Introdução
Os empreendimentos conhecidos como condomínios fechados, existentes hoje nas principais Regiões Metropolitanas no Brasil, resultaram originalmente de grandes loteamentos fechados (como é o caso de Alphaville, lançado em Barueri, São Paulo, nos anos 1970), localizados em grandes glebas vazias na periferia metropolitana e destinados exclusivamente às classes altas. Estão historicamente associados a grandes áreas, com unidades residenciais de alto padrão (com pelo menos três dormitórios e dois banheiros), vastas porções de áreas livres e de lazer de uso coletivo.
Ao longo das últimas duas décadas, esse quadro mudou e, hoje, os condomínios fechados possuem características distintas como dimensão da gleba, localização, tamanho das unidades residenciais, presença de serviços e áreas coletivas, etc. Antes destinados à moradia da classe alta e localizados em grandes áreas de zonas periféricas, atualmente os condomínios fechados atendem a outros segmentos sociais e apresentam características bastante distintas: a preocupação fundamental com conforto foi suplantada pela necessidade de segurança e status (1).
Em sua pesquisa “Os Condomínios Horizontais e Loteamentos Fechados do Município de Eusébio, município da Região Metropolitana de Fortaleza”, Silveira (2) agrupou estes empreendimentos em duas categorias: loteamentos fechados e condomínios horizontais. Loteamentos fechados consistem numa modalidade de parcelamento regida de acordo com os ditames da legislação municipal, em que terras públicas são incorporadas pelo empreendimento. Quanto aos condomínios horizontais, a terra é de propriedade dos condôminos e não há necessidade de doação de terras, pois estes são implantados em loteamentos previamente aprovados.
Condomínios horizontais têm por limite a área da quadra urbana, e apresentam áreas bem menores quando comparados aos loteamentos fechados: as áreas variam entre 3.000 a 20.000m², embora a maioria se concentre no intervalo entre 5.000 a 10.000m². A área construída da unidade residencial compreende entre 90 a 350m², garantindo diversidade de tipologias de acordo com o poder aquisitivo e tamanho das famílias (3).
Caldeira (4), Villaça (5) e Reis (6) observam que da mesma forma que os loteamentos fechados, os condomínios horizontais promovem segregação espacial, uma vez que o entorno destes equipamentos é negligenciado, não integrando ações projetuais públicas ou privadas, e desprovido de espaços ou áreas de lazer públicas. Assim, o espaço público residual se transforma apenas nas ruas que dão acesso a estes equipamentos, cujo ambiente construído e a paisagem se definem por muros, cercas elétricas e guaritas de segurança para intimidar a aproximação do alheio ou estranho.
A proliferação desses novos modos de morar tem influenciado a configuração urbana de toda a região metropolitana, especialmente no que diz respeito à segregação espacial.
Transformação urbana e condomínios
Nas cidades de início do século XX a divisão da terra e usos do espaço urbano apresentavam padrões reconhecíveis e a segmentação espacial era pouco expressiva (7). O parcelamento do solo se estruturava basicamente pela divisão entre espaços públicos e privados, definindo-se por espaços de uso coletivo (praças, estações ferroviárias, os teatros ou as lojas, os locais de trabalho e as escolas), admitindo formas de gestão simples, com residências unifamiliares consistindo no espaço de uso privativo usual.
Ao longo da segunda metade do século XX a equação se modificou. Padrões residenciais diversificados e novas formas de organização empresarial, de comércio, lazer e serviços produziram maior adensamento e uma ordem complexa de ocupação e uso do solo. A oferta crescente de infraestrutura e serviços exigiu de empreendedores formas coletivas de organização institucional, e entre elas, as de caráter condominial.
Modalidades complexas de organização condominial incidem na intensificação de usos, e o tecido urbano tende a se transformar com a disseminação de formas condominiais, muitas delas isoladas entre si. Alguns autores (8) conferem especial destaque aos problemas decorrentes, especialmente à relação de implantações condominiais com os espaços públicos. Com frequência, tornam-se tênues as diferenças entre espaços públicos e privados de uso coletivo (9) destacando-se como consequência que o fenômeno, tal como vem se observando em vários países é acompanhado da obsessão pelo perigo urbano e insegurança, justificando a segregação.
