O congresso Computer-Aided Architectural Design Futures 2013 (1) deste ano foi realizado entre 3 e 5 de julho na Universidade de Tongjui, em Xangai, uma das mais prestigiadas universidades chinesas, tendo como tema Global design and local materialization. Segundo o Professor Tomas Kvan, vice-presidente da Fundação CAAD Futures e diretor da Faculdade de Arquitetura, Construção e Planejamento de Melbourne, na Austrália, o congresso continua atendendo a seu objetivo original de discutir o direcionamento da pesquisa e aplicação dos sistemas computacionais na arquitetura. Criado nos anos 1980, o CAAD Futures difere das demais conferências de CAAD regionais (ACADIA na América do Norte, ECAADE na Europa, CAADRIA na Ásia e Pacífico, SIGRADI na América Latina, e ASCAAD no mundo árabe) por ser o único fórum global de discussões de alto nível nessa área. Por esse motivo o congresso possui uma seleção rigorosa de artigos científicos e um número relativamente pequeno de participantes. Neste ano, por exemplo, foram aceitos apenas 35 artigos. O CAAD Futures foi organizado na América do Norte, Europa e Ásia, mas possui sede oficial na Holanda, sendo presidido pelo Professor Bauke de Vries, da Universidade Técnica de Eindhoven.
O evento teve início com a inauguração da exposição Digital Workshop in China, que reuniu os resultados de diversos cursos e oficinas organizados recentemente no país, tendo como tema a modelagem paramétrica e a fabricação digital. O catálogo da exposição, organizado por Philip F. Yuan e Neil Leach, analisa os motivos que levaram ao surgimento deste fenômeno, bem como seus resultados. Ums de suas características, apontam eles, é a presença de alunos de diversas nacionalidades nessas oficinas, que começaram a ser oferecidas por meio de visiting schools européias e americanas, e acabaram por se estabelecer definitivamente nas universidades chinesas de ponta.
Este ano o congresso teve como palestrante convidado Dennis Shelden, diretor de tecnologia da Gehry Technologies e professor da área de Design and Computation do Departamento de Arquitetura do MIT. Shelden falou sobre os avanços nos programas que implementam o conceito BIM e sobre a recente inclusão, no Digital Project (software desenvolvido pela Gehry Technologies), de elementos inteligentes que adicionam detalhes automaticamente ao projeto. Ele mostrou como exemplo um elemento estrutural para fachadas que gera treliças de reforço automaticamente ao ser instanciado sobre um elemento linear muito longo.
Shelden apresentou também o novo sistema em desenvolvimento na GT, o G Team, uma plataforma online para o gerenciamento de projetos em grandes escritórios. Segundo ele, os maiores problemas enfrentados atualmente por equipes de projeto são a imensa quantidade de informações e arquivos, que chegam à casa dos milhares para um único edifício, e a grande variedade de programas necessários para executar as diversas operações – cálculo estrutural, modelagem geom´trica, análise de desempenho, etc. Inspirada pela maneira como o Facebook lida com o excesso de informação, que permite que cada usuário configure sua página de modo a visualizar apenas as informações que lhe interessam, a GT desenvolveu um ambiente colaborativo no qual os membros de uma equipe podem ter rápido acesso à versão mais recente dos arquivos de que realmente precisam. Além disso, é possível utilizar, através do browser da Internet, diversos aplicativos de visualização e análise, que rodam em um servidor central com grande poder de processamento. A centralização de arquivos e programas na “nuvem” permite que se trabalhe em qualquer local e com uma grande variedade de dispositivos, de telefones celulares a ipads.
A segunda apresentação do congresso foi feita pelo arquiteto Feng Yuan, professor da Universidade Tongjui. Yuan apresentou uma série de obras suas construídas recentemente na China com o uso de recursos avançados de projeto, como modelagem paramétrica e software de simulação, mas com a valorização da mão de obra local. Um exemplo do que ele chamou de fabricação “Low-tech” é o projeto “Silk wall”, de 2010, em que uma parede com textura baseada no brilho da seda foi obtida com o uso de blocos de concreto com diferentes ângulos de rotação. Como não dispunha de um robô para executar a parede, como fazem os arquitetos suíços Gramazio e Kohler, e visando valorizar a mão de obra local, Yuan desenvolveu um sistema de gabaritos que permitiu aos operários obterem um resultado de enorme precisão. Em seguida, outros jovens arquitetos chineses apresentaram projetos recentes em que também utilizaram recursos avançados de computação e de fabricação digital. A sessão terminou com uma mesa redonda sobre as recentes transformações na arquitetura chinesa, como resultado do grande avanço na área computacional.
As sessões diversas técnicas que se seguiram, ao longo dos três dias do congresso, tiveram como tema a interação ser-humano/máquina, o projeto participativo e colaborativo, recursos de auxílio à criatividade, conceitos e estratégias de projeto, fabricação digital, materialização local, estudos da forma, modelagem e simulação.
O organizador local, Professor Chengyu Sun, não economizou esforços para agradar aos participantes, com o melhor da cozinha local em todas as refeições, e com um evento noturno que não poderia ser mais trendy. A confraternização foi realizada no terraço do hotel Water House (2), com vista para os edifícios de Pudong, incluindo a Shanghai Tower (ainda em construção), que terá 121 andares e será o edifício mais alto da China. Em um estilo que conjuga minimalismo com arte povera, o Water House é resultado da requalificação de um antigo armazém à beira do Huangpu pelos arquitetos Lyndon Neri e Rossana Hu, do Design Republic (3).
Mas o Water House está longe de ser o único edifício reciclado em Xangai. Não apenas os edifícios elegantes construídos pelos europeus no início do século XX na área do Bund (orla esquerda do Huangpu) estão restaurados, abrigando novas funções. Diversos edifícios industriais foram requalificados, como o antigo abatedouro construído em 1933 (4), que foi transformado em um verdadeiro “creative hub”, abrigando de restaurantes de alta culinária a escritórios de arquitetura internacionais, e até mesmo uma empresa de “facilitação digital” e um showroom de objetos criados por designers de diferentes países e produzidos digitalmente (por manufatura aditiva) na China.
Enfim, pode-se afirmar que, tal como proposto pelo congresso, o futuro está presente por toda parte em Xangai – não apenas nos edifícios exuberantes de Pudong – e que projetos alinhados com o que há de mais recente na arquitetura internacional são produzidos aqui com mão de obra e equipamentos locais.
O congresso CAAD Futures foi encerrado com a promessa de que o próximo CAAD Futures terá a veiculação de palestras pela Internet e permitirá a participação remota de congressistas, visando atender a um público maior.
notas
1
Computer-Aided Architectural Design Futures 2013 <http://cf2013.tongji-caup.org>.
2
Hotel Water House <www.waterhouseshanghai.com>.
3
Design Republic <www.thedesignrepublic.com>.
sobre a autora
Gabriela Celani é professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Unicamp e viajou a Xangai com recursos da Fapesp (processo número 2012/10498-3).