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PORTAL VITRUVIUS. Celebração das Cidades – Congresso UIA Istanbul 2005. Projetos, São Paulo, ano 04, n. 047.01, Vitruvius, dez. 2004 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/04.047/2427>.


Categoria Estudante:

Igreja Matriz – Pólo de Artesanato – Largo da Matriz, Pirenópolis GO

Não se sabe ao certo quando iniciou a construção da monumental Igreja Matriz de Nossa Senhora do Rosário de Pirenópolis, outrora Arraial de Meia Ponte. O primeiro documento que se tem notícias sobre esta igreja trata-se de um registro de batismo, de 2 de março de 1732, onde consta "nesta Igreja de N. Sr. do Rosário das Minas de Meia Ponte". Esta igreja, considerada como o maior monumento colonial do estado de Goiás, não foi edificada de uma só vez, mas sim em partes. Acredita-se que primeiro construiu-se a capela-mor com a sacristia e o consistório lateral, a nave central, o coro, o batistério e o campanário, porém sem as torres. A técnica utilizada para a construção inicial desta igreja é conhecida como "taipa de pilão" sustentada por uma armação de esteios de madeira (aroeira) tipo "gaiola".

Esta construção utiliza em suas paredes uma argamassa feita de terra, cascalho, esterco de gado e fibras vegetais que, misturados e socados com pilão em fôrmas de tábuas, que amarradas umas às outras formavam o taipal, subiam moldando as paredes entre as armações de aroeira da "gaiola". A espessa parede da nave central mede em média um metro e oitenta centímetros de espessura e chega a ter dez metros de altura. Os alicerces, feitos com grandes pedaços de rocha quartziticas, oriundas da região, tem profundidades que variam de três a cinco metros e com largura que chega até dois metros e dez centímetros. O singular madeiramento do telhado é composto por várias tesouras, peças de madeira em forma de triângulo, muito próximas umas das outras, dispensando a longa e resistente peça chamada de cumeeira, tal e qual um casco de navio. Este telhado suporta telhas de barro, conhecidas como "telhas de coxa" ou "telhas-coxas", por terem o formato de coxa humana.

Acredita-se que estas telhas foram moldadas em coxas de escravos, o que é improvável devido às dimensões de algumas delas que chegam a ter quase um metro de comprimento.

Igreja mais antiga do estado de Goiás

O teto da capela foi pintado por artistas pirenopolinos.Tombada pelo Patrimônio Histórico desde 1941, foi restaurada em 1999, quando as pinturas foram recuperadas.

Símbolo do apogeu do ciclo do ouro e a paróquia mais antiga de Goiás, a igreja Nossa Senhora do Rosário, em Pirenópolis, foi destruída após um incêndio, em 5 de setembro de 2002.

Intenções de projeto

A igreja Matriz deve ser tratada como um monumento, já que foi concebida com esse intuito. Após o incêndio, ela adquire cunho de monumento histórico.

Esse projeto parte do princípio de que a Igreja Matriz representa um ícone para a cidade de Pirenópolis. Com o seu incêndio, questões como a auto-estima da cidade e de seus habitantes foram levantadas e, a partir dessas questões, nossa intenção de projeto parte da vontade de devolver a edificação para a comunidade.

Partimos dessa vontade e do conceito de que intervenção deve trazer sentimento de nacionalismo para a população através da recuperação do patrimônio e, ao mesmo tempo, tem um valor de contemporaneidade, pois cria algo novo a partir do monumento acidentado.

Dessa forma, nossa intervenção no edifício em questão prevê uma mudança do seu uso. Além de seu espaço interno ter sido totalmente destruído, ele já não comportava a quantidade de fiéis da paróquia. Sendo assim, propomos uma nova igreja, no mesmo terreno, com uma capacidade maior.