Na primeira metade do século XX, o Movimento Moderno propôs a solução da questão habitacional de interesse social com a construção de conjuntos residenciais verticalizados, dispostos de forma a propiciar uso coletivo nos térreos e áreas comuns (10). No Brasil a adoção do ideário e da arquitetura moderna se revela na Esplanada do Castelo, no Rio de Janeiro, ao se retomar proposta fazendo menção à Grécia antiga: o passeio coberto, com edifícios de escritórios avançando em passeios públicos, protegendo pedestres e estabelecendo um precedente importante, a via pública que se desenvolve sob edifícios particulares. Nos fundos das quadras, antigos "quintais" coloniais foram sendo destinados ao estacionamento de veículos e acesso de serviços (11).
Entre 1957 e 1960 a Novacap em Brasília foram vendidos aos incorporadores apenas projeções dos prédios que deveriam ser construídos, para os quais se exigiu a manutenção de térreos abertos à passagem pública, mantendo-se também os acessos privativos isolados. Outra forma de espaços de uso coletivo desenvolvida durante a segunda metade do século XX e que se mantém no século XXI é a dos edifícios residenciais e de escritórios, originados na arquitetura em São Paulo, dotados de equipamentos para usos múltiplos existentes no térreo (12).
A organização condominial nasceu com a finalidade de organização de atividades de caráter coletivo, como a prática de esportes e cultura física, atividades de lazer, manutenção de jardins e parques, salões de festas, churrasqueiras etc. Edifícios de apartamentos são por vezes também providos de alguns serviços de caráter privativo com essas características, como piscinas, saunas, salas de cultura física etc. (13). O sistema condominial de gestão coletiva se desenvolveu como solução de problemas com base em seus antecedentes históricos, com intensiva aplicação no setor imobiliário (14).
A disseminação desses novos modos de morar tem influenciado a configuração urbana nas regiões metropolitanas, especialmente no que diz respeito à segregação espacial. Segundo Villaça (15), uma das características mais marcantes da metrópole brasileira hoje é a segregação espacial dos bairros residenciais das distintas classes sociais, criando-se espaços socialmente estratificados. Caracterizam um processo segundo o qual diferentes classes ou camadas sociais tendem a ocupar diferentes regiões ou bairros da metrópole.
Caldeira (16) assinala que o padrão centro rico versus periferia pobre (paradigma entre os anos de 1940 e 80) está sendo suplantado por outro modelo, de natureza fractal. Este padrão vem gerando mudanças de ocupação do solo e de forma urbana com base no desdobramento da segregação residencial, com impactos tanto em escala metropolitana como na microescala intraurbana. Locais onde grupos sociais distintos estão fisicamente próximos, porém separados por muros e sistemas de segurança, e tendem a não circular ou interagir em áreas comuns. Chamam-se ‘enclaves fortificados’ a estes instrumentos de segregação espacial, tratando-se de espaços privatizados, fechados e monitorados para residência, consumo, lazer e trabalho, sendo sua principal justificação o medo da violência urbana. A tradicional esfera pública das ruas é abandonada por usuários atraídos por esses espaços, ao mesmo tempo em que é relegada às classes menos favorecidas.
Podem ser identificados três momentos e expressões da segregação espacial urbana durante o século XX (17). O primeiro tipo compreendeu o período entre o final do século XIX e os anos 1940, quando a cidade era concentrada numa pequena mancha urbana, aonde a segregação se resumia à dispersão de alguns tipos de moradia.
Dos anos 1940 até o final dos anos 1980, o modelo centro-periferia, ou centro rico versus periferia pobre, representou a segunda forma de expressão de segregação espacial metropolitana, quando as classes altas e médias se concentraram nos bairros mais centrais, providos de maior infraestrutura urbana, e as classes baixas foram expulsas para áreas periféricas precárias e distantes. O terceiro modelo vem surgindo nos últimos quinze anos e representa a superação do antigo modelo centro-periferia (18).
