Há exatos 50 anos, no dia 01 de agosto de 1953, a assistente da comissão do IV Centenário de São Paulo, Maria Oliva Fraga, redigia a seguinte nota para o arquiteto Le Corbusier, no seu escritório em Paris:
“Senhor, lamento informá-lo que o presidente Matarazzo acaba de trazer ao meu conhecimento que a Comissão do IV Centenário de São Paulo encontra-se na impossibilidade de construir o teatro cujo projeto havia sido realizado pelo Sr. Oscar Niemeyer. As dificuldades financeiras em que se encontra a Comissão obrigaram-na a abandonar este projeto. Conseqüentemente as pinturas murais e as esculturas que tinham sido previstas e cuja execução seria confiada as senhor mesmo, e ao senhor Léger e ao senhor Moore não poderão ser realizadas. A Comissão do IV Centenário encarregou-me de transmitir-lhe suas escusas e seu grande pesar” (1).
Esta correspondência veio encerrar uma série de negociações, que envolveram Le Corbusier, Oscar Niemeyer, Mário Pedrosa, bem como o “presidente Matarazzo”, sobre uma encomenda ao arquiteto francês de dois painéis de pintura, de 150 m2 cada um, para as paredes laterais do auditório, um dos edifícios que fazia parte do conjunto arquitetônico e paisagístico do Parque Ibirapuera, em São Paulo.
O teatro/auditório e o pavilhão, dentre um conjunto de edifícios projetados para permanecer no parque finda a exposição, foram os únicos que não foram construídos. As razões são aquelas explicitadas a Le Corbusier acima, com certeza entre outras tantas que não cabe aqui levantar. De autoria do arquiteto Oscar Niemeyer (e de uma equipe paulista composta pelos arquitetos: Eduardo Kneese de Mello, Zenon Lotufo, Hélio Uchoa Cavalcanti, Gauss Estelita, Carlos Lemos), este conjunto somava-se a quase trinta outras edificações efêmeras para compor o recinto de um grande parque de exposições, todas dispostos em meio à área verde inicialmente com projeto paisagístico de Roberto Burle Marx, depois urbanizada segundo desenho do engenheiro agrônomo Octavio Augusto Teixeira Mendes. O auditório, juntamente com um edifício destinado originalmente ao planetário – inaugurado como Palácio de Exposições com a mostra de arte italiana “De Caravaggio a Tiepolo”, depois ocupado pelos Museus da Aeronáutica e do Folclore, e hoje espaço expositivo rebatizado de Oca – segundo depoimento dos arquitetos “foram estudados conjuntamente, constituindo o elemento arquitetônico mais importante da Exposição” (2).
A própria Comissão explicava, no seu relatório final, de que maneira pensara o projeto do parque com o qual presenteou a cidade de São Paulo nos seus 400 anos de fundação:
“Ao elaborar o plano de comemorações do aniversário de fundação da Cidade de São Paulo, a Comissão do IV Centenário escolheu como orientação primeira a realização de empreendimentos de caráter duradouro, que se prolongassem no tempo como um marco comemorativo de alta significação e utilidade. Daí nasceu a idéia de construção do Parque Ibirapuera, que é, sem dúvida, obra monumental, harmoniosa e bela nas suas linhas arquitetônicas. E que constitui um dos maiores conjuntos do gênero no mundo. Com esse empreendimento, a Comissão do IV Centenário dotou São Paulo de um centro permanente de cultura, capaz de atender às necessidades do melhor conhecimento e divulgação de nossa indústria, agricultura e comércio, através de exposições, bem como de um local condigno para as manifestações artísticas de São Paulo, que, pelo grau de progresso atingido nos vários ramos da atividade humana, está situado na vanguarda do país. Além disso, constitui um centro de diversões para a população paulistana, de grande interesse turístico, graças a beleza e comodidade de sua concepção urbanística” (3).
No início dos anos 50 do século XX, portanto, este parque essencialmente urbano, destacava-se antes de mais nada, pela obra daquele que já era considerado um dos mais importantes arquitetos da atualidade, e não só no Brasil. Sua concepção apontava para um centro de cultura e civilização, e não para uma área de valor ambiental, valor esse que passou a lhe ser incorporado também com a execução do paisagismo, crescendo com a expansão desequilibrada da área urbanizada. O grande progresso e desenvolvimento que caracterizavam a São Paulo de então, deveriam encontrar no parque uma atividade cultural correspondente, assim como se desejava ali expor e promover a produção cientifica e tecnológica de ponta, atividades vistas como representativas da essência do lazer para a metrópole emergente.
