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português
Análise da maneira como a atual proposta do Plano Diretor do município de São Paulo aborda questões ambientais ligadas a hidrografia e geologia.
SANTOS, Álvaro Rodrigues dos. Plano Diretor demanda carta geotécnica. Minha Cidade, São Paulo, ano 14, n. 159.01, Vitruvius, out. 2013 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/14.159/4897>.
Considerando-se que os gravíssimos problemas urbanos associados a áreas de risco, enchentes, deslizamentos, contaminação de solos e de águas superficiais e subterrâneas, degradações ambientais, e que tanto rebaixam a qualidade de vida dos paulistanos, tem sua origem causal na incompatibilidade entre as técnicas de ocupação urbana utilizadas pela cidade em crescimento, desde suas remotas origens, e as características geológicas, geotécnicas e hidrológicas dos terrenos sucessivamente ocupados, sugere boa expectativa os termos da minuta do projeto de lei do Plano Diretor Estratégico do município de São Paulo recém posta a discussão pública pelo prefeito Fernando Haddad.
Corretamente a referida minuta, e recorrentemente em diversos de seus capítulos e artigos, estabelece como princípio e objetivo “dar solução para os problemas nas áreas com riscos de inundações, deslizamentos e solos contaminados existentes e prevenção do surgimento de novas situações vulneráveis” ou “compatibilização de usos e tipologias de parcelamento do solo urbano com as condicionantes de relevo, geológico-geotécnicas e com legislação de proteção e recuperação aos mananciais”.
No entanto, para que essas bem-vindas disposições não se reduzam ao já nosso congestionado campo das boas intenções, é indispensável que o futuro Plano Diretor faça explicitamente sua referência e correspondência à Carta Geotécnica do município.
A Carta Geotécnica para fins urbanos é um documento cartográfico que informa sobre o comportamento dos diferentes compartimentos geológicos homogêneos de uma área frente às solicitações de ocupação urbana, e complementarmente indica as melhores opções técnicas para que essa intervenção se dê com pleno sucesso técnico e econômico. Importante frisar esse conceito: uma Carta Geotécnica implica necessariamente a conjugação do mapa de compartimentos geotécnicos com as recomendações técnicas de ocupação, sejam aquelas referentes aos arranjos urbanísticos, sejam aquelas referentes a aspectos diretamente construtivos. Pode-se dizer que a Carta Geotécnica define os aspectos básicos dos Códigos de Obras, e que, portanto, esses deverão ser específicos para cada setor geologicamente diferenciado da cidade. Isto é, e por exemplo, o Código de Obras válido para várzeas e áreas planas lindeiras do Tietê, Pinheiros e Tamanduateí será forçosamente diverso do Código de Obras para as regiões mais montanhosas ao norte que se dirigem à Serra da Cantareira.
Fundamental ainda considerar que a CG a ser utilizada nas decisões rotineiras de regramento de uso do solo pela Prefeitura Municipal deve estar em escala compatível com a precisa localização de suas informações no campo. Essa condição exige no mínimo escalas 1:5.000, com eventuais detalhamentos em 1:1.000. Ou seja, a antiga CG do município de São Paulo, originalmente produzida em escala 1:50.000, não se presta aos objetivos do Plano Diretor; será indispensável que se produza a CG em escala 1:5.000, atividade que poderá ser exitosamente desenvolvida pelos ótimos geólogos, arquitetos, engenheiros e geógrafos que a PMSP já possui em seus quadros, com o apoio de instituições como o IPT e o IG e a participação, se necessário, de empresas privadas para tanto qualificadas.
Ao adotar essa providência a PMSP estará pioneiramente adequando-se ao disposto na Lei Federal 12.608, que modificou o Estatuto das Cidades estabelecendo a obrigatoriedade dos Planos Diretores municipais referenciarem-se a uma Carta Geotécnica.
Por outro lado, considere-se que São Paulo, diferentemente das regiões serranas, onde o risco geológico maior é de origem natural, tem seus riscos geológicos todos diretamente provocados ou induzidos pela ação humana, o que significa que, em uma abordagem preventiva contemplada por seu novo Plano Diretor, poderá vir a se constituir em uma cidade totalmente livre desse terrível flagelo.
sobre o autor
Álvaro Rodrigues dos Santos, geólogo, ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT e Ex-Diretor da Divisão de Geologia, autor dos livros Geologia de engenharia: conceitos, método e prática, A grande barreira da Serra do Mar, Cubatão e Diálogos geológicos, consultor em Geologia de Engenharia, Geotecnia e Meio Ambiente.