Muito ouve se falar sobre a qualidade do ensino superior no Brasil. Famoso este país por preterir tanto a educação em detrimento dos 15 minutos de fama muito mais interessantes, acumulamos índices e mais índices baixos de ensino, quando comparado a outros países. Observando um pouco mais o nosso quintal, a formação especificamente voltada à área de design de interiores tenta a duras penas se sobressair desta vertente. Alguns cursos são pouco abrangentes e muitos nem chegam a tratar de questões pertinentes a profissão, acabam seguindo muitas vezes a fórmula dos órgãos que os regulamentam. Além disso temos notavelmente a falta de interesse e muitas vezes de conhecimento dos candidatos pela profissão, uma maioria ainda acredita que basta fazer um simples curso e já estarão aptos a trabalharem em todas as vertentes da profissão. Mas design de interiores é muito mais do que simplesmente decorar casinhas. Partindo deste princípio levantamos a necessidade de uma nova abordagem nas metodologias de ensino dos cursos de design de interiores. A reformulação dos cursos irá colaborar na qualidade do ensino, elevando o status profissional, contribuindo para o reconhecimento e virtuosismo da profissão. A discussão é abrangente mas para que realmente mudanças aconteçam é necessário pensarmos de maneira global e direcionarmos nossos estudos à área que nos é pertinente. Uma vez que tratamos de design de interiores é preciso primeiramente entender o que é design. Muitos alunos pouco sabem do que se trata o design e para que ele serve. Sendo assim, como podem compreender a sua vertente interiores e sua real função? Podemos passar horas discorrendo a respeito do design e suas bases fundamentais que o assunto não termina nunca, e se vivemos atualmente rodeados por design de todos os lados, por que esta discussão não entra em sala de aula? É preciso vislumbrar o horizonte e ter coragem para admitir como tem sido falho o quesito ensino. Pensando de maneira singular é necessário que o designer de interiores tenha desenvolvido seu olhar crítico e criativo sobre as artes e culturas de um modo geral, apurar seus sentidos e assim poder aplicar todo o repertório em seus futuros projetos. Para isso faz se necessário o desenvolvimento de três habilidades: a criatividade, a arte da compreensão da importância do processo criativo. A pesquisa, o estudo sobre os assuntos relacionados ao seu trabalho e as ferramentas de trabalho disponíveis no mercado. E a experimentação, o colocar a mão na massa, a tentativa e erro com o objetivo de observar os pontos altos e baixos ao longo do processo de projetar.
Neste primeiro momento vamos conversar um pouco sobre como desenvolver o processo criativo nos alunos de design interiores. Considerando-se que todo designer é um ser criativo por natureza, muitas vezes o aluno que acaba de ingressar no curso pouco sabe dessa sua habilidade, então faz-se necessário criar ferramentas para que ele possa desenvolver se. Inúmeras ferramentas pedagógicas podem ser utilizadas por professores, mas gostaria de ressaltar a busca de referências como sendo a principal. Buscar referências nas mais variadas áreas é um passo importantíssimo na formação de repertório do aluno, além das leituras previamente selecionadas, desenvolvimento dos chamados moodboard – quadros de memória com o objetivo de reunir recortes de revistas, fotos, amostras de materiais e tudo mais o que a imaginação e a criatividade do aluno permitir. O objetivo desta ação é despertar a percepção do aluno para o que agrada o olhar, fazendo com que ele possa e consiga enxergar a beleza dos detalhes e assim construir um vasto campo de referências para compreender a aplicação futura.
A pesquisa também é outro ponto importantíssimo no desenvolvimento cultural e acadêmico do aluno. Com o acesso a internet, a busca por informações é tão superficial quanto o seu conhecimento. Pesquisar sobre um determinado assunto hoje significa “dar um google” e nada mais. Entretanto o aprofundamento no assunto é de extrema valia na hora de se trabalhar e compreender um projeto. Incentivar esta prática na vivência acadêmica refina a escrita do aluno, abrange sua compreensão de texto e acima de tudo aprofunda seu conhecimento, gerando cada vez mais ferramentas para a composição dos seus futuros projetos. A prática da pesquisa e suas metodologias, tanto na forma de pesquisa como na estrutura e elaboração de textos, auxilia também o aluno futuramente na concepção de seu trabalho de conclusão de curso trazendo qualidade acadêmica e permitindo o desenvolvimento de futuros pesquisadores na área de design de interiores, tão escasso nos dias de hoje.
E por fim embora não menos importante, chegamos à experimentação. Prática mais do que necessária em um curso que envolve processos, criatividade e implementação das ideias. Nos dias atuais a experimentação ocorre praticamente no ambiente 3D dos programas de modelagem virtual, que obviamente são importantes, mas que não complementam a experiência das ideias. Não é incomum o aluno ingressar no curso e após dois, três ou quatro anos de formação não ter desenvolvido suas habilidades manuais na construção de uma maquete física por exemplo. De qualquer modo, a experimentação não se limita as maquetes, mas engloba a prática do desenho técnico, do desenho livre. Muitos designers mal conseguem expressar suas ideias através de um simples croqui, e é aqui que entra a importância da experimentação, pois ela auxilia o aluno a conhecer o “caminho das pedras”, compreender a importância dos materiais e suas características, levando-o a saber o que funciona ou não em uma proposta de projeto.
Como podemos ver, o assunto pode se estender em suas mais diversas variáveis e nunca terá um fim, entretanto outros questionamentos ainda devem ser feitos antes mesmo de levarmos a discussão para a sala de aula. Devemos constituir o pensamento sobre o motivo de estudar e aplicar o design de interiores e nos questionarmos; qual sua importância? Qual sua influência na sociedade em que vivemos? O que esta profissão pode e vai influenciar as pessoas em seus ambientes pessoais e comerciais? Por que o design de interiores é minimamente discutido em grupos de pesquisas e até mesmo entre os próprios profissionais?
É preciso despertar o interesse dos alunos para as reais possibilidades que a profissão apresenta e também estender este despertar aos professores. Instigar, desafiar, convidar os futuros e presentes profissionais a conhecerem as mais diversas culturas, seus modos de viver e gostos irá incentivar o estudo das matérias com o objetivo de que possam, posteriormente, aplicar este conhecimento em projetos voltados ao mercado, tanto da construção de sonhos particulares, como também na realização de projetos comerciais. Somente assim conseguiremos gerar profissionais capacitados ao máximo em suas áreas de especialização. Profissionais competentes e conscientes de sua plena habilidade de criação, embasados em pesquisas reais e com poder de observação e experimentação jamais visto anteriormente. O mercado ganhará profissionais capacitados, com bases sólidas para realizar todo e qualquer tipo de projeto, ressaltando a importância desta profissão.
nota
NA – O presente artigo foi desenvolvido como trabalho de conclusão da disciplina de metodologia científica do curso de pós graduação em design de interiores da FIAM FAAM-FMU, em Julho de 2015.
sobre a autora
Andrea Guariglia é designer de interiores pela Universidade Paulista (2014), pós-graduanda em design de interiores pela FIAM FAAM/FMU (2015). Possui formação anterior em jornalismo pela Universidade Paulista e também é radialista-locutora pelo Senac-SP (2010). Possui estúdio próprio desde 2013 onde desenvolve projetos e consultorias na área de interiores.