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interview ISSN 2175-6708

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O arquiteto Marcelo Carvalho Ferraz, sócio do escritório Brasil Arquitetura, é entrevistado por Vitor Lima e Marta Galisteo.

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LIMA, Vitor; GALISTEO, Marta. Brasil Arquitetura e Lina Bo Bardi: continuidades e independências. Entrevista com Marcelo Ferraz. Entrevista, São Paulo, ano 22, n. 085.01, Vitruvius, jan. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/entrevista/22.085/7998>.


Museu do Trabalho e do Trabalhador, maquete eletrônica, São Bernardo do Campo SP
Imagem divulgação [Acervo Brasil Arquitetura]

Vitor Lima: Dentro dessa questão sobre o movimento moderno, o piloti parece algo evitado dentro da obra do Brasil Arquitetura. Nos grandes projetos, como o Memorial da Democracia, ou o Sesc Registro, ou o Cais do Sertão, vocês optam por grandes vãos que são os espaços cobertos para reuniões. Entretanto, em diversos momentos vocês optam por utilizar paredes estruturais e não piloti. Isso é uma opção deliberada?

Marcelo Ferraz: É uma opção deliberada! Temos evitado os pilotis em certos projetos, muitos. Tentamos criar espaços configurados por paredes, por muros, por placas, elementos que realmente criam o espaço sem o protagonismo da coluna. A gente usa muito o piloti nas marquises, nos caminhos cobertos, nas ligações que são necessárias em vários projetos, em casas, mas não fazemos aquele show do piloti quando temos a possibilidade de deixar o espaço vazio sem obstáculos ou “ruídos” desnecessários. E há casos, como o Museu do Pão, em que o piloti é que fala alto, até quando tiramos alguns, criando uma falha proposital, para intrigar o visitante.

VL: Mas e o Museu do Trabalhador? Vemos que ele é a exceção porque tem o piloti embaixo do bloco principal de exposições...

Museu da Imagem e do Som, maquete eletrônica, concurso, Rio de Janeiro RJ
Imagem divulgação [Acervo Brasil Arquitetura]

MF: Você foi exatamente no lugar que existe o show do piloti! A gente queria que o jardim penetrasse sob a grande caixa e se aproximasse daquela rua interna que tem o pé direito de 18 metros de altura, que cruza o museu de lado a lado. Ele passa sob a caixa cega em meio às colunas de concreto. A ideia era mesclar máquinas obsoletas da indústria mecânica com vegetação, que não foram colocadas até hoje. Isso seria uma brincadeira, a briga entre o natural e o humano. A caixa é suspensa por colunas de três dimensões diferentes, aparentemente desordenadas, como árvores numa mata: você tem uma grossa, uma média, uma fina. Parece gratuito, mas não é, elas estão em lugares estratégicos de nós estruturais, logo essa estrutura de cima não precisou ser protendida. Com isso, existe um paliteiro no jardim, um paliteiro de “árvores” que segura aquela caixa. O bloco de trás, não, ele se apoia no chão, criando um limite. Entre eles temos o vazio sem apoios, a ideia de valorizar o vão livre. Então, há essas misturas...

Vou mostrar uma fotografia... Olha, esse projeto (Biblioteca de Praga) que também não tem piloti. Ele é de um concurso em Praga, só há uma placa, uma pedra dupla que segura o balanço.

VL: Vocês têm uma constância no uso da fenda, da pedra, da caverna, como no projeto do MIS do Rio…

Biblioteca de Praga, maquete eletrônica, concurso, República Tcheca
Imagem divulgação [Acervo Brasil Arquitetura]

MF: Sim, é engraçado. Pedra é uma fixação, realmente. É um fundamento, é estrutura. A pedra, com todos os seus significados – físico, material, estético ou poético. É base para tudo! Concreto é pedra moldada, não é? Temos a pedra fundamental, a pedra do conhecimento. Ela sempre é um bom ponto de apoio e eu gosto de pedra. Eu tenho uma coleção de pedras em casa!

A gema tem a riqueza dentro, os cristais. Aí (na Biblioteca de Praga) você tem os livros como a riqueza, tesouro do conhecimento na caverna e, por fora, a pedra bruta. Mas essa pedra de Praga é feita com concreto projetado, com as paredes estruturais grossas. Entre essas duas paredes você tem as salas para guardar livros raros, o ar-condicionado, banheiros, tudo dentro daquela “cascona” e, fora dela, há o espaço de leitura e luz, a vista para o parque e a cidade.