Villaça (19) observa que um padrão de distribuição territorial das camadas de mais alta renda pode ser identificado nas principais capitais brasileiras. Menciona como exemplo o Rio de Janeiro, em que os bairros mais ricos se fixaram de início na Glória, seguindo para Flamengo-Catete, Botafogo, Copacabana, Leblon, Ipanema, São Conrado, Barra, etc. Em São Paulo, pode-se observar um movimento das camadas de mais alta renda partindo dos Campos Elíseos, Higienópolis e Vila Buarque, passando a Avenida Paulista, ao Jardim América, Morumbi, Jardim Leonor, Granja Viana, Alphaville, etc. Em Belo Horizonte, estes estratos se disseminaram em direção sul; em Porto Alegre, seguiram a direção da Rua da Praia, depois aos bairros Menino de Deus, Independência e Moinhos de Vento. Em Fortaleza,o fenômeno não foi diferente. Conforme lembra Castro,
“A expansão da cidade passava a conhecer novas diretrizes, não apenas no simples alastramento do casario, mas começava a evidenciar uma organização social fortemente diferenciada, com o aparecimento dos bairros dos ricos, dos remediados, dos pobres e dos muito pobres, iniciando-se um processo de segregação hoje tão marcado” (20)
A preferência por áreas consideradas mais aprazíveis também se confirmou em Fortaleza (21) tal como em outras metrópoles. Já nas primeiras décadas do século XX, a burguesia cearense que antes ocupava o centro tradicional, começou residir no local que melhor combinava qualidades do sítio natural e proximidade ao centro. O bairro de Aldeota revelou-se a melhor opção de moradia e sua ocupação se verificou principalmente ao longo da linha de bondes, na atual Avenida Santos Dumont, principal eixo e vetor de expansão do bairro. A Aldeota cresceu, e já no ano de 1984 não houve registro de aprovação de projetos de residências unifamiliares dentro dos limites do bairro.
Com a aprovação da Lei 5.122-A (1979), regulamentando o Plano Diretor Físico de Fortaleza que transformou as zonas residenciais referentes à Aldeota e arredores, essas zonas passaram de R-1 e R-2 para R-3 (zona residencial uni e multifamiliar, de alta densidade demográfica), cujo gabarito máximo era de 48,00 metros. Iniciou-se intenso processo de verticalização do bairro, e atualmente praticamente são construídos somente edifícios com gabarito máximo de 22 pavimentos, permitido pelo Plano Diretor (1992), proposto como tentativa de minimizar o custo do terreno e maximizar a ocupação (22).
Com a abertura da Avenida Beira Mar, em 1963, as elites passaram também a ocupar o bairro do Meireles, situado entre a Aldeota e a orla. Tem sido prática frequente a construção de condomínios fechados em lotes cujos antigos proprietários permutam sua residência unifamiliar por unidades de apartamentos, viabilizando assim o grande volume de novas obras presente no bairro (23).
Devido à limitação da oferta de terrenos de frente para o mar ou próximos deste, a consequente elevação do preço dos lotes na Praia do Meireles e Avenida Beira Mar, nos anos de 1970, fez com que alguns especuladores começassem a investir na Praia do Futuro. Devido à alta salinidade da área, o que não atraiu os habitantes para o bairro, estes investimentos fracassaram. Antigos ocupantes do bairro da Aldeota passaram a procurar locais mais tranquilos para habitação. Iniciou-se assim a ocupação dos bairros do Cocó, Dunas, Papicu e Edson Queiroz, na zona sudeste da cidade, onde havia grande quantidade de terrenos disponíveis (24).
A partir da década de 1980, o poder público, juntamente com a iniciativa privada, começou a dirigir o crescimento da cidade em direção desses bairros, implantando infraestrutura e serviços, construindo grandes obras e equipamentos públicos e abrindo grandes vias como a Av. Washington Soares. Assim, seguindo a tendência do surgimento de áreas voltadas às camadas de alta renda, tem-se observado nos últimos anos a formação de nova centralidade nesta região de Fortaleza (25).
Enquanto isso, na Aldeota, construções novas substituíram imóveis existentes devido à carência de terrenos. Neste novo centro, foram construídos grandes equipamentos ocupando terrenos livres às margens da avenida, com amplas áreas de estacionamento. Esses equipamentos, tais como Universidades, Centro de Convenções, Shoppings, Fórum, escolas, grandes lojas, etc. já não poderiam ser edificados na Aldeota, devido ao grande porte (26).
