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reviews online ISSN 2175-6694


abstracts

português
A revista francesa L´Architecture d´Aujourd´Hui fez uma edição especial sobre o Brasil, no momento em que todos os olhos voltam-se para a arquitetura tupiniquim e as transformações de suas cidades, tendo em vista a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.

english
The French magazine L'Architecture d'Aujourd'hui edit a special issue about Brazil, a moment when too many eyes turn to the tupiniquim architecture and looking the changes of their cities, in view of the World Cup 2014 and the Olympic Games 2016.

español
La revista francesa L´Architecture d´Aujourd´Hui edita una edición especial sobre Brasil, un momento en que todas las miradas se vuelven hacia la arquitetura tupiniquim y las transformaciones de sus ciudades, teniendo en cuenta la Copa y los JJ.OO. 2016

how to quote

BOTTURA, Roberto. Brasil a todos os olhos. Resenhas Online, São Paulo, ano 12, n. 141.01, Vitruvius, set. 2013 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/12.141/4863>.


“De vez em quando
todos os olhos se voltam pra mim,
de lá de dentro da escuridão,
esperando e querendo
que eu seja um herói.”
(Tom Zé, Todos os Olhos)

Em Agosto de 2013, a publicação francesa L´Architecture d´Aujourd´Hui lança a edição 396 (1), especial sobre o Brasil, incitando a uma reflexão – real e necessária – a respeito de como a arquitetura brasileira se encontra, em especial nesse período de um tendencioso otimismo econômico em cujo horizonte desponta a realização dos dois eventos globais, Copa do Mundo 2014 e Jogos Olímpicos 2016, que o país sediará brevemente.

Esses dois aspectos permeiam uma série de interessantes ensaios críticos que contam com participações de conhecidos autores brasileiros e estrangeiros, além de seleções de projetos que ilustram alguns cadernos efetivando um mosaico do que vem sendo produzido entre a famigerada arquitetura estrelar, intervenções em favelas e as grandes estruturas esportivas em curso para os esperados megaeventos. Junto a eles, somam-se uma entrevista com Lelé, um recorte de alguns artistas brasileiros, um passeio por Inhotim e outras reportagens que instigam uma investigação mais profunda de como estamos e, principalmente, do que podemos melhorar.

O fato de uma das publicações especializadas mais respeitadas do mundo dedicar uma edição a respeito do cenário urbano/arquitetônico tupiniquim é o exemplo mais claro de que todos os olhos estão voltando-se ao Brasil, principalmente em meio ao turbilhão da crise europeia, a falência de Detroit e o poder econômico adquirido dos países emergentes do chamado bloco BRICS.

Por outro lado, é nítido um questionamento internacional por parte de diversas mídias de como a arquitetura contemporânea brasileira vem sofrendo uma espécie de letargia, estando associada às classes mais poderosas enquanto os programas sociais em voga atualmente, pouco ou quase nenhum uso faz dela.

É nesse contexto que se insere a edição 396 da L´Architecture d´Aujourd´Hui. De certo modo, é uma visão estrangeira que conta com as precisões de brasileiros que escrevem com conhecimento de causa. Vejamos o que podemos refletir com base em algumas reportagens.

Primeiramente, uma seleção dos projetos midiáticos em curso atualmente foi um dos argumentos críticos do caderno Aujourd d´Hui, que abre a edição. A chegada do star-system no Brasil e seus estrambóticos edifícios (Calatrava, Richard Meier, Daniel Libeskind, entre outros) revelam certa excentricidade somada a um vazio existencial, enquanto outros de merecido destaque (Urban Think Thank, Biselli + Katchborian, Labhabts, etc.) focam na arquitetura utilizada como ferramenta para uma melhora do espaço urbano com forte apelo democrático. Em seguida, uma excelente crítica de Lorette Coen e Yvette Jaggi define essa euforia construtiva nacional citando as sábias palavras de Raquel Rolnik: “Não estamos formando cidadãos e sim consumidores”.

A complexidade urbana do Rio de Janeiro é posta em questão no texto de Sérgio Magalhães e Fabiana Izaga, descrevendo uma megalópole ainda em busca de um plano de desenvolvimento. Para ilustrar o fenômeno das favelas, alguns projetos (entre RJ e SP) são postos em destaque, sendo esses grandes estruturas criadas para servir a massa populacional desses imensos bairros, fiéis retratos da contradição econômica brasileira. Nesse que é o país que mais forma milionários por dia, um breve passeio por algumas periferias das nossas cidades revela a face oculta do neoliberalismo, travestido em uma pseudodemocracia que ainda não sabe solucionar – ou luta por preservar, como defende David Harvey - seus desequilíbrios sociais internos e suas constantes crises econômicas.

Grandes edifícios habitacionais como Bamburral (Brasil Arquitetura) e Novo Santo Amaro V (Vigliecca & Associados), ilustrados na coluna Urbanisme, são espasmos arquitetônicos que se destacam frente a realidade da avalanche de projetos sob o rótulo Minha Casa Minha Vida, que inundam toda e qualquer cidade brasileira. Promovidos pelas grandes Incorporações em parceria com a Caixa Econômica Federal, perde-se o conceito de habitar dando lugar ao sobreviver em espaços mínimos, mal-executados, longe de qualquer pesquisa arquitetônica, referência estética ou valorização urbana. Simplesmente alojamentos de gente fabricados a lucro alto viabilizados pelas hipotecas incentivadas pela mesma Caixa Econômica realizando o sonho da casa própria, seja ela como for. Crédito fácil e loucura construtiva foram os fatores determinantes para a crise espanhola que perdura há anos. Mas esse assunto, deixaremos para outro artigo...