Mas porque voltar às origens do parque hoje? Porque nos parece não haver outra maneira de enfrentar a polêmica gerada pela tentativa de retomada, por parte da prefeitura de São Paulo, da construção do auditório segundo as linhas do projeto original, no local previsto, com desenvolvimento de projeto do próprio Oscar Niemeyer, no momento em que o parque comemora seus 50 anos de existência e a cidade 450 anos. E pela ação da 4ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente contra a prefeitura com o intuito de impedir a construção, argumentando, segundo os jornais, que a construção “fere a resolução de tombamento do parque, de 25 de janeiro de 1992, que impede a redução de áreas verdes”, acrescentando ainda o promotor Luiz Antonio de Souza que “a resolução do tombamento impõe uma política de incentivo para a ampliação dos espaços permeáveis e áreas verdes” (4). E ainda: “Na decisão não há qualquer carga ideológica ou política. Foi meramente técnica e legal, pois o Ministério Público é fiscal da Lei”, segundo o procurador Walter Paulo Sabella, do Conselho Superior do Ministério Público Estadual (5).
Voltar à historia do parque seria importante justamente para ressaltar alguns aspectos técnicos, conceituais e legais, a título de contribuição ao debate. Depois para tentar mostrar a importância de que pode estar revestida essa iniciativa da prefeitura de São Paulo. É consenso que o Ibirapuera não é uma unidade de proteção ambiental. Trata-se de um parque urbano de importância municipal, cuja obra mais significativa, geradora mesmo de um tombamento estadual e outro federal, é o conjunto arquitetônico projetado por Oscar Niemeyer e equipe. Mesmo o paisagismo original, de maior interesse, não chegou a ser executado, sendo substituído por outro que não apresentava a mesmo desenho e qualidade. A polêmica já levou o arquiteto Oscar Niemeyer a se manifestar a favor do auditório, não sem justificada impaciência face ao “clima de mediocridade que detesta", ressaltando estes mesmos aspectos: “Será que o Parque Ibirapuera, o centro de artes mais importante da América Latina, merece tanto desprezo? Será que o Estado de São Paulo, o mais rico deste país, não tem condições de construir e vai deixar aquela cúpula que desenhei solta, como coisa inútil e secundária, sem o auditório que com ela compõe a entrada do parque? (...) O que fazer? Talvez mostrar estes dois desenhos que elaborei. Um com a praça inacabada, a marquise incompleta, a cúpula de lado, sem o auditório que a deveria complementar. O outro com o auditório construído, e a arquitetura a se destacar, pela pureza e unidade desejadas” (6).
Infelizmente, Dr. Oscar, o que pode lhe parecer claro, aquilo que didaticamente o senhor tenta ilustrar no jornal com seu croqui, não chega a ser compreendido pela maior parte da população e seus dirigentes. Equilíbrio das formas arquitetônicas, planejamento e embelezamento das cidades, lazer e cultura para a população em espaços democráticos próprios e bem equipados, além de belos, não fazem parte da maioria dos projetos oferecidos a essa cidade tão mal amada que é São Paulo. E quando o são, abortam antes de vingar ou são abandonados indigentemente após o corte do cordão umbilical, digo, da fita de inauguração. Também Dr. Oscar, o senhor que ajudou a construir o IPHAN com Lucio Costa, Rodrigo Melo Franco de Andrade e tantos outros, e que sempre acompanhou os passos desta instituição, sabe a que lugar foram relegadas a maioria das instituições que se ocupam do patrimônio no Brasil, sua conseqüente falta de credibilidade, o que as impossibilita de cumprir aquele que sempre foi o seu papel técnico e legal no arbítrio desse tipo de situação, ou melhor, evitando esse tipo de situação.