A Prefeitura Municipal de Fortaleza interviu de forma objetiva, ainda que em épocas diversificadas, para a incorporação ao tecido urbano da Água Fria, localizada no início da Av. Washington Soares (27). Para tanto, autorizou a instalação do Centro de Convenções, da Imprensa Oficial do Ceará (IOCE), da Academia de Polícia Militar do Ceará, do Centro Administrativo do Estado do Ceará, bem como incluiu a transferência do Palácio do Governo Estadual, do Fórum Clóvis Beviláqua, da duplicação da Avenida Washington Soares e do Centro de Feiras e Eventos.
O processo de ocupação desta área da cidade foi intensificado em meados dos anos noventa, quando grande parte da população da Aldeota, tradicional reduto das classes mais abastadas, "transferiu-se para o novo bairro da Água Fria, em busca de espaço diferenciado e mais reservado, com avenidas mais amplas e espaços verdes" (28). Segundo Lopes (29) nos últimos vinte anos a região da Água Fria consolidou- se como o reduto da classe média que procura por espaços generosos e mais baratos.
A implantação desses equipamentos acompanhada da expansão das redes de energia, água e esgoto, abertura de novas vias valorizaram os terrenos e atraíram equipamentos e atividades terciárias (bancos, escolas, universidades, instituições públicas, shopping centers). A duplicação e ampliação da Avenida Washington Soares criou um eixo de valorização que se inicia em Fortaleza e se estende pelos municípios de Eusébio e Aquiraz, na Região Metropolitana (30).
A partir dos anos de 1990, ao longo da Avenida Washington Soares foram construídos pequenos condomínios horizontais que têm de 20 a 30 casas em média, e oferecem aos moradores equipamentos de lazer e dispositivos de segurança. As casas têm cerca de 130 m2, dispõem de três dormitórios (podendo ter de uma até três suítes), e custam em torno de R$ 300 mil reais (31).
Dentre as vantagens apontadas pelos agentes imobiliários está o menor preço do metro quadrado; contudo, André Montenegro, vice-presidente do SINDUSCON/CE (Sindicato da Construção Civil do Ceará), assinala que o boom imobiliário que se iniciou em meados dos anos de 1990 já apresenta sinais de esgotamento, devido à escassez de terrenos a preço acessível na capital que disponham de área suficiente para condomínios horizontais, sendo este o principal motivo da busca por terrenos em outros municípios metropolitanos. Conforme pontua Lopes (32), o aparente esgotamento da expansão de condomínios não pode ser explicado apenas pela escassez de terrenos em Fortaleza, mas pela possibilidade de obter maior lucratividade em outros municípios.
O bairro Sapiranga-Coité, também conhecido como Parque Água Fria é uma região periférica em Fortaleza. Sua ocupação é recente, apresentando significativa quantidade de terrenos vazios. Na última década, o crescimento da cidade seguindo o vetor do bairro acelerou seu processo de ocupação, marcado por assentamentos precários e condomínios fechados (33).
Pesquisas urbanísticas sobre o Bairro da Sapiranga registraram problemas, tais como irregularidade fundiária, ocupações irregulares de alta densidade em áreas públicas; especulação imobiliária por meio da implantação de equipamentos públicos e investimentos no setor viário e de transportes, e consequente valorização dos terrenos (34). Assiste-se ainda naquele bairro a má distribuição de renda, ausência de centralidade local e a um processo em curso, a que se pode denominar fragmentação ambiental, uma vez que a ocupação imobiliária desconsidera o relevo e a hidrografia naturais.
Observa-se a fragmentação em termos sócio-espaciais, expressa pela significativa presença de classes sociais diversas, sem garantia de contrapartida de convívio entre elas. A fragmentação espacial pode ser caracterizada como se segue:
[...] “ ‘fragmentação do tecido sociopolítico-espacial’ não é apenas uma forma nova de se designar o aumento de disparidades sociais, nem mesmo um jeito novo de se referir ao agravamento da segregação residencial; ela é uma expressão que designa um processo que abrange tanto a formação de enclaves territoriais ilegais, controlados por grupos de criminosos, até o ‘auto-enclausuramento’ de uma parte crescente da classe média e das elites” (35)
A seguinte ilustração apresenta o mapa de Fortaleza e seus vetores de expansão urbana a partir do centro. O bairro de Sapiranga aparece em destaque junto ao vetor 4, o mais recente, para onde têm se deslocado as classes mais altas ao longo dos últimos vinte anos.