Para o espaço da antiga Igreja Matriz, propomos um pólo de desenvolvimento de artesanato. A opção por um local onde se desenvolve o artesanato surgiu devido à observação dos costumes da população, onde se percebeu um interesse por essa área artística, que poderia então ser aproveitada para dar um novo uso ao monumento, e atender a uma demanda da comunidade, e promover essa integração que favorece ambas as partes. No caso da edificação, a partir desse novo uso, o monumento se integra no cotidiano da comunidade local e deixa de desenvolver dependência da atividade turística.

Nossa intervenção não se limita ao monumento em si, ela possui colocação em termos urbanos, caracterizando-se por uma intervenção no próprio patrimônio urbano. Traçamos um Quadrilátero, que une quatro pontos de relevância para a cidade: o largo da Matriz, o cinema, o teatro, e nessa intervenção surge uma quarta função que é o pólo de artesanato. Agindo dessa forma pretendemos abranger uma esfera mais global e valorizar o tecido urbano, enriquecendo o entorno e dando melhores condições para o monumento, em comparação ao que acontece quando o monumento é preservado isoladamente.

Para a viabilização do quadrilátero cultural partimos de duas ações: a primeira foi a liberação total do largo da matriz. Retiramos o correio, e fizemos uma nova proposta para o salão paroquial e a casa do padre no subsolo do conjunto; abrindo as visuais de chegada para o monumento.

O segundo ponto seriam os eixos ordenadores da composição, agindo sobre a integração física e social.

Atitude de projeto

Liberação total do largo da matriz para restabelecer as visuais da igreja que estavam comprometidas e retomar um espaço por natureza da comunidade, pois as cavalhadas aconteciam lá. Ouve questionamento sobre os usos atuais que ocorrem no largo, lanchonetes principalmente, foi feita uma observação do local. Esses equipamentos foram deslocados para o interior da praça, local que estava sub utilizado no contexto anterior, onde nós prevemos uma revitalização através da presença desses equipamentos no local. Esses quiosques são de natureza efêmera e flexível.

Na liberação deve-se analisar o que está sendo liberado, pois as funções que naturalmente vão se agregando ao edifício, e que muitas vezes são objeto de liberação, não se desenvolvem por acaso. Elas acontecem porque há demanda, e quem se propõe a interferir num espaço deve respeitar essas demanda.

No caso do salão paroquial, nosso objetivo era não prejudicar o funcionamento das atividades da paróquia, mas remover a edificação que quebrava a unidade entre a igreja e o largo, impedindo as visuais. Para tanto, cria-se um novo espaço para atender a demanda e às intenções de projeto levantadas após o estudo do caso.

No caso do prédio dos correios: propõe-se a relocação desse equipamento num local mais adequado para essa função, fora do terreno da igreja.

Após a liberação do largo da igreja, passamos ao desenvolvimento do estudo sobre consolidação para optar pela melhor forma de preservar as paredes de adobe da edificação: entram alguns estudos mais científicos em relação a intervenção. Foi feita uma diferenciação de tratamento novo e antigo, inclusive no partido adotado nas novas edificações, que foram definidos pelo respeito ao patrimônio (competição) e outra, adequar ao máximo as funções que serão desenvolvidas ali. Tudo isso com linguagem e tecnologia contemporâneas. Pela situação atual do monumento, ele já deve ser considerado como um instrumento didático, pois demonstra como as técnicas construtivas, são desenvolvidas. Preservar esse estado é preservar o conhecimento da técnica construtiva.

Intervenção no próprio monumento: partimos do restauro clássico das fachadas externas e a consolidação do que restou das mesmas internamente.

Diferença de textura: mesmo no restauro clássico assumimos que os novos materiais devem ser perceptíveis, através do uso de madeira, aço, vidro.

Supressão da ornamentação, linguagem de projeto.

Criação de um espaço de memória com peças originais do edifício antes do incidente. Onde estaria inserida a memória descritiva dessa intervenção.

