instituto Superior Técnico da Universidade Técnica de Lisboa, 2008.
sobre o autor
Archimedes Azevedo Raia Junior é engenheiro, mestre e doutor em Engenharia de Transportes, professor e pesquisador do Departamento de Engenharia Civil e do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Urbana da Universidade Federal de São Carlos-SP.