Após a premiação de Kazuyo Sejima e Ryue Nishizawa em 2010 e de Toyo Ito em 2013, foi a vez de Shigeru Ban em 2014 de ser condecorado com o Pritzker, o maior prêmio de Arquitetura. Com Ban, o arquiteto mundialmente conhecido pela sua arquitetura dos tubos de papelão, a Hyatt Fundation, que é responsável pelo Pritzker, completa a homenagem ao trio de escritórios japoneses que no decorrer dos anos 90 do século passado tornaram-se conhecidos mundialmente. Sua marcante influência é perceptível não somente sobre a novíssima geração de arquitetos daquele país (Atelier Bow-Wow e Sou Fujimoto entre os mais conhecidos) senão também sobre estudantes e profissionais mundo afora.
Na sequência das gerações anteriores dos metabolistas nos anos 1960 e dos arquitetos cuja produção fora fortemente influenciada pelo pós-modernismo nos anos 1970 e 1980, estes três escritórios japoneses foram responsáveis cada um à sua maneira por contribuir para a retomada do espírito da modernidade arquitetônica, não sem a companhia de outros arquitetos em outros lugares do mundo, como a geração de holandeses (MvRdV, UN Studio) que àquela época também se tornava conhecida.
Entre os colegas japoneses, Shigeru Ban é aquele cuja obra provavelmente reinterpreta as questões da modernidade de maneira mais ocidental, algo que provavelmente se deva especialmente a sua formação nos Estados Unidos. O próprio Ban reafirma em várias entrevistas que a sua arquitetura de papelão deve ser compreendida pela sua lógica estrutural muito mais a partir da tradição da arquitetura clássica do que da japonesa. São três aspectos fortemente modernos que marcam a sua obra; o primeiro deles é a dedicação do trabalho do arquiteto ao grupo de pessoas menos favorecidas. Da mesma maneira que os arquitetos do movimento moderno compreenderam a articulação entre as possibilidades tecnológicas, a racionalização da produção e as respostas de projeto como um meio transformador para a melhoria da qualidade de vida das massas urbanas, Ban atualiza a mesma articulação para os refugiados de Ruanda em 1994, em primeiro lugar, e depois para as vítimas de inúmeras catástrofes naturais, a começar pelos desabrigados pelo terremoto de Kobe, no seu país.
O uso dos tubos de papelão (e também de folhas de compensado ou engradados plásticos para bebidas engarrafadas) como estrutura das edificações conecta-se por sua vez de diferentes maneiras com a cultura ocidental do século 20: desde a lógica objet trouvé, uma vez que os tubos por ele usados são produzidos para serem formas de colunas de concreto armado, às quais ele confere outra funcionalidade, passando pela releitura das vanguardas dos anos 60 sobre o projeto mais como desenho de "condições para atividades" e menos como desenho para uma materialidade perene, para alinhar-se com as várias buscas por uma atividade de construção que implique em menor impacto sobre o meio ambiente.
O terceiro aspecto é a retomada da continuidade espacial entre o interior e o exterior dos edifícios. Ainda que uma série de residências de sua autoria sirva de exemplo para esta busca particular do arquiteto, provavelmente a Casa Curtain Wall, com as famosas fotos de sua cortina esvoaçante abrindo sem nenhuma barreira física o interior da casa para o espaço da rua, seja o trabalho mais icônico desta exploração renovada de uma temática tão marcante para o Movimento Moderno.
Tanto a casa NA, de autoria de Sou Fujimoto, como a Casa-Atelier, de autoria do Atelier Bow-Wow, são exemplos mais recentes de como a nova arquitetura japonesa após os anos 1990 reinventa e atualiza o legado modernista, continuando a experimentação que Ban e seus contemporâneos retomaram e para a qual estão agora em conjunto reconhecidos.
sobre o autor
Márcio Correia Campos é Professor de Projeto, Teoria e Crítica de Arquitetura na UFBA, formado por esta universidade e Mestre em Arquitetura pela TU-Vienna, Áustria.