Lívia Loureiro: Você comentou que vocês assistiam às peças que o Flávio fez a cenografia, como que isso repercutia em você?
Sérgio Ferro: Era gozado por que a gente tinha visto aquilo nascer lá no escritório. A trajetória era basicamente sempre a mesma. Escolhida a peça, o Flávio começava a recolher coisas e pregar pela parede. Depois começava a elaborar os personagens e o cenário. Na última etapa fazia a maquete do cenário e praticamente sumia do escritório por dez ou vinte dias, num ritmo crescente. Nos primeiros dias ele desaparecia pouco, mas voltava no fim da tarde; quanto faltava uma semana para o início da peça ele sumia, só voltava no último dia a meia hora da inauguração, imundo, sem dormir há cinco dias, com a mão toda arrebentada. Então, íamos ver: uma maravilha! Para nós na arquitetura aquela aula de densidade no cenário era importantíssima. O Flávio com meio metro quadrado fazia uma casa, um banheiro, uma cozinha, tudo! Meio metro quadro de cenário. Isso entrou um pouco na nossa arquitetura. Eu cheguei a fazer uma casas para um tio meu onde o pobre do meu primo caiu na desgraça de crescer mais de um metro e oitenta e não havia lugar para o pé dele na cama.
LL: Vocês iam mais no Arena ou no Oficina?
SF: Arena, Oficina e, antes, o Vergueiro.
LL: O Flávio, apesar de trabalhar tanto com o Zé Celso e com o Boal, de certa forma tem essa marca intensa no trabalho dele, com essa colocação sempre muito crítica, inclusive perante a direção. Isso é evidente, mas até que ponto ele conseguia influenciar na direção do espetáculo?
SF: Conseguia.
LL: Tanto com o Boal quanto com o Zé?
SF: Eu acho que conseguia sim. Eu não assistia. No Arena eu sei que era sistemático: quando eles iam fazer sei lá que peça, começavam por uma reunião entre eles pra ver se fariam assim ou assado. Eu acho que ele tinham mais facilidade para trabalhar com o Zé do que com o Boal, mas não tenho nenhum argumento concreto. A sensação que ficou em mim quando ele falava dos dois, é que era mais fácil com o Zé do que com o Boal.