Aspectos tecnológicos

Por se tratar de um trabalho dentro de um patrimônio histórico, os aspectos tecnológicos foram divididos em dois tópicos para melhor exemplificação:

A utilização dos materiais e imateriais a riqueza de texturas e cores nas ruas de Pirenópolis é algo que deve ser levado em conta na hora da escolha dos materiais a serem utilizados na intervenção. Da mesma maneira que esta variedade pode auxiliar na escolha, deve-se tomar o cuidado na hora da aplicação de alguns materiais para não causar uma poluição de texturas.

No caso dos materiais utilizados, tivemos o cuidado de utilizar os que refletem a realidade do lugar e que podem talvez preservar ou inovar técnicas locais.

Na área do Largo há o predomínio de texturas mais lisas e contínuas, relacionando-se com os grandes espaços verdes que tendem a valorizar o volume da antiga Matriz. A nova igreja, semi-enterrada, apresenta estrutura em concreto armado e vigas metálicas. Seu interior apresenta paredes inclinadas e com reentrâncias criando nichos e jogos de sombra e luz que acabam configurando pequenas capelas laterais. Estes pontos de reentrâncias abrigam sheeds de iluminação natural criando um feixe de luz no roda pé da igreja. Estes sheeds são fechados com placas de vidro laminado, que acabam constituindo parte do piso da praça. À noite feixes de luz saem dos sheeds criando uma arquitetura imaterial que ambienta uma cenografia para a monumentalidade da Matriz.

Foi pensado em uma conexão forte entre a antiga Matriz e a nova igreja. Esta conexão é dada pelo próprio partido adotado no projeto que cria um eixo continuo edificado formado pelos edifícios. Um grande cubo de vidro rotacionado cria uma ligação física e bem marcada dentro da nova igreja, que tem como altar a sua antiga identidade, e a mantém viva em seu interior.

O cubo de vidro rotacionado revela o novo edifício inserido num ponto privilegiado da cidade e ao mesmo tempo confere, através de sua transparência, o respeito, a monumentalidade e importância do espaço.

O antigo edifício da Matriz é trabalhado em seu exterior da mesma forma e com a mesma relevância de seu partido original, mantendo-se as formas puras e rígidas e a textura que indica a humanidade do projeto e sua execução.

Em seu interior a rugosidade é mantida pelas paredes de taipa e tijolos de adobe que revelam momentos de seu sistema construtivo e atualmente apresentam trechos da calamidade que a consumiu criando um novo material: um barro cozido, mais rígido e resistente.

Placas de vidro para proteção foram fixadas em uma estrutura metálica (caracterizando contrastes com os materiais originais da obra) independente da igreja que sustentam a nova cobertura estruturada com vigas de madeira.

Técnicas e sistemas construtivos

A intenção de caracterizar uma unidade entre os edifícios levou a sistemas construtivos e estruturais semelhantes em seus interiores. Vigas metálicas e coberturas estruturadas espacialmente, formando tramas e amarrações caracterizam ambos. Na antiga Matriz as vedações e paredes danificadas seriam restauradas com taipa de argamassa e tijolos de adobe, esta técnica foi desenvolvida também nas edificações semi-enterradas que compõem a paróquia. Nestas, a estrutura foi proposta em aço e as vedações em tijolos de adobe, material tradicional em Pirenópolis.

Esse jogo de treliças, tesouras espaciais e técnicas tradicionais demonstram-nos que o antigo e o contemporâneo podem dialogar e resultar em objetos interessantes e harmoniosos.

ficha técnica

Projeto
Igreja Matriz – Polo de Artesanato – Largo da Matriz, Pirenópolis – Goiás

Inscrição
S DF 1001

Autores
Daniel de Castro Lacerda, Filipe Berutti Monte Serrat, Iara Moderozo dos Santos / Quitanda Arquitetura, Brasília DF.

Orientador
Andrey Schlee

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Equipe premiada
Brasília DF Brasil

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