À frente da 9ª Superintendência Regional do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, em São Paulo, fomos responsáveis, no ano de 1997, pela abertura de processo de tombamento por parte do órgão federal não do Parque Ibirapuera, mas da obra do arquiteto Oscar Niemeyer no Parque Ibirapuera, inclusive o sempre esquecido e deteriorado edifício que abriga o DETRAN. O parque foi tratado pelo IPHAN como entorno dos bens tombados, sua indissociável ambiência com a qual os edifícios compõem uma unidade indiscutível, e cujo equilíbrio e relação devem ser constantemente acompanhados e analisados face a qualquer proposta de intervenção. Podemos, portanto afirmar com segurança que, tendo em vista a motivação da proteção federal, a construção do auditório é fundamental para resgatar a integridade original do conjunto. Trata-se, é verdade, de “um estado completo que nunca existiu”, nas palavras de Viollet-le-Duc (7). Mas, se o conjunto não chegou a existir concretamente por problemas políticos e financeiros – que acabaram deixando para trás o elemento mais importante da composição, segundo os próprios arquitetos – conta com os projetos de arquitetura originais, com ampla documentação e, o mais importante, conta com o acompanhamento do autor do projeto, garantia da apropriada e desejada finalização e das adaptações que, com certeza, serão necessárias. E, principalmente, estamos tratando aqui da proteção de um patrimônio da arquitetura moderna contemporânea, séculos XX e XXI, situado no seio de uma metrópole, sendo preciso considerar sua especificidade quando se trata de conservação e preservação.
Sempre oportuno ainda é voltar ao instrumento mesmo de proteção definido como tombamento no Brasil, relembrando os termos de discussão da qual participamos há seis anos no próprio IPHAN de São Paulo, sobre sua pertinência ou eficácia para assegurar a proteção de áreas de valor ambiental reconhecido. Historicamente, desde o anteprojeto de Mario de Andrade para o Serviço do Patrimônio no Brasil, elaborado em 1936, a legislação federal e a gestão do patrimônio tratam especialmente da proteção da paisagem ou quadro natural enquanto suporte de atividades humanas de interesse cultural, sobretudo do ponto de vista arqueológico e antropológico. Durante os cerca de 60 primeiros anos de existência do IPHAN, quando ainda havia condições de conduzir a maior parte do trabalho como um processo de produção de conhecimento, discutia-se o arcabouço conceitual que sustenta a legislação de tombamento federal, seu caráter de “preservação plena”, assim como a incompatibilidade de suas determinações com a dinâmica própria às áreas de interesse ambiental.
A maioria dos parques, por exemplo, não pode ser tombada integralmente, já que possuem funções típicas que envolvem setores de proteção integral e setores de implantação de infra-estrutura específica, sendo necessário definir planos de manejo. Não há dúvida de que as áreas naturais podem ser percebidas como fatos culturais, quer pela ação antrópica, quer pela apropriação social. Se os conceitos de bem cultural e bem natural podem se confundir e se fundir no gerenciamento político das áreas protegidas, baseado em conceitos largamente discutidos e em legislação específica, é preciso estar atento para o fato de que limites nebulosos entre cultura e natureza podem implicar em ações políticas conflituosas. Mesmo a estrutura governamental responsável pelas áreas é rigidamente compartimentada. Em nível federal, por exemplo, o IPHAN não é o IBAMA, e o Ministérios da Cultura não é o Ministério do Meio Ambiente. Cada órgão, e respectivo Ministério, possui atribuições técnicas e legais distintas, estruturas regimentais próprias e políticas públicas diferenciadas. O tombamento, instituto jurídico criado para a proteção de bens, de “coisas” como se diz, é inadequado à proteção, por exemplo, da fauna ou da cobertura vegetal na sua dinâmica e mobilidade. A aplicação do Decreto-Lei n° 25 a essas áreas desvirtuaria o instrumento, restringindo sua ação à instância puramente burocrática na gestão de territórios complexos.
