No dia 26 de outubro de 2012, um grupo de alunos do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFJF, sob a coordenação do Professor Antônio Agenor Barbosa, partiu para o Rio de Janeiro com o objetivo de conhecer a Cidade Maravilhosa. E para “conhecer” é preciso olhar, caminhar, discutir, fotografar, observar as pessoas, a arquitetura das diversas épocas, desbravar o ambiente urbano e suas belezas naturais, sempre presentes quando o assunto é Rio de Janeiro.
Mais do que uma visita a pontos turísticos e monumentos, fizemos uma imersão no dia a dia do carioca. O deslocamento dos alunos por metrô, sugerido pelo professor, não só agilizou os percursos como também nos permitiu identificar aspectos sociais que compõem a dinâmica urbana da cidade. As linhas de metrô, cheias de trabalhadores, estudantes, artistas de rua, funcionam como verdadeiras vias subterrâneas não só pela perspectiva do transporte, mas pelo viés da livre apropriação do espaço e do tempo feita pelas pessoas que nelas trafegam e as utilizam como lócus de manifestação cultural num sentido amplo.
Nossa primeira parada foi na Igreja de Nossa Senhora da Candelária. O templo barroco localiza-se na porção central da Avenida Presidente Vargas e impressiona pela escala, história e suntuosidade do espaço interno. Logo em frente, está a Casa França-Brasil (projeto de Grandjean de Montigny de 1820, no estilo Neoclássico) e o Centro Cultural do Banco do Brasil, primeira sede do banco e atualmente um dos principais centros culturais do Rio de Janeiro.
Na caminhada até a parada seguinte, provocados pelo professor, fizemos um pequeno debate. Abrigados em uma das tantas galerias do centro da Cidade nos perguntamos: “estamos em um espaço urbano ou arquitetônico?” A pergunta foi pertinente em muitas outras situações, já que esses espaços de transição são característicos do centro da cidade do Rio de Janeiro e nos fez notar as diferentes maneiras utilizadas por cada estilo (e em cada período) para conciliar a escala da cidade com a dos edifícios.
Um intricado sistema de estreitas ruas é o que separa a monumental Avenida Presidente Vargas de vias como a “Ladeira do João Homem”. A própria denominação do logradouro sugere uma mudança drástica de caracterização espacial: o Morro da Conceição abriga muita história em suas ruas, arquitetura e cotidiano dos seus moradores. A região tem sido alvo de projetos de enobrecimento, que visam à melhoria do espaço urbano e a atração de pessoas para o comércio, lazer e turismo. Na Ladeira do João Homem, que abriga alguns ateliers de artistas plásticos e estabelecimentos gastronômicos, postes de iluminação pública vêm sendo substituídos e alguns sobrados estão sendo reformados. A estreita via desemboca em um largo onde se encontram instalações militares da época colonial. A área que antes servia ao propósito de defesa, e que para tanto dispunha de uma vista privilegiada para o mar, está hoje circundada por inúmeros arranha-céus.
Finalizamos o percurso pelo Morro da Conceição com uma visita ao Jardim Suspenso do Valongo. Com uma temática de contemplação, o jardim se apropria do relevo com a consolidação de formas orgânicas e configura uma ambiência que se aproxima ao máximo da paisagem natural. Uma área como essa é cara à cidade e funciona como um “respiro” em meio ao caos viário.
Seguimos para o sítio arqueológico do Cais do Valongo. Durante escavações para a implantação de um projeto de intervenção urbana, foi encontrado o cais que, na sua origem era ponto de desembarque de escravos e que posteriormente, já embelezado, veio a receber a imperatriz Tereza Cristina no período colonial, reascendendo mais um capítulo da história do Rio, encoberta em meio aos sucessivos aterros.
Vizinho ao Cais do Valongo está o stand de informações do projeto Porto Maravilha, um espaço interativo e destinado a apresentar ao público a obra que será realizada na zona portuária do Rio até 2016, englobando a demolição do Elevado da Perimetral, a construção de túneis e passagens subterrâneas, alterações de parâmetros de uso e ocupação do solo, além da instalação de ciclovias e VLT.
Ainda na sexta-feira (dia 26/10/12), tivemos um encontro noturno que foi marcado pelo professor em um dos lugares mais emblemáticos da cidade: a Cinelândia. Dentre os principais edifícios, o imponente Teatro Municipal, a Biblioteca Nacional, o Museu Nacional de Belas Artes e a antiga sede do Supremo Tribunal Federal. Essa característica multicultural imprime à Cinelândia diversas possibilidades de apropriações que a tornam um local aprazível, e vivenciá-la no período noturno foi um grande aprendizado.
