In order to have a more interesting navigation, we suggest upgrading your browser, clicking in one of the following links.
All browsers are free and easy to install.
português
João Sette Whitaker, atual secretário da Secretaria Municipal de Habitação da Prefeitura de São Paulo, faz um diagnóstico da administração de Fernando Haddad e explica os motivos para se defender a sua continuidade.
WHITAKER, João Sette. Por que Haddad? Pela continuidade na construção de uma cidade mais humana e democrática. Minha Cidade, São Paulo, ano 17, n. 194.06, Vitruvius, set. 2016 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/17.194/6200>.
Em maio de 2012, seis meses antes das eleições municipais, escrevi no Correio da Cidadania um texto intitulado “São Paulo vai morrer” (1), que expressava bem a situação em que se encontrava a cidade de São Paulo naquele fim de gestão Kassab: opção por privilegiar o automóvel em vez do transporte público (nenhum km de corredor criado e novas faixas para carros na Marginal do Tietê, custando mais de um bilhão ao Estado – alinhado ao município na época –, dinheiro que poderia financiar 10 km de metrô); uma indústria da propina nas aprovações de empreendimentos (depois desmantelada nesta gestão), que levou a pipocarem shoppings-centers e outros mega-empreendimentos de grande impacto urbanístico; um Plano Diretor (de 2002) devidamente e ilegalmente engavetado por oito anos; desmonte de todas as instâncias participativas de gestão, e assim por diante. A cidade de São Paulo estava em maus lençóis.
As transformações ocorridas de lá para cá, com a chegada da gestão de Fernando Haddad à frente da Prefeitura são tantas que é até difícil enumerá-las. São Paulo, à beira da morte, sofreu choque civilizatório e, o que é mais importante, um choque marcado por uma clara opção democrática, de promover a reversão da perversa lógica desigual da nossa urbanização. Isso, é importante frisar, em um prazo muito curto, pois foi necessário pelo menos um ano e meio da gestão somente para arrumar a casa, desbaratar esquemas como o do ISS, das propinas nas aprovações e outros, reorganizar as secretarias, inclusive criando novas e importantes pastas, símbolos da nova visão democrática e inclusiva, como a de Direitos Humanos, de Políticas para as Mulheres, da Igualdade Racial. A Controladoria Geral do Município, uma novidade o Brasil, foi criada para garantir a conduta ética da gestão e combater a corrupção, assim como a nova Secretaria de Licenciamento, para botar ordem na festa das aprovações de imóveis. Não é à toa que a atual gestão recuperou mais de 600 milhões de dinheiro público desviado.
Interessante como, nesta campanha, os candidatos de oposição utilizam uma notícia positiva – que, bem manipulada, é passada como negativa – como principal arma para atacar o prefeito: a política de regulação do trânsito e de fiscalização de velocidade dos automóveis. Só mesmo por aqui, em que percebemos que os processos eleitorais ainda são em muito determinados pela manipulação tosca do eleitorado (em que pese todos os avanços que o país viveu neste século), uma coisa boa pode ser manipulada de má fé para que se mude seu sentido. Isso mostra o grau de descomprometimento para com a cidade que querem governar. Não interessa se qualquer pessoa mais informada já sabe que a redução de velocidade e a fiscalização não só reduziram os acidentes, mortes e atropelamentos, como diminuíram drasticamente os congestionamentos (São Paulo caiu da 7ª para a 58ª posição no ranking mundial de congestionamentos). Não importa que, contrariamente à ideia de uma “indústria da multa”, a arrecadação com infrações de trânsito desde o governo Kassab tenha diminuído, e não aumentado (de 1,085 bilhão em 2012 para 1,052 em 2015). Não importa o fato de que, eticamente, atacar alguém por fiscalizar infrações, multar quem para na faixa de pedestre ou passa o farol vermelho, é um pouco a mesma coisa do que criticar um pai por repreender os filhos por roubarem bala na padaria. Não importa o bem da cidade, comprovado por instituições especializadas do mundo todo que elogiaram as medidas aqui tomadas, aliás idênticas às de muitas grandes capitais do planeta (Londres baixou a velocidade para 32 km/h, assim como Nova YorkSP para 40 km/h). O que importa é o vale-tudo eleitoreiro.