Até dezembro de 2012 se contavam 69 condomínios fechados no bairro da Sapiranga, empreendimentos imobiliários de portes distintos. Na figura 2, apresenta-se o mapa da Sapiranga com os condomínios maiores em destaque, definidos como os que ocupam a quadra inteira e os que ocupam meia quadra, englobando duas esquinas. Os demais condomínios se caracterizam pela ocupação de poucos lotes apenas, em uma esquina ou entre duas esquinas, e pouco se diferenciam de casas tradicionais.
Um exemplo de condomínio que ocupa quadra inteira é o denominado Jardins de Fátima 2, construído pela Construtora Nossa Senhora de Fátima em 2003, podendo-se observar uma vista aérea desse empreendimento na Figura 3. Observa-se que das quatro ruas que delimitam a quadra apenas uma não está ocupada por favelas, ou seja, apenas a via que dá acesso ao condomínio está desimpedida.
O acesso dos automóveis ao condomínio é feito por dois portões, controlados por uma guarita que controla ainda o acesso pedestre. Para comportar as 36 casas deste empreendimento a quadra original foi subdividida em três pequenas e longas quadras separadas por duas vias internas paralelas, longitudinais ao terreno. A inexistência de uma rua de ligação entre as vias criadas, que poderia eliminar um dos portões pode ser explicada pela intenção de alcançar máximo aproveitamento do terreno e potencializar a oferta de serviços e equipamentos no condomínio. Assim, o terreno poupado deu lugar à construção do salão de festas. Um playground e campo gramado também foram dispostos nas proximidades da guarita, sendo notável a ausência de vagas de estacionamento para visitantes.
As quadras, por sua vez receberam novo parcelamento, conforme é possível constatar no projeto arquitetônico. As casas têm a mesma tipologia e orientação. Apresentam dois pavimentos, um térreo e outro superior, e suas áreas sociais estão voltadas para o nascente; da mesma forma, as áreas de serviço e cozinhas se voltam para o poente. Decorre que as unidades localizadas na quadra situada no extremo leste têm acesso pela área de serviço; as casas da quadra do meio possuem dois acessos: um deles ao leste, para pedestres, levando a casa pelo jardim, e o outro para veículos, que possibilita acesso a casa pela área de serviço. As unidades da quadra mais a oeste tem acesso unificado para carros e pedestres e um recuo frontal serve para estacionamento.
Para comportar equipamentos de uso comum o número de casas foi reduzido para incluir a guarita de controle de acesso ao condomínio, bem como um salão de festas, uma piscina, abrigo para churrasqueira, playground e um campo gramado.
Em visita ao empreendimento puderam ser observados aspectos internos das áreas comuns do condomínio, como repetição de fachadas, atenuada pela composição dos jardins, mas acentuada por outros elementos, tais como o enfileiramento dos automóveis, dos bancos e dos jarros alinhados com a rua, reforçando a geometria rígida da implantação do empreendimento (ver Figuras 3 e 4). Apesar de a visita ter ocorrido em período de férias não se constatou qualquer uso dos equipamentos de lazer comunitários (piscina, campo gramado e sinucas), como ilustra a Figura 5.
Outro empreendimento que cabe como exemplo é o denominado Maison Blanc, realizado pela construtora PLACIC e entregue em 2012. Possui curiosa implantação em forma de T em relação à quadra, uma vez que alguns lotes da mesma já estavam ocupados. Na figura 7, a seguir, pode-se ver a implantação numa foto aérea de 2009, quando ainda se encontrava em obras. Os terrenos desocupados vistos na figura 7 ainda se encontram assim em janeiro de 2013.