Nosso próximo destino foi a Escadaria do Selarón, que recebe esse nome em menção ao artista chileno Jorge Selarón, que a revestiu com mosaicos de azulejos. Esse é mais um espaço livremente apropriado pelos usuários, uma pequena amostra do que estava por vir nas outras ruas da Lapa, berço da boêmia carioca: barraquinhas vendendo bebidas, comidas e artesanatos se dispõem nas vias, atraindo um público diversificado e que “faz sua festa na rua”, animada por músicos que embalam as noites com ritmos regionais. Finalizamos nosso percurso nos Arcos da Lapa, o aqueduto do Rio Carioca, que é considerado a maior obra arquitetônica empreendida no período colonial, cuja monumental estrutura, iluminada à noite, chama a atenção dos passantes.
Na manhã do dia seguinte, sábado (27/10/12), o grupo se reuniu no Largo da Carioca, onde foi observado o Convento de Santo Antônio e o Edifício Avenida Central. Mais adiante, pudemos conhecer as sedes da Petrobrás e do BNDES, marcos do conjunto empresarial da área central de negócios da cidade. As características com inspirações modernas (como brises, terraços-jardim, sistema estrutural aparente, etc) logo saltam aos olhos.
Seguimos para a Rua da Carioca, onde visitamos o Cine Íris, construído no início do século XX em estilo Art Nouveau e que, atualmente, só exibe filmes para o público adulto. Apesar do uso restrito, podemos considerar seu funcionamento uma vitória, ainda mais em uma vizinhança que, a contragosto de seus proprietários, vem se tornando foco de atuação de tantos interesses divergentes.
Na Rua Gonçalves Dias fizemos nossa próxima parada, na tradicional e suntuosa Confeitaria Colombo. Demos sequência à caminhada até a Praça XV, onde fomos separados em pequenos grupos, para que pudéssemos desvendar áreas adjacentes a partir do nosso próprio olhar. Os alunos se dividiram entre as exposições do Paço Imperial, os restaurantes e bares do histórico Arco do Teles e a Feirinha de Antiguidades que funciona embaixo do Elevado da Perimetral na Praça XV. A feira introduz à sombra do elevado cores, cheiros e culturas: algumas barraquinhas guardam registros importantes da história da cidade e do país, democratizam o acesso à leitura, à música, e conferem àquele local um significado único.
Após o almoço, nossa caminhada continuou em direção ao eclético Palácio Tiradentes, ao Ministério da Fazenda e ao edifício do MEC. Para alguns alunos, foi difícil crer que duas interpretações arquitetônicas tão díspares como as últimas foram construídas em um mesmo período histórico.
O antigo Ministério da Educação e Saúde foi pensado articuladamente com o desenvolvimento artístico e paisagístico da arquitetura em sua relação com a escala urbana. Esculturas, painéis de Portinari e belos jardins de Burle Marx conferem ao edifício uma qualidade arquitetônica e ambiental ímpar, deixando como legado os elementos que o tornam atemporal.
Seguimos para o Museu de Arte Moderna (MAM), um edifício de concreto aparente que é um marco moderno no Rio e emoldura a paisagem da Baía de Guanabara. A visita ao Parque do Flamengo também foi proveitosa para vivenciarmos os usos das áreas verdes em um típico dia de calor na capital carioca: pequenas rodas de toque de bola, piqueniques, apreciação da paisagem, uso das ciclovias, entre outros.
A caminhada continuou até o Monumento aos Pracinhas, que apesar de transmitir ao usuário uma atmosfera de austeridade, confere um senso de paz por estar integrado à beleza da paisagem do Aterro, uma bela homenagem aos soldados mortos na Segunda Guerra Mundial.
Nesse cenário foi encerrada a nossa viagem de estudos ao Rio. Muitos foram os aprendizados desenvolvidos durante as visitas, muitas foram as histórias ouvidas nas ruas, muito proveitosa foi a autonomia que nos foi dada pelo professor para nos movermos livremente pela cidade. Pudemos de fato vivenciar a verdadeira Cidade Maravilhosa, não aquela dos hotéis e dos deslocamentos por automóvel, mas sim a dos espaços públicos, dos usos cotidianos que lhes são conferidos e dos usuários que os dinamizam.
Ver a cidade pela perspectiva do transeunte é fundamental para buscar o equilíbrio entre o meio urbano e a arquitetura, solucionando com cuidado as questões inerentes a esse espaço de transição, tão importantes para as nossas vidas.
sobre as autoras
Carina Folena Cardoso e Isadora Tavares Monteiro são alunas do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF-MG) e que, convidadas pelo professor Antônio Agenor de Melo Barbosa, participaram da viagem de estudos ao Rio de Janeiro, escrevendo a partir de suas impressões o presente relato.
sobre o professor
Antônio Agenor Barbosa é professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF-MG) e coordenador da viagem de estudos à cidade do Rio de Janeiro que motivou este relato escrito pelas alunas Carina Folena e Isadora Tavares Monteiro.