Mas a utilização do pífio e perverso argumento da “indústria da multa” tem uma explicação simples: é porque em outros assuntos, quaisquer que sejam, fica difícil criticar o atual prefeito e sua gestão. Aliás, a tosqueira dos debates até agora, em que os adversários do prefeito falam apenas aquilo que as pesquisas lhes dizem que os eleitores querem ouvir, sem nenhum compromisso programático, mostra o fim da política minimamente decente e centrada em discussões de conteúdo. Não interessa mais discutir seriamente a cidade, como faz Haddad, mas apenas seguir o que ditam os marqueteiros de plantão, mesmo que isso produza um festival de contradições e inconsistências.
Daí a insistência em desqualificar o prefeito justamente em um aspecto que, antagonicamente, o qualifica mais do que qualquer outra coisa: o da retirada, sem medo, dos privilégios. No caso, o privilégio dos 30% donos de carros, muitos dos quais (nem todos, felizmente) achando-se donos da cidade. Não foi só controlar seu ímpeto no trânsito que os irritou, ficaram bravos também quando viram os ônibus andando muito mais rápido do que eles nos corredores. A revista Época até publicou uma capa extravasando a raiva das elites: “Faixa exclusiva de ônibus: Haddad achava mesmo que o paulistano deixaria o carro em casa? Porque a ideia deu errado”, estampava a edição de dezembro de 2013. Estava errada a revista. Dava voz a uma elite motorizada, enquanto a maioria da população aprovava e festejava a implementação de mais de 400 km de faixas exclusivas pela cidade, que reduziram em quatro horas semanais o tempo médio gasto no transporte, em especial pela população mais pobre. Também aprovava as 151 novas linhas de ônibus noturnos, e a modernização da frota, com GPS, wi-fi e USB para recarga de celulares. Na campanha de 2012, Serra atacou publicamente a promessa de criação do bilhete único mensal, tida como impossível. Haddad não só criou o bilhete mensal, como o semanal e o diário, além de ter instituído o passe livre para todos os estudantes de escolas públicas, de ter ampliado o benefício para aposentados homens acima de 60 anos (antes era só para as mulheres, os homens era a partir de 65), e agora irá oferecer também a gratuidade para os desempregados.
Essa política de mobilidade para todos, sem medo de enfrentar privilégios, também criou 360 km de ciclovias, criticadíssimas no seu início. O MP de São Paulo até mandou interditar as obras daquela da Av. Paulista. Os motoristas parados nos seus carros olhavam com raiva as ciclovias vazias: “não tem fluxo, tá vazia e não serve para nada”, diziam, sem entender que estavam vazias justamente porque tinham sim, fluxo (quem não tinha era o carro, parado no engarrafamento). Hoje milhares de ciclistas – eu entre eles – comprovam o absoluto sucesso de uma política de incentivo a meios de transporte alternativos e não-poluentes: em um só dia, em 12 de abril de 2016, por exemplo, quase 8 mil ciclistas passaram somente nos três pontos de contagem das avenidas Faria Lima, Eliseu de Almeira e Rua Vergueiro. O número de usuários aumenta dia a dia, como se vê pela cidade. E não, não é verdade que as ciclovias estejam só nas áreas ricas da cidade. Jd. Pantanal, Cidade Tiradentes, entre tantos outros, são exemplos das inúmeras ciclovias em bairros das periferias.