Como um dos pontos altos da edição, destaco dois momentos.

 1. A entrevista com Lelé é animadora. Sempre presente com sua arquitetura autoral, Lelé é um exemplo de criatividade. Como ele mesmo se descreve, “o que me motiva é desenvolver uma arquitetura de impacto social”. Ao longo de sua carreira, ele vem conseguindo ganhos fantásticos na pesquisa de pré-fabricados e no exemplo de que a arquitetura e suas grandes estruturas podem ser leves, fluidas e alegremente coloridas. Ainda sonho em ver Lelé, ou discípulos, construindo escolas e universidades, trazendo luz e amplitude para os espaços do saber, além da já maravilhosa contribuição para os ambientes da saúde.

2. Fernando Serapião assina o caderno Émergence, uma cuidadosa seleção dos jovens escritórios emergentes na cena arquitetônica nacional, conformando um interessante panorama dos belos edifícios ícones de agora. São exemplos válidos da versatilidade e do frescor que o momento atual proporciona, porém, deixa margem a uma análise ao leitor mais atento.

Dos 15 projetos selecionados, 4 são residências e 2 edifícios habitacionais, ambos de altíssimo padrão. 3 são escritórios, 3 são estruturas governamentais, 2 são museus e 1 é um pavilhão temporário. Não se refuta aqui o critério de seleção, muito menos a qualidade dos projetos, todos agradam perfeitamente. O que salta aos olhos é a realidade na qual o arquiteto brasileiro vem sendo assaltado em nosso país: uma profissão, agora, elitista, que ao invés de estreitar os laços da cidade, os distancia ainda mais. Em geral, não é fácil selecionar mais que 4 ou 5 projetos de qualidade quando o assunto é escola pública, hospital, praça, equipamentos urbanos, residência de terceira idade, biblioteca, ginásio ou edifícios habitacionais de interesse social. A constatação é lamentável: os bons encargos não são promovidos, pois a arquitetura como ferramenta não faz parte da agenda politica.

É nesse panorama que arrisco uma breve reflexão, quando leio os artigos de forte referência histórica, dos brasileiros Abilio Guerra e Olivia de Oliveira. Nossos edifícios atualmente não são tão vistosos como os de antigamente. Nosso rico paisagismo tropical não harmoniza tão bem como em outrora sabiamente utilizado. Nossa técnica já não é mais fruto de uma pesquisa e de uma ousadia estética. Nossos projetos já não são tão públicos e transitáveis. Nosso vocabulário arquitetônico não transcendeu a lâmina e o concreto armado. Seguimos construindo com tijolo e cimento. Estrutura metálica é um luxo exclusivo, nesse que é o país de indústria siderúrgica poderosa. Voltamos à habitação social dos H´s e do confinamento na periferia. O principal meio de locomoção nas cidades segue sendo o carro e o ônibus. O design é para poucos. A manutenção de nossos edifícios e espaços urbanos é lamentável.

Quando passeio entre as páginas da L´Architecture d´Aujourd´Hui vejo o grande potencial que o Brasil possui. Temos cabeças pensantes, ótimos profissionais, técnica disponível e excelentes escolas de arquitetura. É preciso vontade política e uma transformação na maneira de encarar a profissão do arquiteto no Brasil. Em uma próxima edição sobre o nosso país, quero ver mais concursos, mais habitação social, mais parques e mais estruturas que sirvam as camadas mais pobres da população, como alguns exemplos realizados na Colômbia ou as bibliotecas públicas de Barcelona.

Precisamos repassar a limpo nossa essência moderna, lembrar mais de Lina, de Artigas e de Burle Marx. Olhar para frente sem perder nossas referências já que o pior engano na espiral da história é voltar atrás sem se dar conta das maravilhas já alcançadas.

notas

1
O número especial sobre o Brasil da revista francesa L’Architecture d’Aujourd’Hui pode ser encontrada nos seguintes pontos de venda: em São Paulo, na FNAC Paulista, FNAC Pinheiros, FNAC Morumbi, Livraria Francesa, Livraria do Alto e Livraria Cultura Paulista; no Rio de Janeiro, na Fnac Barra Shopping, Laselva e Super News no Aeroporto do Galeão, Livraria Bolívar, Livraria da Travessa Barra e Saraiva Rio Sul.

sobre os autores

Roberto Bottura é arquiteto e urbanista, formado pela Puc-Campinas e mestre em Teoria e História da Arquitetura pela Universitat Politècnica de Catalunya. Se interessa pelas relações entre Cidade, Poder e Arquitetura.

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resenha do livro

L´Architecture D´aujourd´Hui

L´Architecture D´aujourd´Hui

Edição 396 – especial Brasil

Antoine Vernholes (Org.)

2013

141.01
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original: português

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141

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