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português
Este artigo demonstra, através de um olhar analítico sobre a lei urbanística vigente em São Luís, o descolamento entre a densidade prevista no zoneamento e a densidade observada no último censo
english
This paper shows, by analytics view under the urban zoning law in São Luís, the distance between the law planned population density with the real population density observed at the updated census.
JALES, Antonio Wagner Lopes; NOGUEIRA, Josiane Ramos. São Luís e seu zoneamento obsoleto. Minha Cidade, São Paulo, ano 22, n. 263.02, Vitruvius, jun. 2022 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/22.263/8499>.
A Lei de Uso e Ocupação do Solo da cidade de São Luís MA completa em 2022, trinta anos e, apesar da Lei Federal n. 10.257, o Estatuto da Cidade, prever a revisão do Plano Diretor a cada dez anos conforme seu artigo n. 39, a capital maranhense não estaria cumprindo tal recomendação pois seu Plano Diretor vigente é de 2006 (Lei 4.669/06) e a sua Lei de Uso e Ocupação do Solo é ainda mais antiga, de 1992 (Lei 3.253/92).
A necessidade de revisão periódica do Plano Diretor e seu instrumento — a lei de uso e ocupação — não é apenas uma exigência legal, mas permite que se possa observar se o que se esperava, seguiu o plano e, se não seguiu, traçar novos rumos atualizando a lei às novas demandas da sociedade.
Diversos aspectos e características da cidade e da sociedade são levantados para que seja possível ser apresentado um retrato da cidade e uma previsão para o futuro. Questões como: Densidade populacional, condicionantes ambientais, situação socioeconômica da população, entre outros. Somente após esse diagnóstico é possível traçar um planejamento estratégico para o crescimento da cidade.
Historicamente, as primeiras leis urbanísticas elaboradas no Brasil, entre os anos de 1950 e 1970, tinham o objetivo de regulamentar e até controlar o crescimento das cidades. Segundo Júlio Moreno (1), a partir do final dos anos 1970 começam a surgir os planejamentos estratégicos, com o objetivo de encorajar o crescimento urbano. Nesse contexto temos os planos diretores desenvolvidos para a cidade de São Luís. Mas, para que seja possível encorajar o crescimento da cidade e propor características adequadas a cada zona e ao seu desenvolvimento, é preciso que se tenha um bom retrato feito no diagnóstico. Partindo desse princípio, espera-se que, por exemplo, a densidade populacional seja levantada e analisada a cada revisão do plano diretor e que essa densidade seja considerada nas alterações do zoneamento.
Nessa perspectiva de observar o que se seguiu do plano, o presente artigo buscou comparar a densidade prevista na lei de zoneamento de 1992 com a densidade observada pelo último censo de 2010 (2). Apesar de não ser o censo com dados mais atuais, essa diferença, de aproximadamente vinte anos, entre a lei e o censo nos fornece indícios de como a cidade evoluiu, ou não, em direção ao que a lei esperava.
Densidade esperada
A densidade é uma variável que divide a quantidade de habitantes por área, é um indicador fundamental para qualquer planejador e direciona as decisões para diversos aspectos da cidade. A Lei de Uso e Ocupação do Solo se utiliza da diversos parâmetros para direcioná-la; gabarito, tamanho do lote, Assistência Técnica à Moradia Econômica — ATME, ALML etc. De acordo com o gabarito e a definição das áreas de alta, média e baixa densidade, as áreas de alta densidade se concentrariam ao Norte da cidade restringindo a área que fica próximo à praia limitado pela avenida dos Holandeses.
Densidade real e crescimento populacional entre os censos de 2000 e 2010
Desde a aprovação da Lei de Zoneamento em 1992 até os dias atuais, tivemos dois censos nos quais é possível observar densidade real. Em 2000 (3) já tínhamos oito anos de lei e em 2010, dezoito anos, e é possível identificar um aumento na ocupação das áreas ao Norte da cidade (Turú, Fialho, Aririzal) mas outras áreas como Cidade Operária, Jardim Tropical também consolidam suas ocupações.
Quando calculamos a taxa de crescimento da densidade entre os dois levantamentos, em média os setores censitários cresceram 18%, mas esse aumento não se distribuiu igual em todo o território, inclusive, algumas áreas até diminuíram. A distribuição de frequência da densidade dos setores sugere o crescimento não foi proporcional, a população está se concentrando em determinados setores. Observa-se o aumento de densidade nas regiões do Calhau, Olho D'água e Araçagi assim como Turu e Fialho. Na área do Itaqui-Bacanga, o incremento de densidade se deu em torno das vias principais do Anjo da Guarda e da Vila Embratel.