A política de mobilidade é um ótimo exemplo para mostrar o que é para mim a maior qualidade de Fernando Haddad, uma raridade entre os políticos brasileiros: a de não ter medo de priorizar políticas estruturais que transformam a cidade a médio e longo prazo, muito além do tempo da sua gestão e portanto do retorno eleitoral. Obras como o metrô, corredores de ônibus, ou mesmo de equipamentos de maior porte, são geralmente deixadas de lado porque causam transtorno ao munícipe e demoram mais do que quatro anos para serem concluídas. Sem retorno eleitoral direto, “presentes” para o próximo gestor que poderá inaugurá-las, não são prioridade para os políticos tradicionais, que preferem obras vistosas e rápidas, geralmente voltadas para os carros, “cartões postais” que rendem votos, como a famosa Ponte Estaiada da Marginal Pinheiros. Observem com atenção: a atual gestão não fez nenhum cartão postal deste tipo, nenhuma obra vistosa. Preferiu as obras estruturais e necessárias, mesmo que pouco percebidas, como as 45 obras viárias, muitas delas na periferia, como na M´Boi Mirim, na Cantídio Sampaio, na Estada do Alvarenga, na Inajar de Souza, etc. Mais do que isso, como um dos primeiros atos de seu governo, Haddad decidiu corajosamente interromper o suspeitíssimo túnel da avenida Roberto Marinho para priorizar, com o mesmo dinheiro, a construção de habitações de interesse social na mesma região. Haddad já sinalizava, assim, quais seriam suas prioridades.
No campo das políticas invisíveis, Haddad conseguiu um presente para a cidade, que seus opositores não citam, embora devessem agradecê-lo: a reorganização total das finanças de São Paulo, a começar pela renegociação da dívida dos municípios com a União, capitaneada por sua gestão, que permitiu uma redução da dívida fundada de 73,5 bilhões (ou um comprometimento de 177% da receita corrente líquida, impedindo qualquer possibilidade de empréstimo para a cidade), para 30,5 bilhões (ou apenas 70% da receita, dando um enorme fôlego fiscal ao município). Pela primeira vez desde 1997 pelo menos, a cidade pagou seus precatórios acima do mínimo exigido pela Constituição. Em outras palavras, todas as gestões anteriores “pedalaram” nesse quesito, quando o artifício ainda não era desculpa para se dar golpe em presidenta. Na gestão passada, pagou-se apenas 3,2 bilhões em precatórios, de uma dívida mínima a pagar de 8,9 bilhões, deixando um saldo devedor para a atual gestão de cerca de 5,7 bilhões de precatórios a pagar. A gestão Haddad pagou 5,2 bi, para uma dívida mínima a pagar de 4,7 bilhões, ou seja, pagou 500 milhões de Reais além do mínimo. Por essa razão, apesar de sofrer em sua gestão a pior recessão do PIB dentre as quatro últimas gestões (- 5% , sendo que na gestão Serra-Kassab, no auge do governo Lula, o PIB cresceu 18%), a prefeitura conseguiu bater recorde, aumentando seus investimentos na cidade em cerca de 19%.
Esses temas são áridos, e não são trazidos para a campanha pelos adversários, pois não rendem votos, já que, para eles, é mais fácil criar factoides como o dos radares. Os adversários não se aventuram a entrar nesses temas ou, quando o fazem, se dão mal. Marta recentemente anunciou que faria a regularização fundiária de oito mil domicílios em Paraisópolis. Certamente não sabe que o ritmo de regularizações desta gestão não está nessa casa decimal, mas na das centenas de milhares: chegaremos, ao fim do ano, a 215 mil lotes regularizados. Estamos, aliás, entregando milhares de títulos de regularização, após cerca de três décadas, a moradores de conjuntos habitacionais construídos na década de 1980!
A lista de ações desta gestão é infindável: poderíamos falar dos três novos hospitais (a última gestão não construiu nenhum), da rede de hospitais-dia (e não noite, para levar a população ao médico na madrugada, como quer o Dória Jr.), das 400 novas creches entregues (gerando 100 mil vagas na educação infantil, creche + pré-escola), das duas usinas de triagem de lixo (a cidade não tinha nenhuma!), e assim por diante. Poderíamos falar da inteligentíssima política de iluminação que vem colocando postes de LED, com o dobro de iluminação e metade do consumo. Ao começar a implementar o LED nos bairros mais distantes da periferia, onde a população acorda ainda de noite e volta do trabalho depois do pôr-do-sol, a gestão Haddad promoveu uma política de segurança muito mais consistente do que a do policiamento ostensivo e violento. Trouxe luz e segurança a mulheres que antes não se arriscavam a andar do ponto de ônibus até suas casas. Na próxima gestão, essa política, que já instalou 90 mil novas luminárias, atingirá 100% da cidade sem custos, graças à uma licitação em que o prestador do serviço arcará com a implementação da rede em troca de apropriar-se, por um tempo determinado, da diferença de custo gerada pela economia de energia. Poderíamos também falar das 120 praças na cidade que já se beneficiam de Wi-Fi livre, um projeto dado como impossível quando anunciado na campanha de 2012. Agora, os postes de iluminação LED trarão embutidos antenas Wi-Fi, generalizando o serviço por toda a cidade.