No entorno do condomínio ainda existem lotes desocupados e chama a atenção a precariedade dos elementos de urbanização, como pavimentação do leito carroçável, meio-fio, ausência de calçadas para pedestres e o fechamento de lotes, que em muitos casos sequer foram cercados. A quadra onde está situado o condomínio possui meio-fio, calçada e fechamento, mas a qualidade dos acabamentos difere conforme se contorna e observa uma via e outra. Na via por onde se dá o acesso ao condomínio se observa um tratamento diferenciado: pedra portuguesa com paginação, ajardinamento usando palmeiras e muro ornamentado. Nas demais faces de entorno prevalecem o passeio cimentado e o muro branco com cerca eletrificada, sugerindo um melhor tratamento de uma das faces a exemplo de cuidado meramente formal. No exemplo das figuras a seguir, de números 8 e 9, em fotos de 26 de janeiro de 2013, observam-se aspectos externos do condomínio, como a presença de árvores ao longo do passeio, mas a regra é a inexistência de arborização.
O terreno foi subdividido em três pequenas quadras separadas por duas vias internas, formando um T; essas vias dão acesso aos 26 lotes criados, bem como aos equipamentos de uso comum. Todas as 26 casas têm dois pavimentos, térreo e pavimento superior, quatro estão voltadas para o norte, quatro para o sul, seis para oeste e 12 se voltam para leste. De acordo com o projeto arquitetônico as casas são diferenciadas dependendo da orientação. Na figura 10 observa-se a implantação do condomínio no terreno com suas ruas e lotes internos. Neste projeto as áreas de uso comum estão próximas à guarita, onde também se encontram vagas para carros de visitantes.
O aspecto interno é sugerido através de perspectivas eletrônicas do material publicitário do empreendimento (figura 11).
Considerações Finais
Os dois empreendimentos analisados se caracterizam pelo fato de se encontrarem no bairro de Sapiranga, na zona de expansão sudeste de Fortaleza, onde se observa a inexistência de serviço de esgotamento sanitário, bem como um precário sistema de transporte coletivo, e ausência de elementos de urbanização, tais como pavimentação das ruas e calçadas, e de iluminação pública. Pode-se dizer que de um ponto de vista qualitativo, observa-se uma fragilidade do ambiente construído, apesar do desenvolvimento imobiliário expressivo.
Pode-se sugerir que o bairro é marcado por fragmentação e segregação espacial, evidenciando-se conflitos entre a dinâmica de expansão e transformação urbana e o ambiente natural: presencia-se ocupação de áreas de risco e ausência de tratamento de vias públicas, expressos pela significativa presença de várias classes sociais sem garantia de contrapartida de convívio.
Apesar destas precariedades o bairro da Sapiranga está ligado ao centro através de malha rodoviária de fluxo rápido. Casas de luxo dividem o mesmo bairro com áreas ocupadas por favelas, e onde condomínios residenciais se instalam para abrigar moradores de classe média dentro de seus muros, guardados por cercas eletrificadas e guaritas de controle de acesso.
Estas experiências de morar geram parcelamentos de solo empreendidos com o resultado de ruas internas, que geram intramuros um símile das condições do espaço público. Tais vias, no entanto, proporcionam acesso às unidades habitacionais e aos equipamentos de uso coletivo, como se constituíssem outra cidade. Esta reprodução da cidade dentro de muros faz com que ruas tradicionais tenham o valor simbólico modificado, contribuindo para desestimular seu uso cotidiano, traduzido em percursos a pé e como meio para a realização de encontros. Transformam-se em corredores de automóveis e muitas vezes em depósito de resíduos urbanos, o que aprofunda ainda mais sua degradação como espaço público, e a sensação de insegurança de quem as percorra.
A principal característica do espaço interno dos condomínios analisados é o alinhamento das unidades habitacionais, a repetição das fachadas, o uso do recuo frontal como vaga de garagem, bem como rua e passeio estreitos. Desde o exterior, as casas só são parcialmente visíveis pelo portão e pela visão parcial da cobertura acima dos muros, uma vez que todas têm dois pavimentos. A relativa invisibilidade das casas é um importante fator de negação da rua, voltando o condomínio a si próprio. A monotonia dos muros altos, longos e destituídos de detalhes decorativos, assim como passeios estreitos cercam as quadras dos empreendimentos, contribuindo para uma percepção de um longo percurso para quem tenha que fazê-lo, gerando um desestímulo à valorização do urbano.
notas
1
D’OTTAVIANO, Maria Camila Loffredo. Condomínios fechados na região metropolitana de São Paulo. In: Anais do XV Encontro Nacional de Estudos Populacionais. Caxambu, 2006.
