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architexts ISSN 1809-6298


abstracts

português
O artigo de Patrícia Martins propõe uma atualização da idéia da villa através da análise do desenvolvimento da relação entre arquitetura e paisagem expressos na forma arquitetônica, ao comparar três projetos de villas de épocas diferentes

english
This Patrícia Martins's article proposes an actualization of the idea of "villa" through the analysis of the development of the relation between architecture and landscape comparing three different projects of "villas" from different periods

español
El articulo de Patricia Martins propone una actualización de la Idea de "villa" a través del análisis del desarrollo de la relación entre arquitectura y paisaje expresos en la forma arquitectónica, al comparar tres proyectos de "villas" de épocas distinta


how to quote

MARTINS, Patrícia. A Villa, reloaded. Arquitextos, São Paulo, ano 10, n. 109.02, Vitruvius, jun. 2009 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/10.109/45>.

Três casas, isoladas em paisagens especialmente interessantes, projetadas para o convívio de três famílias: A Villa Rotonda de Palladio em Vicenza, Itália (1550), a Casa Y2K de Koolhaas perto de Rotterdam (1998) e a Casa Poli de Pezo von Ellrichshausen na Península de Coliumo, no Chile (2005).

Todas as três casas estão estruturadas em função da importância do espaço de convívio, sempre central e articulador dos ambientes secundários. Todas as três, cada uma em sua época e contexto específico, expressam a mesma vontade do homem de conversar com a paisagem de maneira harmoniosa e colocam a mesma questão: É a construção centralizada que forma o remate da colina ou, pelo contrário, é a colina que se ergue, através do edifício?(1)

Na Villa Rotonda, a regularidade da forma atesta a base clássica do maneirismo de Palladio na passagem do renascimento para o barroco. A planta quadrada é perfeita para dar importância à sala principal, localizada em seu centro. As escadarias externas, relativamente grandes, uma em cada um dos quatro lados – pois em cada um deles "se desfruta de um belíssimo panorama" (2) – obedecem à lógica formal e elevam ainda mais a casa na paisagem. A sala central é o único ambiente a ter pé-direito duplo, coroado por uma cúpula. Escondidas em nichos resultantes da inserção da forma redonda na quadrada, pequenas escadas exploram a verticalidade do ambiente, adicionando uma dimensão a mais ao espaço e ao uso. Segundo Argan, a luz para a arquitetura de Palladio e especialmente para a villa em questão, é ao mesmo tempo ferramenta – ao criar o jogo de claro-escuro resultado de seu processo de justaposição de elementos e objetivo – para a negação do espaço como profundidade. A busca por uma "frontalidade absoluta" se dá através da busca pelo "(...) branco puro, realização cromática absoluta da máxima intensidade da luz, transformação completa da funcionalidade arquitetônica em efeito pictórico." A inserção da obra na paisagem é então aquela que permite ao edifício viver na luz e para a luz, em fusão com a paisagem ao redor que deixa de ser moldura idílica tornando-se condição artística (3). Pevsner ressalta a importância das colunatas e das alas baixas que formam o elo entre a villa e a área ao seu redor: "pela primeira vez na história da arquitetura ocidental a paisagem e o edifício foram concebidos como pertencentes um ao outro, dependentes um do outro. Aqui, pela primeira vez, os eixos principais de uma casa continuam pela natureza adentro; ou, inversamente, um espectador situado do lado de fora vê a casa estendendo-se como se fosse um quadro, fechando a perspectiva" (4).