São números e mais números. Não vou aqui listá-los exaustivamente, pois seria infindável e maçante. Vou me ater a falar de algumas ações importantes pela sua qualidade, seu caráter democrático e seu efeito transformador em longo prazo, mesmo que não tão visíveis. A lista ainda assim é longa, mas necessária, pois é frequente ouvir perguntas sobre as realizações desta gestão.
Uma das mais fundamentais foi sem dúvida a aprovação do Plano Diretor Estratégico (PDE), que redimensionou a lógica de produção do espaço urbano, pela primeira vez conduzindo o crescimento da cidade para além do ultraprivilegiado setor sudoeste. O Plano Diretor ordenou o adensamento construtivo (que, na gestão passada e sob a batuta da corrupção, havia tornado a cidade território digno de faroeste), limitando a construção nos miolos de bairro e permitindo a verticalização ao longo dos eixos estruturais de transporte coletivo. Limitou o tamanho das unidades habitacionais nesses eixos e o número de garagens, a fim de estimular o uso do transporte de massa nos corredores de ônibus, que se estendem muito além das áreas privilegiadas, promovendo a dinamização econômica em bairros mais distantes e visando quebrar assim a perversa pendularidade da cidade, que afeta milhões de paulistanos hoje obrigados a se deslocar horas de casa até o trabalho.
O Plano Diretor Estratégico foi extremamente progressista no que diz respeito à produção de uma cidade mais democrática: duplicou as Zonas Especiais de Interesse Social – que obrigam a construção de habitações para a população de mais baixa renda –, determinou que 30% do dinheiro arrecadado na outorga onerosa (a venda do direito de construir além do coeficiente básico) e 25% nas operações urbanas seja obrigatoriamente destinado à compra de terras e produção de habitação social. Aliás, esta gestão desapropriou nada menos do que 700 milhões em terras para uso habitacional social em áreas da cidade com infraestrutura, rompendo a lógica perversa de produzir casas para os pobres somente em periferias distantes. O PDE também criou a Cota de Solidariedade, um mecanismo inédito no país pelo qual empreendimentos de mais de 20 mil m² são obrigados a doar o equivalente a 10% da área construída para a produção de habitação social. Uma outra iniciativa inédita no Brasil, a Diretoria de Controle da Função Social da Propriedade Urbana, que identifica imóveis ociosos e sem uso, já notificou mais de 2 milhões de metros quadrados pela cidade. Por fim, entre outros muitos avanços, o Plano Diretor criou um marco legal que permitiu, a partir dele, a elaboração de planos municipais setoriais nas mais diversas áreas: de saúde, cultura, mobilidade, educação, e mais recentemente o Plano Municipal de Habitação, que criamos para orientar uma política democrática de moradia na cidade para os próximos 16 anos.
Outra ação fundamental desta prefeitura foi a de democratização da gestão: os Conselhos Participativos nas subprefeituras, no fim de 2013, levaram 750 mil pessoas às urnas para eleger 1.125 conselheiros representativos, que desde então atuam regularmente na cidade. O Conselho da Cidade, criado pelo Prefeito logo no início da gestão, reúne lideranças dos mais diversos segmentos da sociedade civil, e serve como uma caixa de ressonância direta para o prefeito avaliar suas políticas na cidade.
