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Oportunidades de realização profissional, de trocas pessoais, da liberdade de ser, de acesso à diversidade cultural permeiam a essência da condição urbana e resultam na imensa expansão urbana, que desafia as próximas gestões municipais
HONORATO, Rossana. O direito público a espaços dignos. Eleições municipais renovam expectativa de melhor gestão das cidades brasileiras. Minha Cidade, São Paulo, ano 13, n. 149.06, Vitruvius, dez. 2012 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/13.149/4599>.
Um quadriênio de grande expectativa se avizinha para milhões de munícipes brasileiros, sobretudo os que habitam cidades. As próximas gestões municipais deverão perseguir o objetivo de administrar a avassaladora expansão urbana pela atração que a vida nas cidades exerce sobre as pessoas: oportunidades de realização profissional, de trocas pessoais, da liberdade de ser, de acesso à diversidade cultural que permeia a essência da condição urbana.
Sob a competência do poder executivo, tenham as prefeituras a estrutura organizacional e o modelo de gestão que venham a ter, emerge imperativo o foco na adequada aplicação dos investimentos financeiros em espaços abertos, em equipamentos institucionais, em habitação popular e em redes viárias.
Embora estejam a valer, há mais de uma década, as determinações da Lei nº 10.257/2001 para a elaboração de planos diretores de desenvolvimento, para municípios com mais de 20 mil habitantes ou que detenham características singulares para o interesse comum; o Estatuto da Cidade ainda busca impor-se moralmente à edilidade para a severa implantação de seus instrumentos de regulação da ocupação e do uso do solo, por meios que garantam à sociedade esclarecimento sobre seu direito de participação e de controle sobre as intervenções físicas, quando da real necessidade e da priorização quanto à locação territorial e à boa qualidade para a ordem urbana.
O apelo à dignidade dos espaços públicos, face ao volume de investimentos injetado no tempo das cidades, implica a prevalência da reabilitação de zonas bem abastecidas de infraestrutura – esquecidas ou subaproveitadas –, assim como atenção aos vazios urbanos, para a racionalidade do adensamento estratégico do uso do solo visando a economicidade da ocupação do território municipal.
Sobre essa poupança urbana coletiva, notável expressão cunhada por meio de aplicações e replicações de urbanistas americanos, franceses e brasileiros, resta um facilitador para a comunicação popular sobre o que significam para as finanças públicas as zonas abastecidas, nas camadas do tempo, de redes de infraestrutura e de superestrutura capazes de atenuar as demandas sociais por alocação de novas funções urbanas. Dinheiro vivo, muito caro, à vista dos olhos ou escondido sob o solo, que por vezes a falta de esclarecimento deixa de valorar.
Redes de abastecimento e coleta que fazem as cidades funcionar atendendo a necessidades sociais de deslocamentos inter e intra-urbanos face ao habitar, ao trabalho, à geração de emprego e renda, ao lazer, inclusive à desejável recepção de visitantes ávidos pela experimentação de culturas distintas das suas são exemplares do que aqui se remete.
Admitir que a sociedade merece qualidade mais do que quantidade – à parte a inquestionável defasagem quantitativa da demanda social desassistida –, impõe a sustentação do ordenamento normativo para promover progressivamente a equidade da distribuição dos benefícios municipais, com a desconcentração territorial dos investimentos.
O mais barato não convém à qualidade do espaço público na maioria das vezes. Quanto melhor o investimento em planejamento, projetos, garantia plena de conforto ambiental, concepções técnico-estruturais e especificação de materiais de alta resistência e durabilidade, maior a eficiência para os gastos públicos, pelo rebaixamento de demandas por manutenção; e, por decorrência, pelo abalo que os serviços de reparo causam ao cotidiano da vida nas cidades. Sobretudo aqueles serviços – vale o endosso –, recém-executados, não raras vezes sem planejamento, e que carreiam impactos negativos sobre a execução de cronogramas físico-financeiros – quando existem –, que terminam por interceptar a aptidão municipal para o ciclo da competitividade global na atração de novos investidores.
Cumpre à boa prática das gestões administrativas anteceder o quesito de medição da qualidade ao meramente quantitativo. A recorrência a uma prática – demasiada e daninha – de serviços de manutenção dos investimentos físicos instalados precisa ser redimensionada.
Dignificar o espaço público implica uma revisão essencial sobre a qualidade das intervenções financeiras, que garanta o pleno direito ao ir e vir de pessoas em qualquer faixa etária e condições de mobilidade, amparado por um conceito que igualmente carece de popularizar-se: o direito ao desenho universal (1)na implantação de sistemas viários, de transportes coletivos, de espaços abertos, de equipamentos institucionais (públicos e privados), de mobiliário urbano e de habitação popular que permita acolher, com equidade de oportunidade, a diversidade física e motora das necessidades individuais de habitantes e visitantes da cidade.
Validar e integrar o planejamento estratégico, integrado e transversal às políticas públicas, como modelo de gestão, aliado a periódicas revisões que busquem não simplesmente gastar menos o dinheiro público, mas gastar bem um patrimônio que é de todos, cuja aplicação seja consentânea à viabilidade de prazos para o ritual da participação social e que acolha o benefício que o concurso de variadas concepções projetuais em arquitetura e engenharia pode trazer para a vida urbana. Além do recurso a materiais de alta dureza e resistência – seja às nem sempre previstas intempéries, seja às decorrentes do infante estágio de civilidade condizente com o ainda tão baixo nível de investimento em educação social no país-, que garanta à sociedade equidade de direitos em acesso, sobretudo à informação global em tempo real, como instrumentos de controle sobre a gestão pública.
A cidade não pára, canta a memória do movimento Mangue Beat para um séquito de fãs que incorporaram e replicam esse dado aparentemente banal, mas tão útil à compreensão popular no frenesi da apreciação de músicas de massa e que culmina por fomentar o exercício crítico do pensamento coletivo.
Os votos que elegeram os novos prefeitos e prefeitas do Brasil representam a grande expectativa popular por uma vida cada vez mais melhor de se viver. Por um modo de vida porvir, a ser construído com a participação que emerge de uma cidadania ativa.
nota
1
A demanda social por pleno acesso aos direitos humanos e à cidadania tem levado estudiosos, em todo mundo, ao aprimoramento de conceitos que exploram a categoria da acessibilidade, regida formalmente no Brasil pela evolução do tratamento do direito na NBR 9050. O conceito do Direito Universal a que aqui se reporta está baseado na publicação do seguinte livro: CAMBIAGHI, Silvana. Desenho universal: métodos e técnicas para arquitetos e urbanistas. São Paulo, Senac São Paulo, 2007.
sobre a autora
Rossana Honorato tem 49 anos, é brasileira do estado da Paraíba, arquiteta urbanista, mestre em Ciências Sociais e professora do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Paraíba.