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Em meio a Rio + 20 a autora questiona o impacto da indústria da construção civil sobre o meio ambiente e a contradição entre as ideias da conferência e o que realmente acontece no Rio de Janeiro.
SANTANA, Gisela. Plantação de prédios, cemitérios de árvores no contexto da Rio + 20. Minha Cidade, São Paulo, ano 12, n. 144.04, Vitruvius, jul. 2012 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/12.144/4401>.
Enquanto o Rio de Janeiro sedia a Conferência das Nações Unidas sobre o desenvolvimento sustentável Rio + 20, na prática, a cidade torna-se mais cinza e congestionada e, menos verde a cada dia.
A proposta da Conferência Internacional é discutir a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza; e o quadro institucional para o desenvolvimento sustentável.
A agenda repleta de eventos que ocorrerão no Rio de Janeiro até 2016 tem tornado foco o setor da construção civil pública e privada. Fortemente aquecido pelo motor da Copa e das Olimpíadas apresenta forte expansão nas obras viárias, dos espaços para eventos, nos imóveis empresariais, hoteleiros e residenciais.
Vale considerar que, segundo definições apresentadas em site do governo federal, ao “desenvolvimento sustentável compete à integração e uma análise equilibrada dos objetivos sociais, econômicos e ambientais e os objetivos na tomada de decisão tanto pública quanto privada” (1).
Nas obras públicas e privadas que os moradores da cidade do Rio assistem diariamente não é isso que se verifica. A cidade continua se expandindo de forma exploratória, como na época das entradas e bandeiras. Uma a uma, as árvores vão deixando de existir. Os moradores não sabem ao certo como nem o que está sendo construído, tomam ciência após o fato consumado: árvores no chão, lagoas aterradas, rios canalizados e sua memória e bens demolidos.
Além da transferência dos pobres para áreas mais distantes, o meio natural do entorno dos clusters dos eventos está sendo substituído por prédios, vias e leis que incentivam as novas construções para os próximos anos e inflacionam seus terrenos.
É sabido que a indústria da construção civil tem forte impacto no meio ambiente e no uso energético. O discurso ecológico já emerge para algumas empresas no que se refere ao uso de energias alternativas, uso de materiais menos poluentes e de reflorestamento. Há até quem já fale em ciclo de vida dos materiais e das edificações. Porém, ainda está em falta no mercado aquelas que preservem as árvores existentes em suas plantações de prédios.
Para as Nações Unidas, “o conceito de economia verde concentra-se principalmente na intersecção entre o ambiente e a economia” (2). A semântica da economia verde voltada para o mercado imobiliário precisa considerar o verde antes, durante e depois. Abrir espaço para novas obras não significa ser devastador e transformar os nichos de mercado nas cidades em cemitérios de árvores.
O que se assiste no Rio de Janeiro nas Baixadas de Jacarepaguá, Vargem Grande e Pequena e mais recentemente em Guaratiba, entornos imediatos da Barra da Tijuca, onde se localizará o principal Parque Olímpico, é uma sucessão de perdas da vegetação e de áreas naturais para as construções e espaços de baixa permeabilidade e forte impacto no clima, fauna e flora local. A falta de visão global dos efeitos provocados p ela soma das construções isoladas põe em risco o todo. Na sustentabilidade, a visão precisa ser sistêmica, integrando todas as partes e suas ações.
Como se as áreas existentes não fossem suficientes, novas vias são abertas para ligar essas áreas ao restante da cidade. O avanço em mobilidade sobre rodas é parcial, pois também amplia o acesso para novas investidas imobiliárias sobre os remanescentes verdes da cidade como: Guaratiba, novas áreas de Jacarepaguá e Deodoro. Fato que gerará aumento populacional e, portanto novas demandas viárias.
A exploração do solo urbano carioca tem sido predatória e nada verde, tem se caracterizado como uma plantação de prédios e em cemitérios de árvores, em uma cidade cujo maior patrimônio é a sua paisagem natural.
A descaracterização do verde na paisagem carioca também deixa suas águas marrons, pois nesta plantação de concreto, os resíduos ainda são lançados em seus rios, lagoas e mares, tornando suas águas fétidas e transformando-as em cemitérios da fauna que agoniza sem voz.
Até mesmo os legados ambientais das olimpíadas, como é o caso da macrodrenagem de Jacarepaguá, tem sido responsável pela impermeabilização dos rios e pela derrubada da vegetação ciliar.
Ah! Para a derrubada de árvores, existe medida compensatória, só não se vê onde são plantadas. Será que para o clima e para os efeitos das mudanças climáticas isso faz diferença? Árvores de copas frondosas são substituídas por pequenas mudas que precisam de cuidados e de anos para crescer... Será que esta economia é verde? Entre as nuances e matizes da natureza, você prefere as pastilhas verdes ou os vidros espelhados verdes?
Para que a semântica do discurso verde se transforme em uma prática verde ainda há muito caminho a percorrer. Só esperamos que distância da evolução tecnológica do setor seja percorrida na velocidade de um jato supersônico e com a pegada ecológica de uma tartaruga de 200 anos, que carrega sua casa nas próprias costas.
Apesar deste cenário, há luz no fim do túnel! Um novo índice para medir o desenvolvimento está na pauta da Rio + 20 e deve ser considerado, ouvido e aplicado pelos atores e agentes econômicos que produzem o meio urbano: é a FIB – Felicidade Interna Bruta. A FIB seria um indicador, uma espécie de PIB verde, criado em 1972 no Butão, perto do Tibet. Os aspectos considerados são: bom padrão de vida econômica; boa governança; educação de qualidade; saúde; vitalidade comunitária; proteção ambiental; acesso à cultura; gerenciamento equilibrado do tempo e bem estar psicológico.
Esse indicador abre novos e importantes paradigmas para a produção das cidades e para a mudança da mentalidade de todos, pois os produtores só produzem porque há consumidores e isso nós podemos mudar, pois o poder da escolha está na mão de cada um de nós.
notas
1
Economia Verde. A economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza. <www.rio20.info/2012/economia-verde>, acesso em 24 de abril de 2012.
2
Idem.
sobre a autora
Gisela Verri de Santana, arquiteta, urbanista, mestre em desenvolvimento urbano e regional, doutora em psicologia social, especialista em restauração, reabilitação e reutilização. Foi professora de Urbanismo da FAUPE e da Universidade Santa Úrsula. Atuou como Consultora de Gestão Pública e Estratégias para o Desenvolvimento Municipal do Sebrae-RJ e no Projeto de Construções e Compras Públicas Sustentáveis, do Estado do Rio de Janeiro. É colaboradora do Instituto de Pesquisas em Infraestrutura Verde e Ecologia Urbana – Inverde.