A casa Y2K foi desenvolvida para uma família holandesa em 1998. O terreno foi adquirido em etapas: primeiro o jardim, depois o miolo e depois mais um pedaço de terra garantiram aproximadamente 1 km de extensão e a certeza da vista. Três exigências foram feitas para o projeto: que toda a bagunça pudesse ser escondida, que todos os membros da família pudessem ter seus espaços particulares com a possibilidade de convivência assegurada por um grande espaço social, e que tudo fosse feito antes do ano 2000 por cauda do medo do proprietário da ameaça de colapso informacional gerada pelo bug do milênio, daí o nome da casa (5). No projeto de Koolhaas, o espaço social é resultado da extrusão de um prisma no centro do volume da casa, gerando um túnel a garantir a desejada vista da paisagem, completamente desobstruída nos dois sentidos. Os outros ambientes da casa, como as escadinhas da Rotonda, foram aglomerados em volta deste vazio central em volumes escondidos, para desaparecerem – é como a faxina apressada que joga tudo para dentro do armário embutido e deixa o quarto 'arrumado'. A forma da casa é a resultante do envelopamento dos ambientes secundários ao redor do tunel. Comparar as plantas da Vila Rotonda e da Casa Y2K é como ver Neo, suado e vestido em túnicas encardidas fechar os olhos em Zion e acordar reluzente em seu costume preto e capa comprida na Matrix (6): a essência do espaço arquitetônico que privilegia a área de convívio permanece a mesma mas a forma, transfigurada por operações complexas, torna-se distorcida, disforme. Assim como as funções humanas, do corpo de Neo se transformam em super poderes na Matrix, é como se os espaços anexos da sala circular central da Vila Rotonda – incluindo as escadinhas – fossem também potencializadas, se deformando em sua relação multidimensional com o espaço central, libertando-o para o contato direto com a paisagem, distorcendo seu volume: a Y2K – a super casa – é como um still de Neo na Matrix, de contornos embaçados pelo movimento do super-homem voando em um salto mortal. Uma das sugestões de Koolhaas era que o volume resultado do envelopamento dos vários ambientes da casa fosse feito com concreto transparente (uma delicada membrana a cobrir os órgãos do organismo/casa) e que o volume como um todo pudesse ser girado pelos moradores de forma a direcionar o grande espaço de convivência (7) – o grande vazio da casa de fato – de acordo com os humores e com a paisagem desejada ao longo do dia. Esse conjunto formado pela transparência do grande vazio enquadrando a paisagem e da transparência translúcida formada pelo volume da casa, embaçado pela ausência de contornos definidos, em movimento, resultaria provavelmente em uma aparição, como uma falha da Matrix no horizonte, quando se tem que esfregar os olhos e apurar a visão para se ter certeza do que se está vendo.

Como profundo conhecedor dos processos metropolitanos de construção, demolição, reciclagem, apropriação, desapropriação, remodelagem, Koolhaas usou o projeto não construído da Casa Y2K para o concurso da Casa da Música do Porto, em Portugal. Assumindo o cinismo (8), inspirado pela criatividade, inteligência e hiper-eficiência do povo africano face à escassez de recursos observada em uma viagem à Nigéria (9) Koolhaas, em uma operação complexa, alterou a função e a escala dos espaços, mudou da dimensão doméstica para a pública e ganhou o concurso. A construção foi terminada em 2005. Mais do que provar que a forma não segue a função, Koolhaas dá uma nova dimensão à idéia de Aldo Rossi de que a arquitetura deve permanecer através de sua forma, por mais que sua função mude. Embora a preocupação de Rossi fosse preservar a relação do edifício e seu entorno na cidade histórica visando à manutenção da qualidade urbana, Koolhaas, ao exigir o desempenho máximo da forma ao se adaptar a dois programas tão diferentes vai além da conhecida relação de representação entre forma e função e acaba por criar, como consequência, um 'acontecimento arquitetônico' que irá reconfigurar o entorno quase sempre inexpressivo das metrópoles contemporâneas visando, também, a qualidade urbana.

A Casa Poli dos jovens arquitetos chilenos Mauricio Pezo e Sofia von Ellrichshausen também nasceu da vontade de conquistar a paisagem. Juntamente com um casal de artistas, amigos mais velhos e mentores, o casal de arquitetos comprou dois terrenos, um ao lado do outro, mas decidiram construir uma casa só. O combinado foi que a casa seria usada pelos dois casais e fora das temporadas fosse usada como centro cultural, oferecendo espaços de reunião, trabalho e galeria de arte (10). Com sua forma e sua cor 'de pedra', é a casa que mais deseja ser o remate da colina, se misturar à paisagem. Apesar de seu aspecto monolítico, quando observada mais atentamente, revela certa transparência através de suas grandes aberturas que ora refletem a paisagem, ora permitem que a vejamos através delas. Propositalmente pensadas de modo a não informar a sua escala e a não suavizar a dureza do volume através de suas aberturas (11), construída com concreto artesanal e fôrmas sem tratamento algum, o edifício propõe uma convivência pacífica através de uma relação de igualdade e harmonia com a natureza. Segundo os autores, por se prestar a um programa íntimo e a um programa público ao mesmo tempo, a casa apresenta uma vocação contraditória ao compreender as dimensões pública e doméstica. Para isso, os ambientes não foram nomeados de acordo com suas funções para que permanecessem “meras salas, mais ou menos interconectadas, liberadas para múltiplas atividades” (12). Mesmo consideradas as diferenças que envolvem os dois projetos, pode-se traçar um paralelo com a Villa Rotonda e a ambigüidade gerada pela indefinição das funções de seus espaços. Na Casa Poli, as salas destinadas às atividades secundárias que na Rotonda competem com o salão principal e que na Y2K foram escondidas em volta do vazio central foram definitivamente empurradas e espremidas dentro da grossura das paredes, como as pequenas escadas da villa italiana. A sala central, agora sim, está livre para reinar espacialmente: as janelinhas com fundo escuro da sala palladiana ganharam o azul do céu e do mar. Permanece a vontade de 'esconder a bagunça dentro do armário' da casa Y2K quando os serviços todos são literalmente escondidos dentro das paredes, facilitando funcionalmente e formalmente a relação interior/exterior através da visão da paisagem. Com uma diferença fundamental: ao manter a forma forte do cubo a arquitetura se faz mais presente na vida do usuário ao estar a toda hora intermediando suas atividades, sua vista da paisagem. (As aberturas do espaço central não coincidem exatamente com as janelas do volume, de forma que o olhar de dentro para fora é sempre garantido, mas quase sempre intermediado pelos ambientes localizados 'dentro' da parede.) A casa Y2K, apesar de formalmente mais ousada, busca a total funcionalidade ao não intermediar através da forma o uso de seus espaços: a relação interior/exterior é total, absolutamente livre, assim como seus espaços íntimos, totalmente enclausurados e isolados em sua falta de relação formal entre um e outro.