Também, como em qualquer outro processo de tombamento, este apenas começa com a homologação da resolução aprovada em Conselho, dependendo essencialmente , para chegar a bons termos, de um trabalho de gerenciamento, de preferência apoiado (mais uma vez....) na dinâmica da produção de conhecimento. Longo, minucioso, e especializado é esse trabalho de gestão. Sem desrespeitar a integridade do texto original de tombamento – baseado na exaustiva instrução do processo e no parecer de um conselheiro relator – aperfeiçoa, na prática, suas determinações, legitimando assim o ato jurídico e administrativo. Não é por outra razão que sempre coube aos órgãos de preservação desenhar as políticas de gestão do patrimônio protegido, que não são definidas – como se poderia erroneamente interpretar – nos textos dos atos de tombamento e nem no corpo das leis, mas na dinâmica de uma prática feita de estudo especializado e discussão. Como exemplo, poderíamos lembrar a polêmica surgida no momento da desocupação da construção que abrigava o Museu do Presépio, localizada sob a marquise do mesmo Parque Ibirapuera, quando se começou a pleiteá-la para a instalação de um anexo do Museu de Arte Moderna. Mesmo reconhecendo a importância do Museu para o parque e para a cidade e sua necessidade de expansão, a prioridade, do ponto de vista do respeito aos direitos culturais da população, era que a marquise recuperasse seu espaço e concepção originais: um elemento de ligação entre os edifícios, uma área livre e coberta. Porém, nos textos dos atos de tombamento, estadual e municipal, não se havia excluído da proteção os elementos chamados de “espúrios”, ou aqueles que não faziam parte do conjunto de interesse ou mesmo prejudicavam sua integridade, portanto eles estavam “legalmente tombados”. O debate que se seguiu, envolvendo argumentação técnica, jurídica e conceitos de preservação, não visava a mudança do texto do tombamento, como se apressam a pedir alguns políticos e oferecer alguns dirigentes, ato que só poderia comprometer ainda mais a legitimidade dos órgãos de preservação e de seus instrumentos legais. A liberação da marquise foi objeto de defesa técnica, e teve o apoio político (diferente de pressão...) do então Secretário do Verde e Meio Ambiente e de várias instituições, podendo se realizar de forma legal e legítima.
Nem sempre fica claro também que o tombamento não legisla sobre o uso. Só existe restrição ao uso se o mesmo representar risco ao bem protegido. Portanto, a tão discutida ocupação das construções do parque por eventos de toda ordem – que deveriam, segundo seu projeto original, privilegiar a cultura – é de responsabilidade do proprietário, ou seja, da prefeitura de São Paulo, a quem cabe zelar, por exemplo, pelo cumprimento de um plano diretor que venha a elaborar, mas que não encontra imposições no texto do tombamento. De qualquer forma espera-se, e mesmo se sugere, que o plano a ser implementado seja elaborado tendo a integridade do bem como perspectiva, que libere completamente a marquise para um cotidiano de atividades culturais e de lazer, restaure funções mais apropriadas para os edifícios hoje ocupados pela PRODAM e pelo DETRAN entre outros, libere mais áreas permeáveis, conduza planos de manejo, discipline o percurso de vias e o comércio dentro do parque.
Então, o vilão dessa história chama-se Ministério Público? Certamente que não. Tem-se observado um processo de desmonte e desrespeito aos órgão de preservação, acelerado sobremaneira nos últimos 10 anos, motivado pela imposição de “urgências” e “exigências” políticas sobre preceitos e critérios técnicos. Processo que gera a aceleração forçada do tempo patrimonial – o tempo do trabalho sério, contínuo e responsável – para poder atender a determinações e prazos políticos imediatistas (quando não oportunistas...), e que se soma ao cada vez mais freqüente desvirtuamento do instrumento do tombamento, tratado como uma espécie de medalha honorífica distribuída segundo critérios políticos. Momento em que o tombamento é despido do seu conteúdo cultural, em que seu estatuto legal é quase “esquecido”, passando a receber um tratamento apenas burocrático. No vácuo produzido por esse processo instaurou-se a crise da área do patrimônio no Brasil bem como das instâncias às quais sempre coube a responsabilidade de gerenciamento e fiscalização. Nesse mesmo vácuo acaba se instalando o Ministério Público para garantir o patrimônio protegido, que é sua atribuição legal.