Densidade de 2010 x hierarquia viária
Na lei de 1992, estabeleceu-se a hierarquia viária e o padrão de ocupação dos lotes ao longo das vias de acordo com tal hierarquia e, apesar de se esperar que vias mais relevantes concentrem mais ocupação, não se observa em vários pontos quando comparamos o censo de 2010 (vinte anos de legislação vigente) com a própria exigência legal. Por exemplo o corredor principal da avenida dos Holandeses ou parte da avenida Daniel de La Touche.
Se adotarmos como critério da hierarquia viária, as propriedades morfológicas do sistema viário, da qual não se considera capacidade ou volume de tráfego mas sim as relações topológicas entre as vias, também observam-se descompassos como por exemplo a rotatória da Cohama, maior integração topológica da cidade com baixíssima densidade ou o contrário, como no caso do bairro do Cohatrac que possui um sistema viário de baixa integração global mas alta densidade.
Densidade de 2010 e densidade esperada
Os índices urbanísticos sugerem graus de densidades diferentes conforme apresentado no documento da prefeitura de São Luís (4) e quando sobrepomos tal expectativa das zonas residenciais com a densidade observada dezoito anos depois é possível observar que a ocupação dentro das zonas não se dá de forma homogênea e, mesmo zonas com as mesmas propriedades, mas em localizações diferentes, possuem padrões de densidades diferentes.
Uma colaboração à revisão do Plano Diretor
Obviamente é necessário urgentemente a atualização da legislação para que se possam redefinir os índices urbanísticos (gabarito, afastamento frontal, lateral, ATME, ALML, taxa de permeabilidade etc.) bem como repensar a própria delimitação das zonas através de uma análise profunda das relações intra-urbanas.
Para isso sugere-se a utilização de ferramentas que estudem a autocorrelação espacial como por exemplo, o Índice de Moran que dá uma visão global ou o Local Indicators of Spatial Association — Lisa. Tais recursos permitem avaliar como se dão as relações de dependência espacial numa escala global e numa escala local.
Não se espera, é claro, que toda a ocupação de uma Zona Residencial seja homogênea, mas conforme observamos, temos verdadeiras ilhas de densidade dentro das zonas. Essa situação não sugere eficiência no uso da infraestrutura urbana e dificulta a prestação de serviços públicos (5).
É importante ter clareza que o Plano Diretor é um instrumento para nortear o crescimento, ele por si não gera desenvolvimento, mas suas regras podem restringir o avanço no desenvolvimento da cidade. E para que seja possível estabelecer regras urbanísticas que promovam o desenvolvimento e ao mesmo tempo controlem avanços que sejam perversos ao meio ambiente ou às pessoas, é preciso que o diagnóstico seja fiel à realidade.
Utilizar as ferramentas e metodologias sugeridas nesse artigo pode representar um bom caminho para obter um diagnóstico fiel. Cidades são entes vivos e dinâmicos, somente com diagnósticos precisos e periódicos chegaremos a patamares mais adequados de informações para a revisão adequada dos nossos planos diretores e afins.
notas
1
MORENO, Júlio. O futuro das cidades. Série Ponto Futuro, vol. 11. São Paulo, Editoria Senac São Paulo, 2002, p. 57-83.
2
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo brasileiro de 2010. Rio de Janeiro, IBGE, 2012.
3
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo brasileiro de 2000. Rio de Janeiro, IBGE, 2002.
4
ESPÍRITO SANTO, José Marcelo (org.). São Luís: Uma leitura da cidade. São Luís, Prefeitura de São Luís/Instituto de Pesquisa e Planificação da Cidade, 2006.
5
JALES, Antonio Wagner Lopes. São Luís MA: uma legislação urbana desatualizada e uma cidade que não cresceu conforme o previsto? LinkedIn, São Paulo, 17 fev. 2022 <https://bit.ly/3xInelh>.
sobre os autores
Antonio Wagner Lopes Jales é arquiteto e urbanista (Uema, 2006), mestre em Engenharia de Transportes (UFC, 2009) e pesquisa sobre planejamento urbano, tráfego viário, sintaxe espacial e redes neurais artificiais. Foi professor do curso de Arquitetura da Uniceuma e atuou com Facilities Management e Transporte Fretado na indústria da mineração.
Josiane Ramos Nogueira é arquiteta e urbanista (Uema, 2006), mestre em Arquitetura e Tecnologia (IAU USP, 2011) e docente da Uniceuma desde 2017. Pesquisadora de materiais de construção não-convencionais e pesquisadora das questões urbanas ligadas à qualidade ambiental urbana e às questões sociais.