Croqui de Lina Bo Bardi para o Museu de Arte de São Paulo – Masp, São Paulo SP [Acervo Instituto Bardi / Casa de Vidro]

VL: Quando falamos da utilização de elementos da natureza na arquitetura, lembramos do uso da “natureza bruta” que a Lina Bo Bardi fazia por meio da vegetação em seus projetos. Vocês utilizam o juazeiro, no Cais do Sertão, que é uma árvore da região, mas ele não tem esse aspecto tão “bruto”. Como vocês leem isso? Isso ainda tem espaço na arquitetura contemporânea?

MF: Eu não vejo assim, não sei o que te dizer, pensando na natureza bruta. No caso, o juazeiro nem é da região, ele é do sertão! Foi uma novela para trazer o juazeiro. Tem uma música, um clássico de Luiz Gonzaga que é “Juazeiro e a sombra”. Fomos para Exu, a cidade de Gonzaga, 8 horas de viagem do Recife até lá, um dos lugares mais secos do Brasil. Lá tem o Parque Aza Branca, com sua antiga casa, e também dois juazeiros onde os sanfoneiros costumavam tocar. Vimos se era possível pegar um juazeiro – e era! – e trazer para a beira-mar. Então, fizemos uma operação de guerra para transportar. Plantamos no Cais, ele durou 6 meses, e morreu! Depois, trouxemos 8 mudas menores aclimatadas, e já estão dando frutos. Mas o primeiro juazeiro não foi adiante. Uma loucura, viu? O juazeiro recebe os visitantes do museu, simbolicamente é importante, é a praça da chegada, a praça do juazeiro e da sombra.

Cais do Sertão, Recife PE
Foto Nelson Kon

VL: Há muitos símbolos na sua arquitetura e na arquitetura da Lina...

MF: Muitos símbolos!

VL: É uma das coisas que a gente acredita que os diferencie do grupo de [Vilanova] Artigas: vocês trabalham com os símbolos, mas principalmente com os símbolos da cultura das pessoas da região.

MF: Uns projetos têm mais símbolos que outros. O projeto de Terreiro de Òsùmarè, é feito para uma função física e simbólica, ou, sei lá, espiritual... É carregada de simbologia. Então, em Òsùmàrè isso aparece mesmo, fomos de encontro a isso. E eu poderia dizer que tem muita história no projeto, e a história é feita de fatos e de mitos. Às vezes, os mitos são mais importantes que os fatos, e o projeto pode se apropriar disso, pode se alimentar. Claro, sempre que faça sentido e não seja uma coisa postiça ou mimética. A arquitetura é também portadora de elementos simbólicos, ora contundentes, ora sutis. No Òsùmàrè, você vai ter muito disso.

Veja, por exemplo, na Casa do Benin. Com Lina, construímos aquela estrutura de barro e palha no restaurante, uma referência à Tatasomba, construção típica daquela região da África. Mas fizemos em concreto e argamassa pigmentada, parecendo barro. É como se trouxesse um pedacinho do Benin e botasse dentro da casa. É uma forma, um modo de fazer, um espaço que, simbolicamente, representa algo importante, com significado. Lá em Òsùmàrè tem vários espaços, os nichos, onde vamos convidar artistas para criar objetos simbólicos. Arquitetura pode ser suporte. Mais que suporte, pode estar ela própria amalgamada a essa simbologia, ser parte da museografia. Em um projeto de museu, a arquitetura pode ser parte importante do conteúdo. No Museu do Pão, aquelas colunas têm a ver com a estrutura de madeira dos moinhos da região, aquele capitel de madeira. É madeira de ipê, uma madeira forte, ela segura uma laje de concreto. Mas essa relação não foi intencional no princípio do projeto, foi uma descoberta ao fazer, depois de construído.

Museu do Pão, corte transversal, Ilópolis RS [Brasil Arquitetura]

Marta Galisteo: A gente achou uma semelhança das colunas do Museu do Pão com as do Vale do Anhangabaú. A gente se perguntou se tinha alguma relação.

MF: O Abilio [Guerra] também fez essa associação. Então, nada com isso, jamais pensamos. O [Álvaro] Siza estava visitando a obra do Museu Iberê Camargo, e eu passei no canteiro para conversar com ele e mostrei fotos da estrutura do Museu do Pão, que tinha acabado de ser desformada. E ele olhou, olhou, e disse: “É a celebração da madeira”. Para mim era de concreto, para ele era a madeira. Mas não: “É madeira, tudo é madeira; o concreto é moldado pela madeira. Olha as tábuas dos painéis, é tudo feito de madeira, os capitéis das colunas que celebram a madeira!” Ele fez um discurso bonito e tinha razão. Viu aquilo que não havíamos visto em nosso projeto. É engraçado ter acontecido isso...

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Preâmbulo

Fernando Tulio Salva Rocha Franco, Sabrina Fontenele, Mariana Wilderom, Danilo Hideki, Karina de Souza and Abilio Guerra

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