Andrea Macadar: Com o fim dos CIAM’s, houve uma ruptura em termos ideológicos. Não mais existiam pretensões de mudar o comportamento, o modo de vida, de produção ou regime de propriedade do homem sobre o solo. A intenção que passou a vigorar foi a utopia do possível, da aceitação das expectativas do ser. A arquitetura passou a refletir sobre a convivência das diversidades. O paradigma formal passou de um modelo genérico universalista do homem, onde os aspectos contextuais e culturais passaram a determinar novas considerações. Qual foi a sua posição defendida naquele momento, que ideais foram seguidos e efetivamente configurados na sua posição de arquiteto?
Paulo Mendes da Rocha: Na minha consciência, eu posso estar enganado, eu não passo por esse dilema. Para mim, as questões postas pelo CIAM, pelos paradigmas assumidos como paradigmas, por muitos que eu tenho visto, lido, para a arquitetura moderna, chamado o movimento moderno da arquitetura, nunca foram dogmas. Eu continuo o mesmo porque eu acho que as convocações tidas naqueles chamados paradigmas, que para mim nunca foram paradigmas, são de caráter urbanista que permanecem às vezes com mais ênfase ainda. Nunca a população brasileira foi tão humilhada, porque nunca esteve tão na frente de todos, no âmbito urbano, com a sua pobreza. Vieram muito rapidamente do campo, ultimamente. Para que nós saibamos que habitação popular é na área central, porque é lá que estão os benefícios, etc., etc., já instalados, dentro daquilo que consideramos uma cidade. Nós não enfrentamos ainda. Não tem nada que ver com o CIAM. É uma pena que o CIAM tenha sido extinto, porque como até já comentamos, seria muito interessante manter esses fóruns, ainda que modernizados.
AM: Referente à seleção do último projeto realizado mediante o concurso nacional de arquitetura organizado pelo IAB – Nacional junto ao governo para a realização do Pavilhão Brasileiro da Expo’92, em Sevilha. Gostaria de saber qual foi sua opinião frente aos projetos propostos, tendo em vista sua participação na banca examinadora por parte do Itamarati? Quais foram os critérios de avaliação? Qual foi sua posição frente às discussões geradas pela polêmica da não participação do país junto ao Pavilhão vencedor selecionado?
PMR: No caso de Sevilha, a votação foi unânime frente ao projeto vencedor do concurso para o Pavilhão Brasileiro. É certo que houve outros projetos interessantes, houve de certa forma uma abertura de idéias na diversidade das propostas relacionadas no concurso.
Comentários de Paulo Mendes da Rocha transcritos frente a algumas indagações correspondidas em carta pelo entrevistador e o entrevistado
PMR: Suas indagações estão formuladas através de “afirmações” e muito compartimentadas. As coisas, estas coisas, não são assim. Há uma idéia de “totalidade” das idéias que envolvem também o que ainda não apareceu de modo claro, mas já estava entre os vivos. Por isso mesmo num dado momento parece que “então surgem”.
Não é possível encarar o “fim dos CIAM” muito menos associá-lo a uma ruptura ideológica. E os movimentos nazi-fascistas? O século XX foi terrível assim tão simples e de modo esquemático.
Não há nada que mereça grande atenção, quanto à ética e à estética no chamado movimento “brutalista paulista”, com apelo para “verdade estrutural” se você lembrar que as pirâmides do Cairo... A ponte Golden Gate... As catedrais medievais... Muito menos a questão do revestimento ou do “aparente”. São muletas dos ditos críticos ou teóricos para criar “uma” teoria e “nomear” coisas, estratagemas de quem diz antes de, de fato, ver o que estava dizendo de quem fez. Quando se leva em consideração a entidade fundamental da existência humana, principalmente seu “eterno inacabado”, que são as “origens da formação da consciência e da linguagem, todo discurso – em qualquer das linguagens – enfrenta o indizível, a monumental dificuldade para dizer e a urgência na invenção no enquadramento no estratagema. Não são nunca afirmações definitivas, mas modos para “continuar” aquilo a que estamos condenados: ‘idéia e coisa’. A linguagem é única realidade do pensamento. Toda a construção é um discurso, a cidade é um discurso, na imagem que fazemos de nós mesmos.
Da história, a totalidade do conhecimento, só existe entre nós, os vivos ao mesmo tempo. Portanto nada começa ali, e acaba aqui.
As pirâmides do Egito não estão só lá, estão agora, para sempre, na imaginação dos humanos porque são uns extraordinários discursos, estão entre a arte, a ciência e a técnica em um só tempo. Aquilo é a “máquina” de sua própria fabricação: o “inclinado” uma das chamadas “maquinas simples” no primeiro capítulo de mecânica em qualquer tratado de física elementar, eis seu incalculável valor. Não é coisa de estilo, de uma época, é para sempre.