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my city ISSN 1982-9922

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português
Anne Marie Sumner defende a desmontagem do Elevado Costa e Silva em São Paulo, o popular “Minhocão”, seguindo os passos de cidades como Seul e Boston, que ao derrubarem seus elevados repuseram áreas de interesse ambiental e lazer públicos.

how to quote

SUMNER, Anne Marie. Leniência urbana. Sobre o desmonte do Minhocão. Minha Cidade, São Paulo, ano 17, n. 194.01, Vitruvius, set. 2016 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/17.194/6182>.


Elevado Costa e Silva, o Minhocão
Foto Abilio Guerra


A defesa da manutenção do Minhocão como parque ou similar, dá a medida da redução do nosso contrato social como sociedade civil. Os seus correlatos são as escolas de lata e os terminais em praça pública: Bandeira, Don Pedro II e Princesa Isabel, por exemplo.

A insalubridade decorrente da falta de aeração e incidência de luz solar nos primeiros pavimentos lindeiros ao Elevado; o resultante socavão sombrio sob o mesmo; o completo desdém pela memória histórica tamponando a Avenida São João, saída a oeste do século 18, cujo ponto de fuga era o primeiro centro de São Paulo; a aniquilação da escala mais singela da Amaral Gurgel, obstruída na sua conexão com o Largo do Arouche no segundo centro de São Paulo; são estas as evidências que, associadas à permissividade da vontade individual – sobreposta ao coletivo que lá vive – ao correr praticamente dentro dos apartamentos lindeiros, indicam de modo contundente a leniência referente ao nosso contrato social e sua progressiva fragilidade.

No fórum realizado na Câmara Municipal em 14 de abril de 2014, vários setores da sociedade civil deram seus pareceres nominadamente referentes à insalubridade, além da Companhia de Engenharia de Tráfego – CET, que afirmava que o fluxo da ligação leste-oeste poderia ser equacionado com o minhocão desmontado. Deste modo, qual o argumento de defesa da manutenção do mesmo como uso de lazer? Há quem pondere que a população teria se apropriado e se acostumado ao seu uso nos fins de semana sem autos; certamente menos nefasto que o quadro anterior, mas isto é suficiente para validar o paliativo? O custo do desmonte seria desproporcional? (1)

Elevado Costa e Silva, o Minhocão
Foto Abilio Guerra

Vale lembrar que as cidades comentem erros que historicamente podem ser corrigidos. Nas últimas décadas, Seul e Boston foram bons exemplos: a primeira desmontou o viaduto e renaturalizou o Rio Cheonggyecheon e a segundo com o Big Dig mergulhou o imenso complexo viário e repôs, no chão, áreas de interesse ambiental e lazer públicos.

Os cariocas foram contundentes com o desmonte recente da Perimetral, devolvendo a abertura da cidade ao mar na sua histórica área central. Os centros primeiros são emblemáticos e devem ser tratados de modo exemplar. Com o Elevado de São Paulo, o paliativo de perfurar sua estrutura atual para entrada de luz; de revesti-la e encapá-la; a ideia de adequação de pavimentos no nível do tabuleiro para usos comerciais, com o consequente deslocamento dos moradores que lá vivem, ou sua convivência en face com a nova companhia cotidiana do parque; os jardins verticais – de difícil manutenção – além dos jardins na própria já combalida laje do viaduto; tais ações teriam sentido? Reporiam naquela centralidade a dignidade urbana original? Diria que em nenhum sentido, nem ético, nem técnico, nem estético.

A cidade como possibilidade plena dos cidadãos dá-se fundada numa relação entre civilização e cultura onde a primeira realiza e concretiza a invenção e hipótese da outra (Hannah Arendt). O que temos visto, contudo, é que a razão instrumental, em princípio civilizatória, ao passar a ter em si própria o seu sentido – e agir, portanto, independente da cultura – fica sem sentido. A mera existência do Elevado é evidência de tal instrumentalização.

À demanda de maior número de áreas públicas de lazer, diria que a ação mais urgente seria a do resgate daquilo que já temos, restituído ao seu uso original, a começar pelas emblemáticas Praça da Bandeira, Parque Don Pedro II e Praça Princesa Isabel.

notas

NA – usamos o termo “leniência” no título como sinônimo de condescendência e não no seu sentido jurídico.

NE – artigo originalmente publicado no website Movimento Desmonte do Minhocão – MDM <www.minhocao.net.br/?p=39544>.

1
Do ponto de vista econômico, como é sabido as vigas pré-fabricadas do Elevado poderiam ser reutilizadas para obras de passagem de nível ou drenagem em outros locais da cidade sendo que apenas os pilares seriam implodidos; certamente menos custoso que a restauração da combalida estrutura do Elevado, com suas já existentes infiltrações, além das obras de adequação para escape público (entre outras) exigidas pelos Bombeiros e por eles explicitado no referido Fórum da Câmara.

sobre a autora

Anne Marie Sumner é arquiteta, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Mackenzie e titular do escritório Anne Marie Sumner Arquitetura Ltda.

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