Mas a gestão promoveu também a retomada dos conselhos participativos setoriais (muitos deles estavam abandonados), como os de habitação, de política urbana, saúde, educação, etc. Além deles, criou nada menos do que 15 novos conselhos, entre os quais alguns muito ilustrativos da opção clara pela promoção da igualdade de direitos das minorias e da população menos favorecida. Muito se atacou a prefeitura quanto à política para a população em situação de rua, mas esta gestão reestruturou e deu importância, a pedido da população, ao Comitê Intersetorial da Política Municipal para a População em Situação de Rua (Comitê PopRua), e foi a primeira a oferecer abrigos com canis para os cachorros e abrigos para a população LGBT em situação de vulnerabilidade social. Pela primeira vez a cidade tem uma Política Municipal para a População Imigrante, sancionada em lei. Criou-se o Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial, assim como a Comissão Municipal de Erradicação do Trabalho Escravo, e ainda o Conselho Municipal de Políticas para Mulheres.
Há também o Conselho Municipal de Defesa do Consumidor (não sei se o Russomano sabe disso), o Conselho Municipal de Transportes e Trânsito, criado após os eventos de maio de 2013, e que conta com a Câmara Temática de Bicicleta e a Câmara Temática de Mobilidade a Pé. Por fim, o Conselho de Planejamento e Orçamento Participativos (CPOP), que é composto por membros dos conselhos participativos municipais das 32 subprefeituras e por membros dos conselhos setoriais do município.
Tudo isto foi feito com a marca da democracia e da inclusão: nesta gestão definiu-se que 50% das vagas em todos os conselhos devem ser preenchidas por mulheres, e foi criada a cota de 20% para negros no serviço público municipal. As políticas de inclusão tornaram-se marca nesta gestão também com a criação da Rede de Atendimento LGBT e Transcidadania. Outra ação pouco visível, mas essencial para a cidade, foi a reestruturação das carreiras dos servidores, antes extremamente depreciadas. Todas elas foram reestruturadas e valorizadas. Um médico da prefeitura ganhava R$ 3.690 em início de carreira no final da gestão passada. Hoje, ganha R$ 12.000.
Mas uma das atitudes mais apreciadas pelos paulistanos foi sem dúvida a da recuperação da cidade para o uso das pessoas, na escala humana, e não do carro: a abertura para pedestres aos domingos não só da Av. Paulista, a nova praia de São Paulo, mas de outras 20 ruas e avenidas importantes em todos os bairros da cidade, permitiram a reconquista do espaço público pelos moradores, famílias, jovens e crianças; a criação dos “Centros Abertos” na região central, que levaram equipamentos, decks, iluminação, quiosques de alimentação, jogos, projeção de filmes, a lugares como o Largo São Bento, do Paissandu ou o São Francisco, dando-lhes novo e intenso uso; a obtenção sem custos para a cidade, por meio de cobrança de dívidas de IPTU, de novos parques como a magnífica Chácara do Jóquei, ou ainda a desapropriação de imenso clube náutico às margens da Guarapiranga, criando um novo parque para a região com acesso a esportes náuticos para a população mais pobre, mostrando que as ações de recuperação da cidade não se limitam, nesta gestão, aos bairros mais ricos.
Essas ações de valorização dos espaços da cidade para todos se coadunam com a política de cultura, que recuperou o carnaval de rua, ampliou a virada cultural para toda a cidade, criou nos CEUS salas de cinema públicas e gratuitas, sem contar a universidade CEU que traz a esses equipamentos uma nova opção de formação superior para os jovens da cidade. Esses jovens também ganharam enorme espaço com o empoderamento da rede de coletivos culturais que se espalham pela cidade, ou ainda com os espaços de criação e formação da rede de FabLabs, espaços gratuitos de capacitação e experimentação digital. Deles também saíram aplicativos inteligentes que vêm mudando a vida dos paulistanos: de transporte, de compra de remédios, e agora também a Zona Azul digital pelo celular. Por fim, ações menos lembradas, mas que mostram uma preocupação com as gerações futuras, não podem deixar de ser citadas, como a merenda escolar com comida orgânica produzida pela agricultura familiar, ou ainda a inserção da história da África no currículo do ensino municipal.
