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architexts ISSN 1809-6298


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MACEDO, Danilo Matoso. Arquitetura é fracasso? Arquitextos, São Paulo, ano 04, n. 038.04, Vitruvius, jul. 2003 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/04.038/668>.

Saiu recentemente na revista Veja (04 jun. 2003): num universo de 17 profissões e de 607 entrevistados, a arquitetura é a profissão mais mal-paga do mercado (salário inicial de R$ 1.700,00 e salário após dez anos de R$ 3.000,00). Nenhum outro profissional ganha tão mal quanto o arquiteto, segundo a pesquisa da revista. Nenhum! Dentre médicos, advogados, biólogos matemáticos, analistas de sistemas, enfermeiros, gente formada em educação física, economistas, geógrafos, engenheiros, jornalistas, licenciados em letras, dentistas, psicólogos e publicitários, todos com dez anos de estrada.

A revista atribui o fracasso da profissão à crise no mercado da construção civil. Mas estranhamente, a profissão de engenheiro vai bem, obrigado. Os decoradores, por outro lado, também têm se destacado...

Não é só uma questão salarial. É muito mais ampla: é uma questão de desvalorização real da profissão, fracasso mesmo. E o fracasso começa de dentro para fora: quantos escritórios de arquitetura assinam a carteira de trabalho dos arquitetos contratados? Pouquíssimos – pelo menos em Belo Horizonte. E pronto: lá vai o arquiteto ignorando olimpicamente mais de um século de conquistas trabalhistas.

E os concursos de anteprojetos de arquitetura, tão esperados, alardeados e justamente festejados em nosso meio? Dos últimos certames nacionais realizados, quantos foram efetivamente construídos? Poucos... Segundo minhas contas não chegam a dez por cento. E os valores dos prêmios? O primeiro prêmio de qualquer projeto deveria corresponder no mínimo ao valor do estudo preliminar da obra, caso ela fosse contratada sem concurso (aproximadamente 1% do valor da obra, por baixo). Mas isso não acontece: via de regra, o valor do primeiro prêmio de um concurso fica em torno de R$ 5.000,00, para um projeto cujo custo de execução beira ou supera um milhão de reais. Se pensarmos que esta mobilização – o concurso – foi a muito custo "conseguida" pelos próprios arquitetos – mal-organizados nos IABs – junto aos proprietários, e que estes quase sempre se reservam ao direito de não construir o projeto vencedor, a situação atual já é de fracasso mesmo: a Veja só confirma o que todo mundo já sabia.

Eu, pessoalmente, atribuo o fracasso da profissão a dois fatores.

O primeiro fator é a deficiência na formação do arquiteto. Valoriza-se em demasia o filósofo-artista em detrimento do técnico, numa área em que o mundo acadêmico é pouco expressivo – ao contrário da sociologia, filosofia etc. Assim, o profissional considerado um bom arquiteto ao sair da universidade é um teorizador ou desenhista de mão cheia, sem área acadêmica que comporte sua produção, ou entidades públicas ou particulares que se interessem por suas divagações teórico-artísticas, significativas apenas no universo fechado da própria arquitetura. Por outro lado, aqueles que se dedicaram às áreas técnicas da arquitetura desde a época mais tenra de sua formação, invariavelmente padecem de um complexo de inferioridade quase doentio em relação ao primeiro grupo, por demais valorizado nas universidades. Este ressentimento pouco colabora para a formação do humanista com a mente aberta para a desejável tarefa de síntese cultural que o ato de construir potencialmente representa, transformando-se numa espécie de engenheiro especializado numa área técnica específica. Cria-se um hiato entre as duas vertentes que vai muito além da simplista oposição entre teoria e prática, e onde nenhum dos lados sai lucrando. Formam-se profissionais invariavelmente frustrados: os primeiros por acharem que seus clientes e atividades que desempenham como profissionais iniciantes não estão à altura de seus dotes artístico-filosóficos – e, de fato, via de regra não estão - ; e os segundos por sentirem-se preteridos em relação aos primeiros numa mídia especializada festiva que valoriza demonstrações ridículas de retórica barata - como o lamentável memorial descritivo de Daniel Libeskind para a reconstrução das torres gêmeas - às soluções simples e corriqueiras de que a profissão trata na maior parte do tempo.

Um segundo fator é a simples falta de lugar social da profissão nos dias atuais e no Brasil: salvo o atendimento da elite e da indústria - de mercados reduzidíssimos - ao arquiteto resta pouca alternativa profissional, já que as instituições públicas rara vez realizam concurso para arquitetos, e quando o fazem, abrem uma ou duas vagas para um órgão com 5000 empregados. Felizmente, com a relativamente recente reformulação da legislação urbana federal, tem-se aberto campo vasto na área de planejamento urbano, ambiental e de levantamento patrimonial. Na maioria das escolas, entretanto, o planejamento urbano é tradicionalmente tratado com tal engajamento político que forçosamente converte-se em disciplina oposta à “frivolidade” do projeto de arquitetura, em lugar de complementarem-se os campos.

Não creio que a solução para este tipo de fracasso esteja nas campanhas de "valorização profissional" promovidas pelos órgãos de classe – que constituem peças publicitárias pedindo pelo amor de Deus que se contratem arquitetos para as obras. Chega a ser ridículo que uma profissão cujos produtos estão tão à mostra – as edificações e espaços habitados – necessite de alguma publicidade adicional. Não. A solução deve passar por algo bem distante disso. Acredito que passe pela reformulação dos desejos, dos anseios do profissional: se, entre o operário e o artista, prevalecesse o artesão, a qualidade média de arquitetura seria melhor; as cidades seriam locais mais agradáveis e o verdadeiro humanista arquiteto faria definitivamente parte de um sistema de produção e planejamento do espaço construído. Humilde mas presente, certamente participaria mais ativamente do meio social em que se insere, com menos fracasso financeiro e mais realização pessoal.

sobre o autor

Danilo Matoso Macedo é arquiteto (1997) e mestre em arquitetura (2002) pela EA-UFMG. Foi premiado em diversos concursos, destacando-se o Concurso Attílio Correia Lima de Requalificação do Centro de Goiânia, em 2000, 1o. lugar (com Alexandre Brasil, André Oliveira e Carlos Alberto Maciel), o 1º Prêmio Itagrés Arquiteto 2000, em 1995, e o 10º Concurso Paviflex, em 1998, com menção honrosa

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