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SEGRE, Roberto. Paixão Déco. Resenhas Online, São Paulo, ano 01, n. 002.02, Vitruvius, fev. 2002 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/01.002/3252>.


É surpreendente como o tema da arquitetura Art Déco desperta tanto interesse na América Latina. Nos anos recentes diversos ensaios e livros foram escritos por os pesquisadores dos diversos países do Continente e do Caribe: na Argentina, um dos principais difusores deste estilo é Jorge Ramos de Dios; no Chile, Humberto Eliash e Manuel Moreno publicaram um livro sobre a Primeira Modernidade; no Brasil, teve sucesso o Guia do Art Déco no Rio de Janeiro, apresentado por Luiz Paulo Conde e Mauro Almada; no México, um belíssimo livro com todas as manifestações artísticas do Déco foi escrito por Enrique X. de Anda Alanís; em Cuba, Roberto Segre e Carlos Sambricio editaram na Espanha um volume sobre a arquitetura na Havana entre 1925 e 1945. Além destas publicações, nos Festivais Anuais que se organizam em Miami, no Art Déco District, a presença da América Latina tem sempre um lugar de destaque.

A fortuna do Déco está relacionada com a sua assimilação pela classe media urbana, entre os anos trinta e quarenta, mais que pela influência do luxuoso decorativismo europeu da Exposition Internationale des Arts Décóratifs em Paris no ano 1925 (tão combatida pelo Mestre Le Corbusier pela sua falsidade conceitual, e por quase não deixar aparecer o seu pavilhão do Esprit Nouveau); ou dos sofisticados arranha-céus de Nova Iorque. Se existem alguns prédios monumentais ou oficiais nas principais cidades, o Déco teve maior difusão nos temas relacionados com o lazer, os pontos de gasolina, os apartamentos e as casas individuais. O fato significativo é que ao lado dos arquitetos de renome que desenhavam neste estilo, os construtores italianos, espanhóis, alemães e portugueses, que chegaram como imigrantes na América, assumiram e participaram na substituição do sistema decorativo clássico e historicista pela modernidade do Déco.

O fato de ter produzido três livros no Uruguai em um qüinqüênio, demonstra a importância deste movimento artístico num país pequeno, mas com uma forte classe média e com uma centralização urbana em Montevidéu, que concentrou ao longo da sua história uma densidade de população, desproporcionada em relação com o seu território. Juan Pedro Margenat, é um arquiteto e professor na Faculdade de Arquitetura, apaixonado por esta arquitetura que estudou como freelance. Ele começou a trabalhar em um primeiro livro geral sobre o Déco em Montevidéu, publicado no ano 1995, que foi pioneiro no tema. Dedicou-se à pesquisa logo após voltar de Caracas, onde morou como exilado político na época da ditadura militar. Com a ajuda de alunos da Faculdade, apresentou os principais exemplos desenhados por Carlos Surraco, Gonzalo Vázquez e Rafael Ruano, o famoso palácio Lápido no centro (Av. 18 de Júlio), de Barriére, Aubriot e Valebrega, e a difusão nos cinemas da cidade e nas casas dos bairros residenciais. No segundo livro, recentemente publicado, selecionou um conjunto de obras relacionadas com a influência dos temas marinos – assumidos do Yacht Style e do Streamline americano – que foram aplicados em casas, hotéis e clubes, não somente em Montevidéu, mas ao longo das praias que desde Carrasco até Punta del Este configuraram o sistema turístico ao longo do Rí da Prata. Na capital documentou a pouco conhecida sede administrativa da refinaria da empresa do petróleo ANCAP, desenhada pelo arquiteto Rafael Lorente Escudero em 1934, com formas aerodinâmicas, que anunciavam a chegada do futuro tecnológico. Desde os anos quarenta, o Uruguai foi um espaço importante para o turismo argentino, e se desenvolveram centros de lazer em novos povoados como Atlântida, Floresta e Piriápolis, mais visitados pela classe média que Punta del Este, onde as oligarquias argentina e uruguaia construíam as suas mansões historicistas. Na minha adolescência, fiquei vários verões em Atlântida, e sem ainda imaginar meu futuro como historiador da arquitetura, olhava com admiração o hotel-barco Planeta, perto da areia da praia.

O terceiro livro foi desenvolvido como pesquisa da Faculdade de Arquitetura de Montevidéu, sob a direção de Mariano Arana, atual Prefeito da cidade, e Salvador Schelotto, recentemente nomeado Diretor da FAU. É um trabalho mais rigoroso, já que teve uma equipe de pesquisa, que além de resenhar a maioria dos prédios Déco da capital, elaboraram umas fichas com as informações detalhadas de cada prédio. Além, apresenta uma breve síntese das diferentes manifestações artísticas, como o desenho gráfico, o desenho de objetos e a moda predominante naquele período. Com estes três documentados e bem ilustrados livros, acho que no século XXI vai ter pouco mais que falar sobre o Déco uruguaio.

sobre o autor

Roberto Segre, arquiteto e crítico de arquitetura, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro

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