Vou parar por aqui, com uma simples pergunta: depois disso tudo, dá para entender porque os adversários se apegam tanto ao radar? As propostas que oferecem são geralmente pífias, porque mostram desconhecimento da gestão, da realidade de São Paulo, e do quanto se avançou. Marta diz que vai acabar com a De Braços Abertos, política de redução de danos internacionalmente premiada, que enfim começou a fazer efeito junto aos usuários de crack no centro da cidade. Vai substituir uma política de sucesso pacientemente construída por especialistas de todas as áreas, por tratamento “em parceria com religiões” e fazer “centros de reabilitação” nos prédios do INSS que a prefeitura – nesta gestão – conquistou em troca da dívida daquela instituição com o município: ela não sabe que a DBA já tem prédios sendo usados e que os do INSS estão sendo encaminhados para a necessária política de locação social no centro, que o município vem estruturando? Erundina diz que vai implementar o IPTU Progressivo, mas não sabe que São Paulo tem uma diretoria específica para isso, que a lei já existe e foi regulamentada, e mais de mil imóveis já foram notificados?
Em geral, as propostas ou são vagas, ou descabidas, ou ainda de manutenção descarada de políticas criadas na gestão Haddad. Por exemplo: Dória quer excluir as secretarias de Direitos Humanos e Políticas para as Mulheres, além da LGBT (que é uma coordenadoria, e não uma secretaria, ele não sabe disso), quer também privatizar as ciclovias (alguém me explica? Com pedágios?). Erundina, na habitação, propõe “dialogar” com ocupações e movimentos. Será que imagina que isso não é feito? Desconhece a proposta de Plano Municipal de Habitação, que estrutura uma política para as próximas décadas? Marta e Erundina sugerem usar prédios vazios para habitação social, aparentemente sem saber que isso é uma das tônicas da política atual. Russomano diz que a mobilidade vai melhorar porque vai descentralizar as atividades econômicas, o que já é premissa do atual Plano Diretor, construído e aprovado nesta gestão. E assim por diante. Peço que se atenham a ler as propostas disponibilizadas na mídia. Não há muito o que falar.
Diante de tanta dificuldade, a saída é tentar contaminar a disputa municipal pela crise na política nacional. Tentando associar o Prefeito às injustas e superficiais acusações que alimentam o golpe e a caçada ao Lula, esquecendo que a ligação que existe é de uma história de enorme sucesso: o que Lula fez não sairá da memória da população menos favorecida, e as pessoas lembram que Haddad foi, no governo que mais avançou nas políticas sociais na nossa história recente, o ministro da educação que promoveu verdadeira revolução no acesso ao ensino, em especial ao ensino superior. Se uns querem contaminar por esse lado, outros tentam disfarçar: Dória e Marta fingem que não têm nada a ver com tudo aquilo, quando são parte integrante do movimento golpista, Marta tendo inclusive votado pessoalmente pelo impeachment na farsa parlamentar orquestrada pelo Senado. E mais: Marta, Russomano e Dória afirmam que vão avançar nas políticas sociais em São Paulo, mas no plano federal seus partidos apoiam a emenda constitucional que vai congelar os investimentos em saúde e educação no Brasil pelos próximos 20 anos!
