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interview ISSN 2175-6708

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PIRELLI, Giovanni; et. al. Zé Celso, a irreverência a serviço da teatro e da cidade. Transa Marieta – episódio 6. Entrevista, São Paulo, ano 21, n. 083.04, Vitruvius, set. 2020 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/entrevista/21.083/7890>.


Abaixo, segue o roteiro da entrevista elaborado pelos entrevistadores, que foi parcialmente seguido durante a realização da conversa.

Teatro Oficina, Bela Vista, São Paulo
Foto Nelson Kon

Bloco 1: Juventude e formação

Giovanni Pirelli: Por alguma razão cósmica, ao redor do Marieta circulam sempre muitas pessoas de Araraquara (a Morada do Sol). Abilio, meu sogro, é de Araraquara (e nunca deixa de me lembrar que Macunaíma foi escrito em sua cidade). Lucas nosso primeiro estagiário e hoje tuttofare do Marieta também é de lá, assim como várias outras pessoas daqui. Além disso, penso também em outras figuras que, como você, de Araraquara saíram para o mundo, como Ruth Cardoso e Ignacio Loyola Brandão. Abilio, quando conta das suas lembranças da infância passada em Araraquara sempre traz a imagem da ferrovia, que corta em dois a cidade: de um lado a classe trabalhadora, do outro os patrões. O que ficou em você hoje desse período de formação no interior de São Paulo?

Casé Angatu: Às vezes algumas pessoas me contam que “ouviram falar” da existência em suas famílias de uma avó, avô, tia, tio “pegas/pegos à lanço” ou “à dentes de cachorro”. Também me contam que estas/estes familiares “eram parecidos comigo (Casé) porque tinham cara de Índio... só que eram calados ou bravos”. Você (Zé Celso) lembra destas narrativas ou tem alguma memória na infância/adolescência destas histórias da presença indígena na família. Quero dizer: guarda lembrança de algum familiar que possuía está “cara de Índio”? Como você sente esta possível indianidade t-eté (corpo) anga (alma) em você?

Marília Gallmeister: Qual foi o seu primeiro encontro com o teatro?

Marcelo Dalourzi: Zé, em todas as camadas sociais, sejam elas dominadas por pretos ou por brancos, a juventude preta sempre encontra dificuldades pra se inserir. Um lugar que possibilitou a entrada destes artistas pretos, foi a Universidade Antropófaga que é um projeto do Teatro Oficina. Pra você, qual é a importância da Universidade Antropófaga e se existe o desejo para a chamada de uma nova edição?

Teatro Oficina, Bela Vista, São Paulo
Foto Nelson Kon

Bloco 2: Ativismo e reexistência

Casé Angatu: Wetiko é a forma como alguns indígenas de tradição algonquiana nos EUA e Canadá descrevem em suas cosmologias as pessoas que se tornam canibais vorazes, insanos, devoradores de tudo e todos seres viventes. O historiador norte-americano de ancestralidade indígena Jack D. Forbes assinala que existe “a crença” entre aquelas “Comunidades Indígenas de que os conquistadores europeus [incluindo Colombo] estavam cronicamente infectados por wetiko. ‘Tragicamente, a história mundial nos últimos 2 mil anos é, em grande medida, a história da epidemia da doença do wetiko’” (FORBES, Jack D. Colombo e Outros Canibais. Lisboa: Antigona, 1998). O canibalismo-wetiko referido por Forbes não tem nenhuma relação com a Antropofagia ritualística Tupinambá que tratava-se de individual e coletivamente incorporar o outro (“posso ser o que você é, sem deixar de ser quem eu sou!” – União das Nações Indígenas – UNIND – Brasília, abril de 1981) que na minha compreensão é uma das maiores heranças do meu Povo à todos os Povos que formam o que se chama de sociedade brasileira. O wetiko seria o consumo da vida de outra pessoa e da natureza de forma acumulativa e egofrênica. Voc? (Zé Celso) não acha que poderíamos pensar o capitalismo em suas expressões como a especulação imobiliária, leis de mercado, exploração do trabalho, da natureza (as florestas que queimam), consumismo, imperialismo e formas repressivas de estado/moral/religiosidade/policia/cadeias/manicômios como uma grande epidemia chamada de wetiko? Isto é como, o capitalismo como um canibalismo egofrênico e insano devorador insaciável de t-eté (corpos), anga (alma) e da natureza? Ao mesmo tempo não poderíamos pensar a antropofagia como Resistência e (Re)Existência??

Marília Gallmeister: Você teve o corpo torturado durante a ditadura militar. Em uma entrevista, você diz que da tortura e dos seus algozes você não cultivou ressentimento. Você sempre fala que não podemos responder com o mesmo padrão de violência ao patriarcado, à violência colonial, com brutalidade, com falta de imaginação, porque é um terreno estéril. E de fato, durante décadas de massacre à cultura, o Teatro Oficina respondeu com muita alegria guerreira e imaginação: com o desbunde, na época da ditadura e sagrando o inimigo, na relação com o antagonista Silvio Santos, por exemplo. Neste sentido, que direção você dá, para contracenar com esta macro política atual que radicaliza no ódio e na destruição da vida?

Marcelo Dalourzi: Sobre o terreno ao lado do Teatro Oficina, quais os próximos passos na luta pelo parque do Bixiga?

