Clarissa Turim Jerez: Como se deu a integração dos transportes da CPTM com o metrô?
Renato Viégas: Trabalhar pela integração e expansão da malha sobre trilhos creio que é hoje uma das tarefas mais importantes para a vida da metrópole – é, atualmente, o que mais me motiva e traz satisfação. O PITU 2020 (Plano Integrado de Transportes Urbanos para o ano de 2020) ao tratar de todos os aspectos relacionados à estruturação dos transportes metropolitanos, destacou a importância da rede metroferroviária ao destinar mais de 70% dos recursos previstos para o sistema sobre trilhos. É o mais econômico no uso do espaço urbano e não compete no viário, já tão congestionado. Vários estudos anteriores apontavam para a necessidade de recuperar a ferrovia de subúrbio e integra-lá ao Metrô. A malha da CPTM está muito bem assentada em relação à Região Metropolitana – percorre todas as áreas mais densamente habitadas. Afinal, a cidade cresceu com a ferrovia. As empresas operadoras (Metrô e CPTM) iniciaram o desenvolvimento de seus planos, tomando o PITU como norte, no final de 99. Nessa época fui convidado a ingressar na CPTM, como Gerente de Planejamento, para elaborar o Projeto Funcional de modernização de sua malha. Estabeleceu-se como objetivo elevar todos os seus 250 km de linha ao padrão de serviço prestado pelo Metrô. Com o intervalo fixado em 3 minutos foi possível dimensionar todos os demais sistemas, incluindo as estações. O Projeto Funcional apresentou, então, uma relação custo / benefício altamente favorável à sua implantação. Como expansão pensou-se em uma nova linha para servir o vetor noroeste. Alcança a única região não atendida pelo Sistema Sobre Trilhos, mesmo tendo Guarulhos como o segundo município do Estado em população. Trata-se do Expresso Aeroporto / Trem de Guarulhos, empreendimento cuja sinergia na implantação conjunta dos dois serviços vai dar a São Paulo também uma ligação ferroviária de alta qualidade, entre o centro e seu principal aeroporto. O Projeto Funcional desenvolveu, também, estudos sobre a viabilidade de serviços expressos. O primeiro a ser implantado foi o Expresso Leste. Consistiu basicamente na incorporação pela CPTM de 3 estações, a leste de Itaquera – construídas originariamente como extensão da Linha 3 do Metrô. Foram, então, criados dois serviços: Um parador, operado pelo Metrô, e um outro muito mais rápido, expresso, operado pela CPTM. O sucesso foi enorme, confirmando a grande demanda reprimida da ferrovia. Com base nessa experiência o Projeto Funcional prevê, como prioritária, a implantação do Expresso ABC, ligando esta região diretamente ao Centro.
Nesse processo de recuperação da ferrovia foi muito importante a construção da linha C – aquela que margeia o Rio Pinheiros. Foi a primeira Linha a exemplificar o que pode vir a ser a ferrovia modernizada. Estava respondendo pela Gerencia de Projeto da CPTM, em 94, cedido pelo Metrô. Encontrei lá um projeto pronto, sem as qualidades necessárias para estabelecer um novo padrão. Desenvolvemos então uma nova concepção. Os equipamentos de acesso e salas operacionais deveriam ficar concentrados aquém do viário marginal ao rio. Isso permitiu reduzir o mezanino de distribuição, além da passarela sobre o viário, a uma área mínima, abrigada por uma grande cobertura, sem a necessidade de vedos de proteção – uma construção leve, diáfana, sem obstáculos à vista para o rio. Em 2006, quando ocupava o cargo de Diretor de Planejamento do Metrô, foi editada sua Rede Essencial – proposta que veio a fazer parte do PITU 2025. Sintetiza o que vem sendo pensado sobre a integração dos sistema sobre trilhos.
À ferrovia, que tem velocidade comercial maior que o Metrô, cabe atender as viagens mais longas, cuja maioria tem destino direto ao centro – sem seccionar o percurso destes usuários, o que seria irracional e penoso. Ao Metrô caberia o papel distributivo e complementar, às viagens com destino à área mais central, do ponto de vista metropolitano. Seria sua função garantir maior acessibilidade, à toda população, a essa área, mais congestionada, que contempla taxas elevadas de viagens, emprego e habitação. Estão aí, também concentrados, os locais singulares de lazer, cultura, comércio e serviços. O conjunto terá seu desempenho ampliado se acompanhado de políticas voltadas para o adensamento dessas áreas mais centrais, com mais habitação, evitando o espraiamento, já excessivo, irracional, perdulário e insustentável da mancha urbana.