O senso comum dos porto-alegrenses considera Porto Alegre uma cidade com cultura diferenciada, com boa qualidade de vida, com uma história a preservar. A tendência da sociedade é proteger o existente e se rebelar contra grandes mudanças que possam descaracterizar a imagem consolidada, como o polêmico projeto do Estaleiro Só, analisa a arquiteta Maria Isabel Milanez, professora da Uniritter.
Por outro lado, se constata que há falta de um planejamento integrado ou ações concertadas na construção da cidade. Exemplos disso são os projetos viários que tratam apenas da construção da via com ênfase nos fluxos, pouco envolvem o espaço público como um todo. Via de regra, os programas complementares como as calçadas, a arborização urbana, as ciclovias e o mobiliário urbano não fazem parte da maioria dos projetos originais. Também são exemplos negativos do crescimento e transformação da cidade as novas edificações que não se relacionam com o entorno adjacente. Assim como as redes de energia e saneamento que não se redimensionam para acompanhar o crescimento ou a densificação dos bairros_ critica ela.
Esse descompasso nos projetos e nas obras que envolvem os espaços públicos ocasiona não só deseconomia de investimentos, mas também uma sobreposição de obras em equipamentos e estruturas recém construídas, o que provoca desordem e instabilidade no espaço público da cidade em constante abre e fecha.
Tudo isso leva Maria Isabel a concluir que o projeto do Dilúvio tem de privilegiar o espaço público da cidade, oferecendo a esta uma imagem alternativa ao que hoje está acontecendo com a obra de recuperação dos taludes nas bordas do canal. Seria economicamente viável, de fácil execução e culturalmente aceita pela população porto-alegrense.
A arquiteta acredita que a imagem da Av. Ipiranga consolidou-se no imaginário da cidade e que, portanto a urbanização do arroio Dilúvio deve potencializar a mesma, através da inclusão de novos programas voltados para o pedestre, aumentando a dinâmica urbana, reforçando a linearidade e criando "hotpoints" _ pontos de convívio da cidade com a avenida. Como também demonstrar didaticamente ao poder municipal que os projetos integrados de urbanismo são fundamentais e passíveis de execução. _ Obras bonitas e funcionais não são necessariamente caras. E nem sempre a prefeitura não dispõe de recursos _ argumento que imobiliza a construção da cidade.
A proposta da arquiteta incorpora o espírito da cidade reforça seu caráter, multifuncionaliza a avenida, articula os diferentes programas que envolvem a mobilidade urbana e pretende demonstrar uma transformação possível e imediata das bordas do Arroio Dilúvio em um Parque Linear.
As soluções adotadas pela arquiteta e sua equipe, os acadêmicos de Arquitetura Lucas Vali e Paula Motta, pretendem estimular a apropriação pela população das bordas do Arroio Dilúvio, em contraponto à dinâmica atual dos fluxos veiculares através:
1.
Programa de Reabilitação das bordas: A idéia é a inclusão de atrativos programáticos de lazer ativo além da tradicional calçada, como faixas segregadas para caminhadas com equipamentos aeróbicos e ciclovia assim como para o lazer passivo com refúgios e estares de permanência e descanso.
2.
Mudança de Imagem e Caráter: A proposta prevê a construção de Plataformas ao longo do Arroio a partir do leito das calçadas avançando sobre o limite inferior do talude do arroio. Comporiam cheios e vazios, num jogo lúdico de movimentos irregulares, ora criando recantos com mobiliário urbano, ora reforçando o circuito de pedestres e ciclovias. Constituindo-se num novo calçadão de aproximadamente oito metros de largura articulados a pontos de convívio e articulação com a cidade.
3.
Construção do projeto em módulos e etapas: As plataformas seriam construídas em módulos ao longo das margens do arroio reforçando a imagem da avenida como "linha/canal", consolidando sua linearidade através da construção dos novos espaços abertos do Parque Linear proposto. (estendendo-se da Avenida Borges de Medeiros até Avenida Augusto de Carvalho).
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4.
Praças estratégicas: explorar as pontes, propondo a criação de praças entre as mesmas, que avançam sobre o leito do arroio, em pontos estratégicos escolhidos segundo o seu grau de importância, qualidade e inserção no tecido da cidade. Como exemplo destes pontos de referência (hotpoints) se evidencia a conexão entre as avenidas Edvaldo Pereira Paiva e Borges de Medeiros, ponto de contato entre o Arroio e o Guaíba.
5.
Materiais e acabamentos: O concreto pré-moldado seria usado para a construção das bases das plataformas e calçadas, que são estruturadas e assentadas sobre o passeio e estendidas até a dimensão dos taludes existentes. Os pisos sobre a estrutura de base são de pedra basalto serrado, mantendo o padrão exigido para as calçadas de Porto Alegre. O mobiliário urbano e elementos de sinalização deverão ser de concreto e aço. A vegetação terá como preponderância uma arborização urbana que reforce a linha e as bordas do arroio e da avenida. Os tipos devem corresponder a espécies nativas como o ipê-roxo, o jacarandá, reforçando as espécies que compõem a vegetação da cidade.
A iluminação pública deve levar em conta a linearidade, os recantos e os pontos de referencia, através diferentes formas de direcionamento da luz (vertical e horizontal). As redes existentes e aparentes deverão ser subterrâneas.
credenciais
Autoria
Arquiteta Maria Isabel Marocco Milanez
Participação
Lucas Vali - Acadêmico de arquitetura e urbanismo
Paula Motta - Acadêmico de arquitetura e urbanismo