Não pretendo com este artigo afirmar que, com tudo que foi feito, a cidade está maravilhosa e que tudo está resolvido. Os que prometem por aí soluções incríveis na teoria não têm a exata noção do que seja governar na prática uma cidade do porte da nossa, no contexto econômico e político brasileiro, ou se têm, estão enganando a todos. Ninguém no mundo com um mínimo de honestidade política e intelectual irá afirmar que os problemas urbanos no Brasil estão perto de serem sanados. Há enormes dificuldades e um gigantesco caminho pela frente para construir uma cidade realmente mais justa e igual para todos. Na área de moradia, que me cabe, apesar de enormes avanços na regularização fundiária (215 mil famílias beneficiadas), ou mesmo na construção de moradias (até agosto de 2016, são mais de 51 mil viabilizadas, seja entregues [12.585 mil], seja em obras [23.624 mil], seja já licenciadas e prontas para iniciar obras [outras 15 mil]), é sabido que a interrupção quase total dos fluxos de financiamento federais (sem os quais uma política de habitação não se viabiliza) para o Minha Casa Minha Vida, ou no âmbito do PAC para urbanização de áreas precárias, dificultou muito a ação da prefeitura. As pessoas não sabem o quanto a crise em Brasília, que às vezes parece um grande jogo de House of Cards sem consequências reais, afeta, e muito, as políticas locais. No Brasil todo, são milhares de municípios e Estados tendo suas políticas sociais colocadas em xeque em razão dos desmandos da política nacional.
Não, ninguém quer aqui convencer alguém de que tudo é perfeito. O que quero mostrar é que, apesar de tudo, há enormes diferenças entre uma gestão séria, ética, comprometida com o bem público e políticas de Estado, pautadas pelo republicanismo, e aquelas que prometem por prometer, alinhadas com atual movimento de retrocesso, o mais grave que o país vive desde 1964. São Paulo teve a oportunidade de avançar em gestões passadas, por quatro anos, porém sempre recuando oito anos na sequência em que tudo que havia sido conquistado foi perdido. Aqueles avanços foram possíveis porque estava no governo um campo de esquerda, aglutinado no PT, que é o mesmo que, em grande parte, está novamente na prefeitura hoje e promove a continuidade e a renovação desses avanços. São Paulo é, em muitas áreas, o berço de políticas de esquerda, sérias e comprometidas com a modernização democrática.
É difícil definir hoje em dia o que é exatamente ser de esquerda. Todos caem em contradições, até aqueles que se orgulham de certa radicalidade mesmo que sua trajetória não seja tão coerente assim. O importante é, sem dúvida, como fez esta gestão, ter como meta e objetivo a redução das desigualdades e injustiças sociais, construindo uma cidade mais igual e respeitosa. Trabalhar nesse sentido é um grande avanço, sobretudo em meio ao retrocesso geral que estamos vivendo. E São Paulo tem hoje, na prefeitura, por mais que se queira retirar-lhe sua legitimidade, um grupo que se formou há anos na condução de políticas públicas comprometidas com a justiça social, e que é exemplo para o país inteiro. Com a sorte de termos à frente desse projeto aquele que é hoje, certamente, um dos políticos mais competentes e éticos que o país dispõe, Fernando Haddad.
Fico muito tranquilo para afirmar isso, pois apoiei sua candidatura em 2012, tive tempo de acompanhar a gestão de fora do governo e como Conselheiro da Cidade, com todas as críticas que quisesse – pois uma outra marca importante deste governo é a abertura ao diálogo –, e fui convidado mais adiante, tendo integrado a equipe com muita honra, pela minha absoluta convicção de que este é um projeto que São Paulo merece que continue.
Como diz o próprio Haddad, a cidade é sua! E é pela manutenção dessa cidade de avanços de direitos e de políticas públicas com justiça social que peço seu voto para que, juntos com Haddad, possamos dar continuidade a este projeto, que é nosso!
notas
NE – Publicação original: WHITAKER, João Sette. Por que Haddad? Pela continuidade na construção de uma cidade mais humana e democrática. Blog Cidades para que(m)?, São Paulo, 21 set. 2016 <http://cidadesparaquem.org/blog/2016/9/20/por-que-haddad-pela-continuidade-na-construo-de-uma-cidade-mais-humana-e-democrtica>
1
WHITAKER, João Sette. São Paulo vai morrer. Correio da Cidadania, São Paulo, 26 maio 2012 <www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=7188:manchete260512&catid=34:manchete>.
sobre o autor
João Sette Whitaker Ferreira é arquiteto-urbanista e economista, mestre em ciência política e doutor em urbanismo, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e atual secretário da Secretaria Municipal de Habitação da Prefeitura de São Paulo. É autor do livro O mito da cidade global (Vozes, 2007).