A área ambiental teve que contar com a atenção do Ministério Público antes da área patrimonial, já que esta última contava com leis próprias em vigor desde 1935 e uma estrutura competente, com autonomia técnica para garanti-las. Nos últimos anos, a Promotoria de Meio Ambiente foi obrigada a se lançar também na garantia do patrimônio cultural. Nem sempre, talvez, tenha sido possível recorrer à melhor orientação técnica e à melhor assessoria mas, sem nenhuma dúvida, transformou-se no último recurso de cidadãos preocupados com sua história e com sua memória. Sabe-se que, uma vez a questão entrando na justiça, não são mais os grupos políticos de pressão que estarão decidindo, mas a argumentação técnica e legal que, espera-se, seja a mais competente. Observe-se que, por exemplo, se essa gestão municipal decidiu pela construção do auditório original no local previsto, outras já decidiram, impropriamente, pela construção de outro auditório em outro local do parque (8), pela ocupação e loteamento da marquise, por projetos que tiveram que contar com a mobilização da sociedade, de alguns políticos, dos órgãos de preservação em toda sua fragilidade (não confundir as diretrizes políticas adotadas para essas instituições com a resistência competente de alguns de seus técnicos), do próprio arquiteto Oscar Niemeyer, e do Ministério Publico, para fazer valer a defesa do patrimônio. Se hoje é levantada a questão da permeabilidade do solo, deve-se ao fato de ela estar presente, segundo foi assinalado, no texto da resolução de tombamento. A Procuradoria do Meio Ambiente certamente não ignora que esse problema é muito mais complexo e maior do que área de projeção do auditório no solo do parque, envolvendo ocupações irregulares de terrenos por toda a cidade: na periferia, pela população de baixa renda, mas também em áreas centrais valorizadas, inclusive tombadas, ocupadas pela população de maior poder aquisitivo, como nos bairros dos Jardins e do Pacaembu.
De novo e sempre: a única saída para este impasse é abrir e aprofundar a discussão técnica e conceitual sobre as características do parque e do seu tombamento, e reafirmar as legítimas competências. Enquanto não se consegue conduzir o debate nessa direção, os políticos vão continuar lançando frases de efeito do tipo: “a população quer o auditório”. Imediatamente um jornal monta pesquisa de opinião e divulga o resultado: “a população não quer o auditório”. Em seguida passa-se um abaixo assinado entre os freqüentadores do parque que conclui: “eles querem o auditório”. Opinião que não é confirmada pelos depoimentos de usuários exibidos na televisão. Sim, o parque é do povo, mas cabe ao público arbitrar sobre uma questão técnica que não domina em toda sua complexidade? Alguém já pensou em agir da mesma maneira quando se trata de desenhar políticas de saúde ou de educação? Perguntar à população sobre o melhor local para construir um hospital ou uma escola?
Espera-se que os representantes dessa mesma população tenham a sabedoria, também na área cultural, de reunir competentes técnicos, gestores, administradores e juristas para tomar as decisões mais acertadas, aquelas que de fato sejam de interesse dos seus ocupados cidadãos, presos no cotidiano dessa cidade de muito trabalho e pouca contemplação e lazer. Uma cidade diferente, talvez, daquela que se idealizava e projetava para nós, paulistanos, nos otimistas anos cinqüenta do século passado, quando se foi capaz de sonhar um parque tão bonito como o Ibirapuera e entregá-lo à população embrulhado em papel de presente raro entre os eventos político-culturais de hoje: o caráter duradouro, a permanência no tempo e no espaço.
notas
1
SANTOS, Cecilia Rodrigues; PEREIRA, Margareth Silva; PEREIRA, Romão; CALDEIRA, Vasco. Le Corbusier e o Brasil. São Paulo, Tessela/Projeto, 1987.
2
SEGAWA, Hugo. “Ibirapuera: o varzeano que virou centro” in Fantasia Brasileira – o balé do IV Centenário. São Paulo, SESC, 1998.
3
Idem, ibidem, grifos nossos.
4
MAGALHÃES, Thelio de. Ministério Público entra com ação para barrar auditório no Ibirapuera. Jornal O Estado de São Paulo, p. C4, 26 jun. 2003.
5
MUG, Mauro. Promotor vai entrar com ação contra auditório. Jornal O Estado de São Paulo, p. C4, 19 jun. 2003.
6
NIEMEYER, Oscar. O auditório do Ibirapuera. Jornal Folha de São Paulo, Coluna Tendências/Debates, 23 jun. 2003, grifo nosso.
7
Sobre a teoria de Viollet-le-Duc, em português, ver: "Restauração - Eugène Emmanuel Vilollet-le-Duc", Apresentação e tradução: Beatriz Mugayar Kuhl, Artes & Oficios, São Paulo, 2000.
8
FOLHA DE SÃO PAULO. Urbanismo. 02 jul. 2003.
sobre o autor
Cecília Rodrigues dos Santos é arquiteta, doutoranda, professora da Faculdade de Arquitetura na Universidade Presbiteriana Mackenzie e consultora para a área de patrimônio cultural, crítica de arquitetura e co-autora de "Le Corbusier e o Brasil".