Giovanni Pirelli: Fazendo a pesquisa para a nossa Transa, descobri que no começo da década de 1970 você trouxe para o Brasil, para um intercâmbio cultural, Judith Malina e Julian Beck, o casal que fundou o Living Theatre em New York. Passaram uma longa temporada aqui no Brasil e foram presos em Ouro Preto pela ditadura, supostamente por serem maconheiros. Judith e Julian, além de maconheiros, eram ativistas, militantes do movimento da libertação sexual, e foram uma referência importantíssima na formação de muitos artistas, pensadores, militantes da época. Inclusive, influenciaram profundamente meu avô Giovanni e minha avó Marinella, que também levaram eles para a Italia por algumas temporadas. Gostaria que você lembrasse um pouco sobre esse período e como a visão deles influenciou seu trabalho e a sua militância.

Teatro Oficina, Bela Vista, São Paulo. Arquitetos Lina Bo Bardi e Edson Jorge Elito, 1993
Imagem divulgação

Bloco 3: O Teatro Oficina

Marília Gallmeister: A trajetória do Teatro Oficina sempre foi muito marcada por uma atuação que esculpe o espaço de criação, e de projeto em projeto, o Oficina foi se abrindo cada vez mais em direção ao coro, à cidade, à multidão. O Parque do Rio Bixiga é onde desemboca estas décadas todas de uma criação teatral com perspectiva urbana. A biografia desta luta revela um fio condutor que radicaliza o teatro como um rito coral, a céu aberto. No mais alto astral da sua imaginação e do seu desejo, que lugar você imagina que o teatro deve ocupar na cidade?

Casé Angatu: O Teatro Oficina é sem dúvida um patrimônio cultural, arquitetônico, artístico. Porém, quando entrei a primeira vez no Oficina guiado por Marília Gallmeister estava com outros Parentes daqui do Território Tupinambá de Olivença (Ilhéus/BA), entre eles o Ancião Candinho. Quando estávamos na parte externa do Teatro, silenciosamente Candinho agachou ao pé da escada dos fundos que dá aceso à parte interna do Teatro, viu uma planta e disse: “é uma macela galega”. A “macela” é curativa, aromática e tem todo um universo mítico no entorno dela. Seu Candinho depois comentou que “aquele lugar” (o Teatro e seu entorno com árvores frutíferas e com “macela galega”) era a natureza resistindo em meio ao concreto. Aliás, eu e meus Parentes comentamos que, além da “macela galega”, a árvore dentro do Teatro, a fluidez úmida do rio que lá corre, as pessoas que moravam debaixo do viaduto no Baixo Libertas (Baixos do Viaduto Jaceguai) parecia uma Taba (Aldeia) – pelo menos foi esta a sensação que tivemos. Assim, sabendo das histórias que ocorreram/ocorrem no entorno do teatro naquela região ribeirinha do Bixiga, saber das expressões e lutas que aconteceram/acontecem no Oficina... tudo isto não lhe faz acreditar que o Oficina, bem como o Bexiga, deveriam além de tombados como patrimônios serem declarados como Territórios Populares Culturais Sociais?

Giovanni Pirelli: Ao longo da sua história, o Teatro Oficina passou por três reformas importantes, que transformaram radicalmente sua estrutura e, de alguma forma, sua alma. 1o Oficina, projeto de Joaquim Guedes: teatro sanduíche (1961-1966) – arena central, com plateia de ambos os lados (Lina usou isso depois no teatro do Sesc Pompeia). 2o Oficina, projeto de Flávio Império e Rodrigo Lefèvre: teatro brechtiano (1967-1974) – valorização da ruínas pós-incêndio criminoso do período militar por paramilitares (a versão oficial, foi um acidente provocado por uma faxineira), arquitetura brutalista valorizando a infraestrutura e o despojamento. 3o Oficina, projeto de Lina Bo Bardi e Jorge Edson Elito: Terreiro eletrônico – Teatro Rua – Teatro Pé na Estrada (1993-atual). Como você enxerga a relação entre a evolução do seu teatro e transformações em sua arquitetura?

Marcelo Dalourzi: Nestes anos de Teatro Oficina, o que acha que ainda não vivenciou e que você gostaria de experimentar?

Teatro Oficina, Bela Vista, São Paulo
Foto Nelson Kon

Bloco 4: Horizontes futuros

Casé Angatu: Tenho ouvido alguns dizerem que “sairemos pessoas melhores após a pandemia”. Tenho dito que: “depende porque já saímos de várias catástrofes (peste negra, guerras, terremotos etc) e nem por isto muitos não saíram melhores... tanto assim que foi eleito Bolsonaro”. Muitos Povos Originários pensam (eu sinto assim) que é no presente que lembramos do passado e construímos o por vir. Assim, gostaria de saber se você (Zé Celso) acredita na construção coletiva e decolonial de uma nova sociedade onde caibam vários mundos, sem as desigualdades sociais, respeitando as diferenças como uma obra coletiva...uma grande arte? Outra vez conversando com Ailton Krenak falamos que isto não é por vir “um outro mundo possível” já existe em muitos de nós, coletivos, lugares e Povos Originários já somos. Você não acha que é por isto que muitos nos odeiam... porque já somos um outro mundo possível?

Marcelo Dalourzi: O que podemos esperar do Oficina pós pandemia e o que mudou pra vc nestes meses?

Marília Gallmeister: Num dado momento no Teatro Oficina, mais importante que a revolução, era a revolição – a lição de voltar a querer, porque de fato o teatro feito no Oficina e você, sempre foram bodes muito massacrados, mas que cantaram, que cantam, e muito através da Tragycomédiorgia – a linguagem que é fruto deste trabalho. Qual é a contribuição da Tragycomédiorgia para a luta dos corpos continuamente massacrados, para todas as vidas que estão em extinção agora, e para o teatro?

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083.04
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083

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