Tendo como objetivo a valorização do espaço de convivência, essas três residências são exemplos do desenvolvimento da relação entre a forma e a função na arquitetura: da representação pura da Villa Rotonda à operacionalidade (13) que possibilita o desempenho máximo da forma em sua relação com a função: ora desafiando a natureza da forma como na Casa Y2K, ora desafiando a natureza das relações funcionais como na Casa Poli. Nos dois casos quem ganha é o usuário ao ter suas necessidades atendidas de forma cada vez mais fiel e surpreendente e também a arquitetura propriamente dita, pela crescente riqueza, sem precedentes, das estratégias projetuais contemporâneas.

notas

1
“Nenhuma das outras villas construídas por Palladio granjeou, de tal modo, a admiração dos contemporâneos e das gerações seguintes, como a Villa Rotonda. Situada a sudoeste de Vicenza, na região das colinas do monte Berico, parece brotar na paisagem: as fachadas, ornadas com pórticos simétricos nos quatro lados, acompanham a subida da encosta, através de lanços de escadas, a cúpula central deve ser entendida como uma sobrelevação do cume da colina. É a construção centralizada que forma o remate da colina ou, pelo contrário, é a colina que se ergue, através do edifício?” WUNDRAM, PAPE, MARTON: Palladio. Alemanha: Taschen, 1994. p. 186.

2
PALLADIO, Andrea. Quattro Libri dell' Architettura. citado em WUNDRAM, PAPE, MARTON: Palladio. Alemanha: Taschen, 1994, p. 186.

3
PEVSNER, Nikolaus. Panorama da arquitetura ocidental. São Paulo:Martins Fontes, 1982, p. 208.

4
ARGAN, Giulio Carlo. Clássico anticlássico. São Paulo: Cia das Letras, 1999, p. 401-406.

5
KOOLHAAS, Rem. House Y2K. <www.oma.eu/index.php?option=com_projects&view=project&id=583&Itemid=10>. Consultado em 16/7/2008.

6
The Matrix
é uma produção cinematográfica norteamericana e australiana de 1999, dos gêneros ação e ficção científica, realizado pelos irmãos Wachowski e protagonizado por Keanu Reeves no papel de Neo.

7
KOOLHAAS, Rem. Op. cit.

8
“O escritório ficou chocado com o cinismo. Havia a desconfiança de que o que tinha sido feito sob medida para uma condição muito específica pudesse de repente ser usado para um propósito completamente diferente“. KOOLHAAS, Rem. “Copy and Paste”. In Content Magazine. Köln: Taschen, 2004, p. 302. Tradução da autora.

9
KOOLHAAS, Rem. Op. cit., p. 302.

10
ELLRICHSHAUSEN, Pezo Von. Casa Poli. www.plataformaarquitectura.cl/2007/01/05/casa-poli-pezo-von-ellrichshausen/. Consultada em 17/07/2008.

11
Idem, ibidem.

12
Idem, ibidem.

13
Sobre o conceito de operacionalidade da forma em oposição à codificação linguística ver ZAERA, A.: "Notes for a Topographic Survey". El Croquis OMA/Rem Koolhaas 1987-1993. Madrid: El Croquis Editorial, 1994.

sobre o autor

Patrícia Martins, arquiteta pela FAU PUC-Campinas, mestre em história e teoria da arquitetura pela Architectural Association, Londres (1995), doutoranda em arquitetura pela FEC Unicamp. Sócia do escritório ultradesign arquitetura contemporânea desde 1996, premiada em vários concursos nacionais.

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