tor·re |ô|
(latim turris, -is)
1. Estrutura em que a altura é muito superior à largura.
Elas estavam lá. As torres. Nem todas à vista. Eu só percebi quando terminei todos os desenhos. Começamos a viagem e decidi registrar os dias em meu sketchbook de bolso. Com linhas rápidas, desenhei detalhes da vida e os lugares por onde passamos: construções históricas, comidas, paisagens, pessoas.
Onde falam português, vimos a cidade a partir dos miradouros. Desenhei o Elevador da Glória e o monumento no centro do Largo do Carmo ao lado de umas crianças que coincidentemente faziam o mesmo. Era maio e Lisboa estava lilás-jacarandá.
Onde falam catalão e espanhol, fiquei feliz em reproduzir as linhas que Gaudí criou. Caminhamos por Barcelona e vimos que cidades coexistem umas dentro das outras. Dos históricos El Raval e Bairro Gótico ao elegante Passeig de Gràcia, da pitoresca Barceloneta às vistas panorâmica de Montjuïc ou Tibidado, as Barcelonas visíveis encantam com uma diversidade de sorrisos.
Quando começaram a falar francês, estávamos chegando a Carcassonne. Caminhamos à noite até poder ver a cidadela medieval iluminada sobre a colina. Pisquei os olhos várias vezes, mas ela permaneceu lá, suspensa. No dia seguinte, subimos a colina. Eu queria desenhar cada pedra da cidadela.
Seguimos viagem para Avignon, no coração da Provença. Nas paisagens de cores dessaturadas que douram no fim do dia, aqui e ali pontuam o lilás e o ocre: Saint-Rémy, Les Baux-de-Provence, L'isle-sur-la-sorgue, Gordes, Roussillon. Quando chegamos à cidade portuária de Marselha, o azul turquesa completou a paleta de cores provençal. Visitamos a Ilha de If e me aproximei ainda mais de uma das minhas histórias preferidas - O Conde de Monte Cristo.
Hora de mudar de língua – e que mudança! Não conseguimos pronunciar nenhuma palavra em Tcheco. Em Praga, caminhamos de Staré Město a Malá Strana e Hradčany sempre impressionados pelas construções com coberturas requintadas que arranham o céu. Desenhei muitas delas.
Começaram a falar alemão quando chegamos à antiga capital do reino da Saxônia, Dresden. Dali conhecemos outras duas cidades: a simpática Leipzig e Dessau, onde realizamos o sonho comum aos arquitetos de visitar a Bauhaus.
Seguimos para a cosmopolita Berlim. A cidade está cheia de tubos coloridos e memórias suspensas. A antiga torre de televisão tem aquele ar futurista que a arquitetura vez por outra perseguiu. Ainda hoje ela cumpre seu papel de comunicação. De vários pontos da cidade é possível vê-la repetindo: você está em Berlim!
Voltamos para casa cheio de lembranças. Folheei meu skechbook e então percebi o quanto as torres me fascinaram nesta viagem. Não apenas as que têm torre como prenome, mas todas que alongam paisagens, marcam o espaço público e coroam edifícios: o monumento do Largo do Carmo no meio dos jacarandás; as chaminés da casa Milà, transformados nos guerreiros mascarados de Gaudí; o farol da ilha de If; as cúpulas e campanários das cidades históricas, as pontas da pós-moderna Filarmônica de Berlim.
Inconscientemente dediquei quase todas as páginas do meu caderno a essas torres. O caminho pontuado por torres é mais fácil de lembrar.
sobre os autores
Cynara de Sá Fernandes é Arquiteta e Urbanista e Mestre pela UFRN. Atua como arquiteta do quadro funcional do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte.
Petterson Michel Dantas é Tecnólogo em Gestão Ambiental pelo IFRN, Arquiteto e Urbanista e Mestre pela UFRN. É Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte na área de Representação Gráfica e membro do coletivo Urban Sketchers.