2
SILVEIRA, Armando Gonçalves. Impactos socioambientais da implantação dos loteamentos fechados e condomínios horizontais no município de Eusébio, Ceará. Dissertação (Mestrado em Meio Ambiente e Desenvolvimento). Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente - PRODEMA. Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, 2012.
3
Ibid., nota [2].
4
CALDEIRA, Maria Tereza P. R. Cidade de Muros: crime, segregação e cidadania em São Paulo. São Paulo: Editora 34 / Edusp, 2000.
5
VILLAÇA, Flávio. Espaço intraurbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel, 1998.
6
REIS FILHO, Nestor Goulart. Notas sobre Urbanização Dispersa e Novas Formas de Tecido Urbano. São Paulo: Via das Artes, 2006.
7
Ibid. nota [6]
8
Ibid. nota [6]
9
GREGOTTI, 1994
10
op. Cit., em nota [6].
11
op. Cit., em nota [6].
12
REIS FILHO, Nestor Goulart. Notas sobre Urbanização Dispersa e Novas Formas de Tecido Urbano. São Paulo: Via das Artes, 2006.
13
Ibid. nota [12].
14
Ibid. nota [12].
15
VILLAÇA, Flávio. Espaço intraurbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel, 1998.
16
CALDEIRA, Maria Tereza P. R. Cidade de Muros: crime, segregação e cidadania em São Paulo. São Paulo: Editora 34 / Edusp, 2000.
17
id. Ibid. nota [16].
18
id. Ibid. nota [16]
19
VILLAÇA, Flávio. Espaço intraurbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel, 1998.
20
CASTRO, José Liberal de. Fatores de localização e de expansão da cidade de Fortaleza. Fortaleza: Imprensa Universitária da Universidade Federal do Ceará, 1977. P. 234.
21
DIOGENES, Beatriz H. N. Dinâmicas urbanas recentes da área metropolitana de Fortaleza. São Paulo: FAUUSP, 2012.
22
id., Ibid. nota [21].
23
op. Cit, nota [21].
24
op. Cit., nota [21].
25
DIOGENES, Beatriz H. N. Dinâmicas urbanas recentes da área metropolitana de Fortaleza. São Paulo: FAUUSP, 2012.
26
Ibid. nota [25].
27
LOPES, Francisco Clébio Rodrigues. Fortaleza (CE) vai continuar "andando" para o leste: as tramas da produção da "região" da Água Fria. In: Anais do XV Encontro Nacional de Geógrafos: Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças... Porto Alegre: AGB, 2010.
28
ACCIOLY, Vera Mamede. A metrópole e o impacto das políticas públicas na expansão urbana: Fortaleza entre 1980 e 2008. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2009. PP. 266.
29
id. Ibid. nota [27].
30
id., Ibid. nota [27].
31
op. Cit., nota [27].
32
LOPES, Francisco Clébio Rodrigues. Fortaleza (CE) vai continuar "andando" para o leste: as tramas da produção da "região" da Água Fria. In: Anais do XV Encontro Nacional de Geógrafos: Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças... Porto Alegre: AGB, 2010.
33
LYRA, Luna; FROTA, Nággila; PEQUENO, Renato. Adoção das condições de moradia em Fortaleza como temática de projeto urbanístico voltado para a reversão das desigualdades sócio-espaciais. Curso de Arquitetura e Urbanismo. Disponível em: http://www.redulacav.org/material/enc2011/Eje2-Ponencia12-Frota-Lyra-Pequeno.pdf. Universidade Federal do Ceará, 2011.
34
id., Ibid. nota [33].
35
SOUZA, Luis Alberto. Condomínios Residenciais e Loteamentos “Fechados”. A prática urbanística versus uma abordagem sócio-jurídica. IPPUR/IFRJ. 2003. P. 90.
sobre os autores
Aureo Freire Castello Branco é Arquiteto e Urbanista, professor da disciplina Técnicas de Representação II e Desenho Auxiliado por Computador II no Curso de Arquitetura e Urbanismo da Unifor (Universidade de Fortaleza); mestrando do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Eunice Helena S. Abascal é Arquiteta e urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Mackenzie, Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie (PPGAU UPM).